Fotógrafo de cinema Mário Carneiro, foi expoente do cinema novo
Ele era também pintor, gravador e arquiteto e assina fotografia de clássicos como “O Padre e a Moça” e “Todas as Mulheres do Mundo”
Mário Carneiro (Paris, 26 de julho de 1930 – Rio de Janeiro, 2 de setembro de 2007), foi um dos fotógrafos mais importantes do cinema brasileiro, um dos expoentes do cinema novo. Ele assina vários clássicos do cinema nacional, como ‘O Padre e a Moça’.
Mário Augusto de Bêrredo Carneiro, em arte mais conhecido como Mário Carneiro, foi um cineasta, arquiteto, pintor, gravador, fotógrafo e diretor de fotografia nascido em Paris, na França, em 26 de julho de 1930.
O fotógrafo foi um dos expoentes do Cinema Novo e também atuou como diretor e montador de filmes.
Entre os clássicos do cinema nacional que ele fotografou estão Arraial do Cabo (1959), Porto das Caixas (1961), O Padre e a Moça (1965), Capitu (1968) e O Viajante (1999).
Por 500 Almas, documentário dirigido por Joel Pizzini, Carneiro ganhou o prêmio de Melhor Fotografia no 37º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Ele era ainda pintor e gravador. Formou-se também na Faculdade Nacional de Arquitetura, em 1955.
Carneiro foi incentivado a seguir carreira no cinema pelo poeta Vinícios de Moraes, amigo de seu pai, que reconheceu seu talento após assistir à fita amadora A Boneca.
Além de fotografar títulos seminais da corrente cinemanovista nos anos 50 e 60, Carneiro atuou, “com seu senso crítico muito aguçado”, como interlocutor e conselheiro dos autores desse período.
Além da pintura, Carneiro exerceu, antes do cinema, as atividades de gravador e arquiteto. Nascido em Paris, filho de diplomata, ele alternou, na juventude, temporadas vividas no Brasil e na Europa.
Depois de realizar amadoristicamente o filme “A Boneca”, foi incentivado a seguir a carreira no cinema pelo poeta Vinicius de Moraes, amigo de seu pai, que assistiu ao título e avaliou que seu talento era mais marcante no cinema do que nas outras expressões artísticas.
O conselho de Vinicius e o caráter de “hit” que “A Boneca” ganhou entre os intelectuais da época foram lembrados por Carneiro em longa entrevista sobre sua carreira dada ao fotógrafo Lauro Escorel e publicada na página da Associação Brasileira de Cinematografia (www.abcine.org.br).
A estreia profissional de Carneiro no cinema brasileiro foi com “Arraial do Cabo” (1959), de Paulo César Sarraceni. A parceria com o cineasta seria repetida muitas outras vezes, como em “Porto das Caixas” (1961), “Capitu” (1968), “Natal da Portela” (1987), “A Casa Assassinada” (1973) e “O Viajante” (1999).
É extensa também a parceria de Carneiro com Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988), para quem fotografou “Garrincha, Alegria do Povo” (1962), “O Padre e a Moça” (1965) e o episódio “Couro de Gato” no longa coletivo “Cinco Vezes Favela” (1961), cuja “refilmagem” Cacá Diegues coordena atualmente, com o projeto “Cinco Vezes Favela – Agora por Eles Mesmos”.
Carneiro assinava ainda a fotografia de dois importantes longas do cineasta Domingos Oliveira -“Todas as Mulheres do Mundo” (1965) e “Edu, Coração de Ouro” (1966).
Mesmo atingido pelo câncer, Carneiro procurou prosseguir com a carreira. Ele fotografou “Harmada”, de Maurice Capovilla, e o documentário “500 Almas”, de Joel Pizzini, que estreou em 2007.
Com Glauber Rocha, o maior ícone do cinema novo, Carneiro realizou o curta-metragem “Di”, que foi premiado no Festival de Cannes, mas teve suas exibições públicas interditadas, a pedido da família do pintor Di Cavalcanti, que considera a obra ultrajante à memória do artista.
Carneiro foi o câmera e diretor de fotografia do curta, que registra o enterro de Di, no qual Glauber executa uma feérica performance narrativa.
Mário Carneiro morreu dia 2 de setembro de 2007, em sua casa, no Rio de Janeiro, aos 77 anos, sofria de câncer.
“Pintor de origem, ele fazia da fotografia do filme uma linguagem, não um enfeite”, aponta o produtor e também fotógrafo Luiz Carlos Barreto.
“Mário foi o primeiro diretor de fotografia que conheci. Foi vendo-o trabalhar que me aproximei da arte da cinematografia. Um artista que, ao juntar à fotografia seu talento de pintor, criou algumas das mais belas imagens do cinema brasileiro”, disse Escorel ontem à Folha.
Antes do cinema novo, “a fotografia brasileira [em cinema]não correspondia à luz brasileira”, cita Barreto, que fotografou “Vidas Secas” (1963), de Nelson Pereira dos Santos.
“A busca que tínhamos era no sentido de produzir uma fotografia mais representativa da luz tropical”, afirma Barreto. “Eliminávamos todos os efeitos típicos do mundo setentrional, onde há falta e não excesso de luz”. O resultado é que “além de ser um grande fotógrafo e grande pintor, Carneiro foi mestre de tanta gente. Lauro [Escorel], Afonso [Beato], Dib [Lutfi], todos foram discípulos dele”, cita Diegues.
Recentemente, já abatido pela doença, suspendeu as atividades. “Nas últimas vezes em que falei com ele, não pudemos ter conversas longas, porque ele se cansava rápido”, afirma Diegues.
“Por esses filmes e por muitos outros, como “O Padre a Moça” e “Crônica da Casa Assassinada”, ele seguirá conosco, afirma Escorel.
(Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada – FOLHA DE S.PAULO – ILUSTRADA / DA REPORTAGEM LOCAL – São Paulo, 04 de setembro de 2007)
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(Fonte: http://cinema.terra.com.br/noticias – DIVERSÃO – CINEMA – 04 de setembro de 2007)
Fotógrafo do Cinema Novo, Mario Carneiro tem pinturas e gravuras lançadas em livro
Ele tinha formação artística mais ampla, para além da direção de fotografia
Mario Carneiro (1917-2008) entrou para a história das artes brasileiras como o fotógrafo do Cinema Novo. Só que ele tinha uma formação artística mais ampla, para além da direção de fotografia, com uma trajetória pouco conhecida nas artes visuais. Agora, essa trajetória é revista em livro, que reúne pinturas, gravuras, fotos e desenhos feitos por ele — numa tentativa de reescrever a história de Carneiro para a posteridade. “Mario Carneiro trânsitos”, organizado pela artista plástica Fabiana Éboli, pelo crítico de arte Adolfo Montejo Navas e pelo crítico de cinema Carlos Alberto Mattos, reúne imagens da produção visual do artista.
O projeto começou com a ideia de Fabiana Éboli, amiga do artista, de empreender uma pesquisa no acervo de Mario Carneiro e em coleções privadas, com a colaboração da viúva dele. Inscrita no edital de organização de acervos e publicações de artistas falecidos da Funarte, a pesquisa durou cerca de seis meses e encontrou 900 imagens produzidas por Carneiro ao longo de 60 anos. Trezentas delas foram escolhidas para compor o livro. Além de na casa do artista, uma parte das obras estava no acervo do embaixador Paulo Carneiro, pai de Mario, guardado na Fundação Oswaldo Cruz.
— Eu sabia que ele tinha essa obra como artista plástico, mas não tinha ideia de que atingia essa dimensão, porque ele ficou mais conhecido como fotógrafo de cinema — diz Fabiana. — O título do livro veio dessas imagens. Porque Mario Carneiro era um artista moderno, mas com uma postura extremamente contemporânea, por manter uma experimentação com diferentes linguagens.
O trânsito entre suportes e materiais aparece em todo o livro. Além da pintura — presente no óleo sobre tela e no guache sobre papel, duas das técnicas usadas por ele —, Mario Carneiro experimentava ainda com intervenções sobre negativos, depois impressos em papel comum, e com a gravura sobre papel fotográfico, entre outras técnicas. Segundo Adolfo Montejo Navas, a influência das artes plásticas pode ser vista no tratamento que Carneiro dava ao cinema, em planos que lembravam, muitas vezes, pinturas em movimento.
Um dos destaques do livro são as caricaturas eróticas de Carneiro, nas quais o artista retrata orgias sexuais. Com títulos como “Chá inglês”ou “Cocktail party”, ele — que era marxista — ironiza costumes burgueses enquanto mantém sua verve irônica. O elemento satírico, aliás, é uma das marcas de boa parte das obras presentes no seu acervo. Em algumas das orgias, Mario Carneiro retratava a si mesmo observando a cena, numa espécie de intervenção hitchcockiana. Já na gravura, como diz Navas, predomina uma “visualidade mais convencional”, quase sempre figurativa e com motivos clássicos, como as naturezas mortas e os animais.
Conhecer a obra de Mario Carneiro como artista plástico ajuda a entender melhor sua trajetória como fotógrafo de cinema, diz o crítico Carlos Alberto Mattos, um dos organizadores do novo livro. Isso se refletia na relação do fotógrafo com a luz. Em sua primeira fase no Cinema Novo, segundo o crítico, Carneiro buscava um diálogo com as noites de Oswaldo Goeldi, explorando o contraste do preto e branco. Mais tarde, quando começou a trabalhar nos filmes em cor, como “A casa assassinada” (1971), o artista teria chegado a uma “luz brasileira”, mais semelhante a Guignard e Gauguin.
— Tenho a impressão de que o cinema acabou engolindo o Mario por aquela coisa social. Ele não gostava da solidão do pintor, enquanto o cinema o reverenciava como um artista maior — diz Mattos. — Sempre ouvia as pessoas chamando-o de artista da fotografia, mas achava que era por conta da beleza das imagens. Hoje vejo que era por esse trânsito que ele fazia, o tempo inteiro, entre artes plásticas e cinema. Não era só retórica.
Influência de Iberê Camargo
Apesar da fama no Cinema Novo, Mario Carneiro formou-se em Arquitetura, paralelamente aos estudos de pintura. Durante o período em que morou na França, no fim dos anos 1940 e começo dos 1950, costumava passar tardes no Museu do Louvre copiando as telas dos grandes mestres.
Foi nessa mesma época em que ele se tornou amigo de Iberê Camargo, apontado muitas vezes como seu mestre artístico — embora Fabiana afirme que a convivência dos dois tenha se tratado mais de uma influência mútua do que uma relação entre professor e discípulo. Filho de diplomata, o artista conviveu, em seu apartamento na França, com nomes como Lygia Clark, Cecília Meireles, Herbert Read (1893-1968) e Vinicius de Moraes. Foi este último, aliás, quem profetizou que Mario Carneiro trocaria as artes plásticas pelo cinema. O Poetinha só não previu que ele continuaria com a atividade paralela.
(Fonte: https://oglobo.globo.com/cultura – CULTURA / POR MAURICIO MEIRELES – 04/01/2014)