Economista e ex-ministro do Planejamento Reis Velloso, foi responsável pelos planos de desenvolvimento do governo militar, criou um fórum de debates sobre o futuro do país
O idealizador da economia
João Paulo dos Reis Velloso (Parnaíba, Piauí, 12 de julho de 1931 – Rio de Janeiro, 19 de fevereiro de 2019), economista e ex-ministro do Planejamento durante os governos de Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel, permanecendo no cargo entre 1969 e 1979.
O economista foi o mentor de uma fase de crescimento do Brasil que associou força de investimento a endividamento externo das empresas estatais. Foi um dos criadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entidade crucial para aferir as finanças do país.
Reis Velloso foi um dos economistas mais influentes do regime militar ao participar dos principais planos de desenvolvimento pensados para o país na época. Formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), foi ministro do Planejamento entre 1969 e 1979, durante os governos de Emílio Médici e Ernesto Geisel.
O ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso serviu a diferentes governos desde o início da ditadura militar, em 1964, passando pelos governos Castelo Branco, Costa e Silva, Médici e Geisel.
Ao ser homenageado pelos seus 50 anos de idade, em 1981, com uma festa para mais de mil convidados, não exagerou ao dizer que, apesar de “cinquentão”, ainda se sentia jovem, com muitas ideias e planos. Personagem singular na cena política brasileira sem nunca ter concorrido a um cargo público, a despeito da pressão de lideranças, àquela época já havia sido ministro do Planejamento por dez anos, fundado e presidido o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada (IPEA). Ainda estava por criar o Fórum Nacional de Altos Estudos.
Há três décadas, o evento reúne economistas, governantes e empresários, anualmente, para discutir temas que giram em torno do que foi a sua maior preocupação nacional: o desenvolvimento econômico. Só deixou a condução dos debates em 2017, quando, com a saúde debilitada, se afastou da vida pública. Passou o bastão para um dos seus irmãos, o também economista Raul Velloso.
Visto como um político liberal e, em relação à visão econômica como um desenvolvimentista, transitou em governos de seis presidentes distintos, entre 1961 e 1979. Mesmo tendo sido ministro em dois governos do período da ditadura militar – dos generais Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel, de 1969 a 1979 -, dificilmente sua imagem é associada ao clima de medo, falta de liberdade, torturas e mortes que marcaram os duros anos inaugurados em 1964. Pensar em Reis Velloso é lembrar do planejador comprometido, sensível ao papel da ciência, da tecnologia e a da produção acadêmica para promover o desenvolvimento do país.
Em 1967 ajudou a criar a Fundação Brasileira de Inovação e Pesquisa (Finep). De 1968 a 1969, durante o governo do Marechal Artur da Costa e Silva, integrou o Conselho Federal de Educação (CFE) e o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq). Mais tarde, já durante o regime democrático, e dedicado apenas ao Fórum, disse que conseguiu manter o planejamento e traçar estratégias de desenvolvimento mesmo durante o período mais crítico do regime militar, no começo dos anos 1970, porque ambos os governos começaram com promessa de redemocratização e que a área econômica tinha um “bom” grau de autonomia.
Sua gestão como ministro do Planejamento foi marcada por dois momentos distintos: o apogeu do chamado “Milagre Brasileiro” e a “Crise do petróleo de 1973”.Em 1987, em seu livro “Último Trem para Paris”, fez uma autocrítica no capítulo “A insustentável leveza do PND”, no qual comenta o polêmico Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) do governo Geisel, acusado por alguns de ter levado o país a pisar no acelerador, quando o momento, em face da crise do petróleo, deveria ter sido de freio. O nome do livro, assim como do capítulo citado, conjuga o interesse intelectual de Reis Velloso pelos processos históricos de desenvolvimento econômico do Brasil e no mundo com sua paixão pelo cinema. O último trem, no caso, é aquele que, simbolicamente, seria capaz de transportar um país subdesenvolvido, condição do Brasil na época, para o rol das nações ricas, algo que o ex-ministro não viu acontecer. Velloso era defensor fervoroso dos dois governos nos quais foi ministro.
Em 2009, durante o seminário organizado pelo JORNAL O GLOBO “Cenários e Perspectivas para o Brasil”, afirmou que o país perdeu “know how do alto crescimento” no período pós-militar e que, por isso, não conseguiu chegar aos mesmos níveis de crescimento da Coreia do Sul. Em 1970, período em que Velloso era ministro do Planejamento, o país asiático tinha metade da renda per capita brasileira. Quarenta anos depois, o Brasil estava em desvantagem: tinha apenas um terço da renda sul coreana.
– O Brasil tinha tudo para estar bem melhor que a Coreia até a altura de 1980. Em meados daquela década até o início deste século, houve a desconstrução do alto desenvolvimento. Ganhamos estabilidade dos preços como valor social, mas perdemos o desenvolvimento como valor social – criticou à época.
A desigualdade na distribuição de renda o preocupava porque aumentou durante o período do “Milagre” (1968 a 1973). Segundo Velloso, em decorrência de um tipo de industrialização que privilegiou as aptidões e jogou para o alto os salários da mão de obra super especializada. Em 1979, ao desembarcar ainda na condição de ministro na sua terra natal, o Piauí, falou sobre a necessidade de criação de um programa especial para a acabar com a “pobreza absoluta”.
– Não é algo que se resolve simplesmente pela política de crescimento, nem mesmo através do simples dinamismo na área social. A pobreza absoluta tem de ser atacada diretamente, por programas específicos, como através da auto-suficiência alimentar em áreas pobres e dos programas de alimentos básicos.
Trajetória pessoal
Filho de uma costureira e de um funcionário dos Correios, João Paulo dos Reis Velloso nasceu em Parnaíba, Piauí, em 12 de julho de 1931. Vinte ano depois, mudou-se para o Rio de Janeiro, então capital do país, incentivado pela mãe, pois em sua cidade não havia possibilidade de cursar o ensino superior. Foi secretário do deputado federal Jorge Lacerda, da UDN de Santa Catarina, escriturário, oficial de administração e ocupou alguns cargos de confiança do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI) até que, em 1955, passou em um concurso público do Banco do Brasil e mudou-se para São Paulo. Foi na capital paulista que iniciou o curso de economia, na Fundação Álvares Penteado. Transferido para o Rio, concluiu a faculdade na UERJ.
No governo de João Goulart (1961-1964) serviu no gabinete do ministro da Fazenda, Válter Moreira Sales. Também foi aluno da Fundação Getúlio Vargas, onde depois viria a lecionar por mais de três décadas. Entre 1962 e 1964 fez mestrado em Economia na Universidade de Yale, em New Haven (EUA). Avesso a atividades políticas, recusou um convite para se candidatar ao Senado pelo PDS do Piauí, em 1982, após sondagem feita pelo então governador Lucídio Portela (1922-2015). Em 2013, durante uma homenagem a Reis Velloso na FGV, o então presidente do Ipea e hoje diretor da FGV Social, Marcelo Neri, destacou a vida de feitos do ex-ministro:- É uma enorme responsabilidade cuidar do quinto filho do ministro Reis Velloso, o Ipea. Ele teve outros como a FINEP, o Sebrae, o Fórum.
Sua capacidade de criar instituições longevas é impressionante. As marcas do ministro são sua paixão pelo Brasil e seu olhar sempre voltado para o futuro. Daí vem a jovialidade que ele passa, pois juventude é olhar para o futuro. Na mesma ocasião, o presidente da FGV, Carlos Ivan Simonsen Leal, destacou o privilégio de ter sido aluno de um “criador de ideias, simples, idealista e dedicado, um dos homens mais excepcionais deste país”.
— Sem uma visão estratégica, o Brasil vai ficar entre voos de galinha e recessão. A crise não foi recente, foi sendo criada ao longo do tempo e havia sinais óbvios. Partimos de altas taxas de crescimento para voos de galinha, baixo crescimento e, agora, recessão — disse na ocasião.
Na avaliação de Velloso, a despeito da situação grave da economia, a política era o que mais preocupava:
— O maior problema brasileiro é político. Não é econômico, não é social, não é fiscal. Temos 30 e tantos partidos, e é tudo lixo. Os partidos devem ter corresponsabilidade com o crescimento sustentável e a geração de empregos.
Em novembro desse mesmo ano, em uma de suas últimas declarações públicas, Velloso se posicionou contra as principais mudanças propostas pela reforma trabalhista do governo Temer. Defendeu idade mínima de 60 anos para aposentadoria, cinco anos menos que a proposta do governo, e a manutenção do tempo mínimo de contribuição, de 35 anos para homens e de 30 anos para mulheres.
(Fonte: https://oglobo.globo.com/economia – ECONOMIA / Por O Globo – 19/02/2019)
(Fonte: https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/02/19 – ECONOMIA / Por G1 – 19/02/2019)
(Fonte: Zero Hora – ANO 55 – N° 19.327 – 20 de fevereiro de 2019 – TRIBUTO / MEMÓRIA – Pág: 29)
(Fonte: Veja, 27 de fevereiro de 2019 – ANO 52 – N° 9 – Edição 2623 – DATAS – Pág: 27)
Ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso atuou nos governos de Castelo Branco, Costa e Silva, Médici e Geisel
Como ministro do Planejamento, Reis Velloso era considerado um dos civis mais poderosos do governo Geisel. O ex-ministro entrou para a política em 1951, aos 20 anos, conforme o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getulio Vargas (Cpdoc/FGV). Naquele ano, se mudou para o Rio, então capital, vindo de sua Parnaíba natal, para trabalhar como secretário do deputado federal Jorge Lacerda, da UDN (União Democrática Nacional, partido de oposição ao então presidente Getúlio Vargas) de Santa Catarina.
O ex-ministro não viveu a derrocada do governo João Goulart nos gabinetes ministeriais, já que, em 1962, foi estudar na Universidade Yale, em New Haven (EUA), onde obteve o mestrado em Economia, em maio de 1964. Quando voltou ao Brasil, em julho daquele ano, o governo militar do marechal Humberto Castelo Branco já estava instalado em Brasília.
Reis Velloso foi então trabalhar no Ministério do Planejamento, comandado pelo economista Roberto Campos, ícone do liberalismo econômico no País. Na nova função, ainda conforme o Cpdoc da FGV, Reis Velloso organizou e chefiou, até 1968, o Escritório de Pesquisa Econômica e Social Aplicada (EPEA), hoje Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em abril de 1968, assumiu o cargo de secretário-geral do Ministério do Planejamento.
Reis Velloso assumiu como ministro no fim de 1969, em seguida da posse do general Emílio Garrastazu Médici na Presidência. À frente do Planejamento, coordenou as duas edições do Plano Nacional de Desenvolvimento (PND). O I PND foi lançado em 1972, e o II PND, em 1974.
O ex-ministro deixou o Ministério do Planejamento em 1979. O novo presidente, o general João Batista de Figueiredo, indicaria o ex-ministro da Fazenda Mário Henrique Simonsen para a pasta do Planejamento.
A saída do Ministério do Planejamento marcou o fim da carreira política de Reis Velloso. Ainda conforme o Cpdoc da FGV, seu nome seria aventado como candidato ao governo do Piauí, mas o ex-ministro optou por assumir a presidência, ainda em 1980, do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), ligado à Bolsa de Valores do Rio.
De lá para cá, Reis Velloso integrou conselhos de administração de diversas estatais, mas atuou principalmente no setor privado. Em 1988, organizou o I Fórum Nacional, com o tema “Ideias para a modernização do Brasil”. O evento reuniu economistas, cientistas sociais e políticos, líderes sindicais e empresariais, para discutir temas sociais e econômicos da atualidade. Com a criação do Instituto Nacional de Altos Estudos (Inae), o Fórum Nacional se tornaria anual a partir dos anos 1990.
(Fonte: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral – NOTÍCIAS / GERAL / POLÍTICA / Por Vinicius Neder, O Estado de S.Paulo – 19 Fevereiro 2019)