JUSTIÇA AUTORIZA O PRIMEIRO ABORTO EM CASO DE XIFÓPAGOS
Justiça de Teresópolis autoriza o primeiro aborto em caso de xifópagos sem chance de sobrevivência. Em caso inédito na justiça, Alice Oliveira conseguiu autorização para interromper gravidez de gêmeos xifópagos, sem chance de vida fora do útero. Os meninos de Alice eram unidos por um só coração. Essa poética anatômica condenou-os à morte. Fora do útero, não poderiam viver nem juntos nem separados.
Soube que teria gêmeos no exame de ultra-sonografia, mas o médico percebeu que as crianças estavam ligadas pelo tórax eram xifópagos.
Alice tornou-se um capítulo especial em uma história que começou a ser escrita na mesma cidade Teresópolis, no Rio de Janeiro. No início de 2004, Gabriela de Oliveira Cordeiro, aos 19 anos, grávida de um feto anencéfalo (sem cérebro), tentou obter permissão na Justiça para suspender a gestação sem futuro. Quando seu caso chegou ao Supremo Tribunal Federal, em 4 de março daquele ano, Maria Vida já havia nascido, sobrevivido durante sete minutos e morrido. Sua peregrinação pela Justiça deu origem a uma ação no STF. Nela se reivindica, em nome da dignidade e da autonomia, que as mulheres possam decidir se querem ou não interromper uma gestação de feto sem cérebro sem ter de pedir licença a um juiz.
Em 1º de julho de 2004, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, deferiu uma liminar autorizando a interrupção da gestação nesses casos. Elizandra de Oliveira Sampaio, de Teresópolis, foi uma das primeiras brasileiras a se beneficiar da decisão. Aos 24 anos, estava grávida de gêmeos sem cérebro. Depois de quase quatro meses em vigor, a liminar foi cassada em 20 de outubro. O Supremo deverá julgar o mérito da ação e o destino de dezenas de mulheres.
Ao conseguir uma autorização judicial para interrupção de xifópagos, Alice encarna um avanço no debate travado na Justiça. Desde o fim dos anos 80, juízes em todo o Brasil têm autorizado a interrupção de gestações de fetos incompatíveis com a vida extra-uterina. Este é o primeiro caso de gêmeos xifópagos.
Ao atender ao pedido de Alice, a juíza Lília Côrtes de Carvalho, de Teresópolis, ancora sua decisão na jurisprudência construída na última década: obrigar uma mulher a levar uma gestação condenada à morte até o fim é violar seus direitos sem proteger ninguém, já que não há vida a ser protegida. Duas instituições de referência o Hospital das Clínicas da USP e o Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz atestaram a incompatibilidade da malformação com a vida fora do útero.
(Fonte: Revista Época, 15 Agosto, 2005 Nº378 DIREITOS HUMANOS Por Eliane Brum – Pág;78/79)