Humberto Esmeraldo Barreto, foi dirigente da Petrobras, da Caixa Econômica, da Norquisa Petroquímica e da Transbrasil, mas antes de tudo foi amigo de Ernesto Geisel (1911-1996) desde os 17 anos.
Bacharel em ciências jurídicas e sociais em 1961, pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, instituição que viria a integrar a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), iniciou sua vida pública em 1964, ao ser nomeado diretor da Caixa Econômica Federal do Rio de Janeiro. Dois anos depois tornou-se membro do Conselho Superior das Caixas Econômicas Federais. Como diretor, foi um dos responsáveis pela substituição do regime estatutário dos economiários pelo da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o primeiro passo para a transformação da instituição em empresa pública, com uma estrutura mais moderna e empresarial. Depois da posse do general Artur da Costa e Silva na presidência da República em 1967, deixou a Caixa Econômica, passando a vender material de construção na Barra da Tijuca, no Rio.
Amigo pessoal do general Ernesto Geisel, de quem se tornou, segundo o Jornal do Brasil (5/1/1978), uma espécie de secretário permanente, foi chamado para o seu gabinete em 1969, quando Geisel assumiu a presidência da Petrobras. Em 1971, passou a diretor econômico-financeiro da Petrobras Distribuidora, onde permaneceria até 1974, quando foi substituído por Ariovisto de Almeida. No final de 1971, formou-se em administração de empresas pela Faculdade de Ciências Contábeis e Administrativas Morais Júnior, no Rio de Janeiro.
Após a posse de Geisel na presidência da República em março de 1974, embora convidado por Mário Henrique Simonsen, ministro da Fazenda, para assumir a presidência da Caixa Econômica Federal, Humberto Barreto foi nomeado chefe da Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP) da Presidência da República. Tido como um dos colaboradores mais próximos do presidente, atuou no sentido de aproximá-lo da imprensa. Participou ativamente da escolha do almirante Floriano Faria Lima para governar o novo estado do Rio de Janeiro, produto da fusão realizada em 1975 entre os antigos estados do Rio de Janeiro e da Guanabara. Foi, ainda, responsável pela escolha do governador do Ceará, Adauto Bezerra. Após o fracasso da Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido do governo, nas eleições de novembro de 1974, defendeu o fim do bipartidarismo, apesar da opinião contrária do presidente.
Em fevereiro de 1977, com a nomeação de Carlos Rischbieter para a presidência do Banco do Brasil, foi mais uma vez convidado pelo ministro Mário Henrique Simonsen para substituir o primeiro na presidência da Caixa Econômica Federal. Sua resistência em aceitar o convite, bem como a de Geisel em liberá-lo, foi afinal superada pela insistência de Simonsen. Autorizado pelo presidente da República, tomou posse no dia 11 de abril. Na ocasião, proferiu discurso onde anunciou, como uma de suas principais metas, tornar acessível a aquisição da casa própria pela classe média, pois considerava que a habitação popular, destinada à população de baixa renda, já estava satisfatoriamente equacionada pelos vários programas em funcionamento. Com esse propósito, restabeleceu, em fins de abril, o financiamento de imóveis usados. Quase simultaneamente, deu início a uma campanha visando ao aumento substancial dos depósitos de poupança da Caixa Econômica, de modo a viabilizar os financiamentos da Carteira Hipotecária.
Em 12 de julho de 1977, lançou a candidatura do general João Batista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), à presidência da República, em pronunciamento que se constituiu na primeira menção pública à candidatura Figueiredo fora dos círculos palacianos. Um mês depois, passou a defender a eleição de um vice-presidente civil, indicando o governador do Rio Grande do Sul, Sinval Guazelli.
Em 14 de fevereiro de 1978, decidido a disputar uma cadeira de deputado federal pelo Rio de Janeiro na legenda da Arena, teve aprovado pelo presidente Geisel seu pedido de exoneração, sendo então nomeado para substituí-lo Ariovisto de Almeida. Nesse mesmo dia, em entrevista ao Jornal do Brasil, negou a existência de qualquer acordo eleitoral entre ele e o ex-governador Antônio de Pádua Chagas Freitas, embora houvesse tomado conhecimento, através da imprensa, do apoio dado por aquele político, líder de uma das alas do MDB fluminense, à sua candidatura. Em fins de maio seguinte, no entanto, dirigiu carta ao deputado Alair Ferreira, presidente em exercício do diretório da Arena do Rio de Janeiro, anunciando sua desistência de candidatar-se em virtude de problemas de saúde. As acusações do deputado Sinval Boaventura, da Arena mineira, de que mantinha ligações com a ala mais radical da oposição — formada por José Alencar Furtado, Fernando Lira e Roberto Saturnino Braga — não prejudicaram suas relações com o presidente Geisel ou com o general Figueiredo. Assim, em julho de 1978, foi convidado por Figueiredo para ajudá-lo na campanha à presidência da República.
Com o término do governo Geisel em março de 1979, Humberto Barreto deixou a vida pública. Nesse mesmo ano, tornou-se diretor-presidente executivo da Transbrasil S.A. Linhas Aéreas. Permaneceu nessa empresa até abril de 1988, tendo exercido, ao longo desses anos, os cargos de vice-presidente e secretário-geral do conselho de administração e controle. Neste último ano, tornou-se assistente da presidência da Nordeste Química S.A. (Norquisa), presidida desde 1980 pelo ex-presidente Geisel. No ano seguinte, passou a acumular essas funções com a de diretor da Previnor — Associação de Previdência Privada, e em 1993, acrescentou a esses cargos o de secretário-geral da Norquisa. Aposentado, em 1995 passou a consultor dessa mesma empresa.
Continuidade
Trabalhando em funções públicas com Geisel desde 1969, quando o assessorou na Petrobras, até 1979, quando estava na direção da Caixa Econômica Federal, Barreto participou de articulações políticas, como o lançamento de Figueiredo como candidato à sucessão de 1979, contrapondo-se ao nome de Sylvio Frota, preferido pela linha-dura militar.
“A cada conversa que tínhamos, juntava as pedrinhas. Até por exclusão, a escolha batia no Figueiredo. A principal característica que procurava era alguém que continuasse a sua obra”, diz.
Barreto conta o episódio em que começou a perceber como era a relação de Geisel e Figueiredo. O primeiro já havia sido escolhido candidato por Médici à sua sucessão e discutia quem seria o vice. Geisel não queria que fosse o almirante Adalberto Pereira dos Santos, como pretendia Médici.
“Eu quero um vice para valer. O Adalberto é homem direito, mas não é um homem para isso. Quero que, na minha falta, não haja crise nenhuma”, disse Geisel, segundo o relato de Barreto.
Geisel reuniu-se no dia seguinte com Figueiredo, então chefe do Gabinete Militar da Presidência, na casa de Barreto. “O preferido do Geisel era o brigadeiro Araripe Soares, mas ele tentou contornar a indicação do presidente dizendo ao Figueiredo: “O Médici faz questão, porque, se dependesse de mim, o vice seria você”.
O casal Barreto foi parceiro do casal Geisel por 20 anos no jogo de biriba.
Trecho
Veja, a seguir, um trecho do livro de Gaspari:
“O círculo de ferro afrouxava-se nos fins de semana. No Riacho Fundo, o pai [Geisel] desfrutava a companhia de seu melhor amigo. É impossível dizer se Humberto Barreto, aos 42 anos, era um amigo do presidente, de 66, ou a projeção recôndita do filho, que completaria 33 [se vivo fosse]. […] Humberto e a mulher, Lilian, foram constante companhia nos fins de semana do casal Geisel. Em 1964, formado em direito, era tesoureiro da Caixa Econômica Federal. O general ajudou-o a conseguir a chefia do serviço de penhores e mais tarde levou-o para uma diretoria da distribuidora da Petrobras. […] A principal qualificação de Humberto Barreto junto aos jornalistas decorreu do desembaraço com que criticava a censura e da sinceridade com que reconhecia a impossibilidade de sua suspensão imediata. […] Transformaria um cargo inexpressivo num dos mais importantes postos da República”
sobre Humberto Barreto, nas págs. 417 e 418 de “A Ditadura Derrotada”.
À sombra do governo e da vida do presidente Ernesto Geisel (1911-1996), moviam-se discretamente dois personagens: Heitor Aquino Ferreira, e Humberto Esmeraldo Barreto.
São testemunhos importantes na reconstrução dos bastidores do período da série “As Ilusões Armadas”, do jornalista e colunista da Folha Elio Gaspari, cujo mais recente volume, “A Ditadura Derrotada”, chegou às livrarias na semana passada.
Heitor Ferreira foi assistente de Golbery do Couto e Silva no SNI (Serviço Nacional de Informações) e de Geisel na Petrobras, antes de se tornar seu secretário particular. Acumulou documentos, 222 horas de gravações e 1.500 páginas de seu diário, com minuciosas descrições dos bastidores do poder entre 1964 e 1975.
Hoje traduz livros –como “Churchill”, biografia de Roy Jerkins, e “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell. Vive em Teresópolis, na região serrana do Estado do Rio. Recusou a sondagem da Folha para uma entrevista, citando um aviso que viu em Nova York, obra da administração do ex-prefeito Rudolph Giuliani: “Nem mesmo pense em estacionar seu carro aqui”.
Barreto recebeu com tranquilidade a repercussão das revelações do livro de Gaspari. “Não se pode julgar Geisel nem a obra do Elio por um livro. A análise tem de ser feita em cima do todo. O que conta é que Geisel devolveu o país à normalidade democrática. Só não fez a anistia porque não quis. Mas a deixou pronta para o [João Baptista] Figueiredo fazer. O livro não desilustra a imagem dele como tenho lido por aí”, disse Barreto à Folha, numa resposta velada à declaração do presidente do Senado, José Sarney, de que o livro frustra a imagem que tinha do quarto presidente do regime militar.
Gaspari revelou degravação de conversas de Geisel com o general Dale Coutinho, seu futuro ministro do Exército, a um mês de sua posse na Presidência. “Esse negócio de matar é uma barbaridade, mas tem que ser”, afirma Geisel, em uma de várias demonstrações de que sabia da morte de opositores sob custódia do regime.
Barreto afirma que Amália Lucy, filha de Geisel, não recebeu com simpatia a forma com que a imprensa tratou o livro de Gaspari, destacando o apoio à repressão e minimizando, segundo ele, o projeto de distensão política.
“Disse a ela que não há demérito para o Geisel. A obra é muito mais histórica do que jornalística. O que o jornal diz amanhã embrulha peixe. O livro fica”, diz.
“Na hora que o Geisel teve de brigar com a linha-dura, brigou. Como mostra o episódio da demissão do [ministro do Exército, Sylvio]Frota”, declara.
“Houve gente que, mesmo na oposição, compreendeu isso. O Tancredo [Neves] ajudou muito. O Ulysses [Guimarães] atrapalhou demais. Não conseguia entender as dificuldades que ele tinha. A linha-dura do Exército entendia que o presidente era um preposto dela. Na demissão do Frota, se não tivesse feito as coisas com inteligência, teria sido deposto”, afirma Barreto.
(Fonte: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/humberto-esmeraldo-barreto)
FONTES: CURRIC. BIOG.; IstoÉ (20/7/77); Jornal do Brasil (11 e 13/2, 12, 20 e 27/4, 12/7, 23/8 e 11/12/77, 5 e 11/1, 14 e 15/2, 3/6 e 15/7/78); Perfil (1975 e 1976); Veja (11/1/78).
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil – FOLHA DE S.PAULO – BRASIL – PODER/ PLÍNIO FRAGA da Folha de S. Paulo – “A Ditadura Derrotada”, do jornalista e colunista da Folha Elio Gaspari – 09/11/2003)
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