O gênio da treva
Caravaggio (Milão, 29 de setembro de 1571 – Porto Ercole, comuna de Monte Argentario, 18 de julho de 1610), o pintor que ousou retratar a vida e a morte sem eufemismos. Foi um artista genial, mas de vida atribulada, brigão, amante do vinho e da mesa de jogo.
Mesmo tendo influenciado mestres como Rembrandt e Vermeer e o nascimento da pintura moderna, na França do século XIX, a obra de Michelangelo Merisi da Caravaggio chegou ao início do século XX desprezada pela crítica e praticamente desconhecida pelo público. Foram poucos os que enxergaram nele um grande da pintura barroca que fez do claro/escuro e do naturalismo as marcas registradas de seu pincel. Ao jogar o mundo na penumbra e pintar as coisas como dizia vê-las, Caravaggio, que se declarava um pintor “das coisas”, fossem elas santos, gente, bichos, frutos ou plantas – ele chegou a afirmar que um quadro de flores exigia tanto empenho e talento quanto um de História -, infundiu teores inéditos de dramaticidade e verossimilhança à história da arte. Mas foi graças ao crítico florentino Roberto Longhi (1890-1970), autor do primeiro grande estudo sobre sua obra, que no início do século XX Caravaggio passou finalmente à posteridade como um dos maiores nomes da pintura italiana.
BANHO DE SANGUE – A maior vedete é o quadro A Trapaça, obra do período juvenil, cuja autoria foi autenticada recentemente, ele desapareceu no século XIX e só ressurgiu em 1986, na Suíça, quando foi comprado pelo Kimbell Art Museum de Forth Worth, no Texas. A tela, até o tema, é puro Caravaggio. Na época do período juvenil de Caravaggio – ele se dedica à crônica de costumes da sua época e a pintar flores, frutos e figuras mitológicas pagãs – quanto as inesquecíveis cenas bíblicas da maturidade, o ponto alto de sua produção.
Entre as cenas bíblicas, a que causa mais espanto é Judite e Holofernes, um exemplo da crueza pictórica de Caravaggio. O tema clássico envolve a decapitação do general Holofernes por Judite, uma heroína judia. Antes de Caravaggio, Judite era retratada já segurando a cabeça do inimigo morto. Mas o pintor optou por um caudaloso banho de sangue, flagrando o momento exato da execução e o horror na face da vítima, que tem o pescoço serrado pela metade. Judite, por sua vez, não demonstra medo, parece apenas apreensiva. Barroca, a arte de Caravaggio, oscila entre a beleza “natural”, presente na luz, nas flores e nos frutos, e uma outra beleza, atributo da morte, e não da vida.
(Fonte: Veja, 18 de março de 1992 – ANO 25 – Nº 12 – Edição 1226 – ARTE/ Por Marco Antonio de Rezende, de Roma – Pág: 102/103/104)
Pintura de Caravaggio encontrada em sótão na França é vendida a comprador misterioso
Quadro é estimado entre 100 e 150 milhões de euros, mas valor da venda não foi divulgado por acordo de confidencialidade.
Um comprador misterioso estrangeiro arrematou uma pintura de autoria do mestre italiano Caravaggio, que havia sido descoberta há cinco anos em um sótão francês, antes que ela fosse a leilão, afirmou a casa de leilões Marc Labarbe em 25 de junho.
O quadro, cujo valor estimado era entre 100 e 150 milhões de euros ( entre R$ 435 milhões e R$ 653 milhões), data de 1607 e retrata a heroína bíblica Judite decapitando o general assírio Holofernes.
O leilão de “Judite e Holofernes” havia sido marcado para o dia 27 de junho na cidade francesa de Toulouse. A obra foi encontrada em 2014 pelos proprietários de uma casa em Toulouse enquanto eles investigavam um vazamento no sótão.
“A pintura foi vendida de maneira privada a um comprador estrangeiro”, disseram em nota a casa de leilões Marc Labarbe e o especialista em arte Turquin em nota. “Essa venda é coberta por um acordo de confidencialidade em relação ao preço e à identidade do comprador.”
A obra deixará o solo francês e será exibida em um “grande museu” que não foi identificado, disseram os leiloeiros.
“A obra, que foi mantida no sótão ‘por pelo menos 100 anos’, passou por análises exaustivas e inicialmente secretas para que sua autenticidade fosse conferida e está, surpreendentemente, em boas condições”, disse Turquin anteriormente.
A pintura á a segunda de Caravaggio a retratar a decapitação de Holofernes por Judite. A primeira, que data de aproximadamente 1600, está em exibição no Palácio Barberini, em Roma.