Em 8 de novembro de 1926 – Antonio Gramsci, político, cientista político, comunista e militante antifascista italiano, é preso.
(Fonte: Correio do Povo ANO 117 – Nº 39 – Cronologia – 8 de novembro)
Teórico marxista Antonio Gramsci jogou novas luzes sobre o socialismo
Antonio Gramsci (Ales, 22 de janeiro de 1891 – Roma, 27 de abril de 1937), foi o mais expressivo teórico marxista italiano, falecido a 30 de abril de 1937, aos 46 anos, após curtir longa e dura pena num presídio fascista. Pensador italiano, escreveu maior parte de sua obra na prisão, durante o regime fascista de Benito Mussolini, seu ex-colega no Partido Socialista
Gramsci foi a única inteligência marxista comparável a Lênin e que seu único discípulo se chama Mao Tsé-Tung.
Para desespero de muitos comunistas, atribui ao co-fundador (com Palmiro Togliatti) do PCI o polêmico papel de crítico número 1 – e insofismável – do estalinismo. Gramsci tinha o regime soviético vigente a partir da morte de Lênin na conta de uma equivocada burocracia, dogmática, personalista, violenta e mentirosa.
“Em política de massas”, advertiu, “dizer a verdade é a ‘necessidade política'”. Não lhe deram ouvidos.
Reformista, idealista – era o que diziam a seu respeito as más línguas do partido. Achavam-no também um tanto espirituoso, talvez porque não visse conflitos de monta entre o humor e o marxismo-leninismo. Adorava citar fábulas e provérbios. Ao saber do castigo que Stálin havia infligido ao dissidente Trotski, comentou, espirituosamente: “Quebrar o barômetro não serve para suprimir o mau tempo.” Não era trotskista.
Ao contrário, considerava-o um “temperamento jacobino, privado de um conteúdo político adequado.” Por curiosidade, desejou ler seus escritos na prisão, mas o Partido não permitiu. Mussolini, por sua vez, não o deixou receber uma só linha de Lênin.
No presídio, onde, entre outros afazeres, produziu epístolas doutrinárias *, interpretou como ninguém, desde Hegel, o “Príncipe” de Maquiavel. Dele extraiu lições preciosas a respeito da relação e da aliança entre cidade e campo, com vistas à derrubada do Estado burguês, bem como da “relação dialética entre autoridade e consenso”. Até concluir que o Partido Comunista dos seus sonhos deveria ser uma versão moderna do “Príncipe”.
Em 1928, o promotor fascista do governo italiano indicado para o seu processo, em Roma, foi categórico: “Devemos impedir esse cérebro de funcionar durante vinte anos.” Gramsci, apesar dos inimigos de todos os lados, não parou de pensar e de escrever.
Suas análises, de múltiplos tópicos – desde a forma mais pura do Estado socialista até a desagregação crescente da classe operária, passando pelo jornalismo do futuro e o feminismo -, soam tão atuais quanto proféticas. Pouco antes de morrer desabafou: “Sou um vencido… mas, a longo prazo, a força das coisas trabalha por mim.”
* “Cartas do Cárcere”, “Literatura e Vida Nacional”, “Concepção Dialética da História” e “Os Intelectuais e a Organização da Cultura”.
(Fonte: Veja, 11 de agosto de 1976 – Edição 414 – LITERATURA/ Por Maria Antonietta Macciocchi – Sérgio Augusto – Pág: 127/128)
Jornalista, crítico literário e político, Antonio Francesco Gramsci tornou-se referência na política internacional de esquerda ao renovar as visões sobre o marxismo, com a sua “hegemonia política” que explica a forma com que o Estado usa as ferramentas culturais como meio para sua perpetuação no poder. O responsável por iniciar Gramsci no socialismo foi seu irmão mais velho, Gennaro, que o levou, aos 14 anos, para a cidade italiana de Cagliari, onde trabalhava e frequentava o curso clássico, equivalente ao ensino médio. Lá, Gramsci teve os primeiros contatos com o socialismo e a luta de classes. Foi o professor de literatura Raffa Garzia, com suas ideias democráticas e, percebendo que estava diante de um potente aluno, quem lhe recomendou as leituras de obras de autores como Benedetto Croce e Caetano Salvemini, além de jornais contrários ao clero.
Aos 21 anos, Gramsci, o quarto de sete filhos de Francesco e Peppina Marcias, nascido em Ales, na Sardenha, em 22 de janeiro de 1891 para se tornar o ”Lênin do Ocidente”, deixou a casa dos pais para cursar a Faculdade de Letras de Turim, graças a uma bolsa de estudos cedida pelo Colégio Albertino, no Piemonte. Na faculdade se dedicou a trabalhar sempre em publicações de concepções socialistas e conheceu aqueles que seriam os companheiros do futuro Partido Comunista Italiano, entre eles, Palmiro Togliatti, que se tornaria secretário do PCI, e Angelo Tasca, filho de operário, depois dirigente da legenda.
Em 1913, Gramsci se filiou na seção torinense do Partido Socialista Italiano e iniciou sua produtiva carreira jornalística, publicando artigos polêmicos em periódicos universitários. Depois de passar pelo terror da Primeira Guerra Mundial e pela Revolução Russa, o jornalista aderiu à ideologia leninista e, em 1921, participou da fundação do Partido Comunista da Itália, tornando-se seu representante junto à Internacional Comunista, com sede em Moscou, onde conheceu a russa Julia Schucht, com quem se casou e teve dois filhos.
A linha de pensamento de Gramsci para o sucesso do comunismo no Ocidente, como ocorreu inicialmente na Rússia, se baseava no que ele chamou de ”hegemonia política”, especialistas chamam de “hegemonia de classes” ou ”hegemonia cultural”. Resumidamente, era a busca da confiança na classe média europeia para o avanço do socialismo, uma vez que a ”sociedade civil” ocidental já era bem fortalecida, ao contrário do que ocorrera em território russo, quando bastou o desmoronamento do czarismo para o sucesso do novo regime.
O que Gramsci chama de ”sociedade civil” são instituições de forças políticas e ideológicas, como os partidos, a Igreja, os sindicatos, a imprensa etc. Essa linha de raciocínio foi estruturada durante o tempo em que ficou na prisão, quando produziu 3 mil páginas manuscritas, resultando posteriormente nos chamados “Cadernos do cárcere”, que totalizam 33 volumes. A partir da difusão desta obra, após sua morte, é que surgiu o termo ”eurocomunismo”, o comunismo à Europa. O jornalista foi preso em 1927, quando Benito Mussolini, um dos fundadores do fascismo, já se instalara no poder como primeiro-ministro da Itália (1922-1943). O regime do “duce” (líder) defendia o nacionalismo, o corporativismo, o sindicalismo nacional, o expansionismo, o progresso social e o anticomunismo, não tardando a perseguir e prender os que discordavam de seu governo. Mussolini havia sido seu colega no Partido Socialista. O jornalista e pensador foi condenado a 20 anos, quatro meses e cinco dias de prisão, mas deixou a cadeia depois de dez anos e cinco meses, já muito debilitado.
No chamado período pré-cárcere, o socialista escreveu principalmente ensaios sobre literatura e teoria política, muitas dessas obras publicadas no Brasil no livro “Escritos políticos”. Já os escritos durante a prisão foram traduzidos para o português por especialistas como o filósofo e responsável por difundir suas obras no país, Carlos Nelson Coutinho. Em entrevista ao GLOBO, publicada em 27 de setembro de 2003, Coutinho declarou que considerava Gramsci “o maior teórico marxista da política, aquele que mais se dedicou a esse aspecto do marxismo”.
Em 1962, o editor Ênio Silveira, da Civilização Brasileira, já se dedicara a publicar os ”Cadernos”, baseado na edição temática de Palmiro Togliatti, secretário-geral do PCI, mas o trabalho teve que ser interrompido porque a editora foi vítima da onda repressora após o golpe de 1964. Somente 30 anos depois a editora retomou o projeto, como relatou ao jornal o filósofo Leandro Konder na edição de 13 de maio de 2000. As obras de Antonio Gramsci, e a difusão de suas ideias sobre esse novo ”comunismo”, são um sucesso póstumo. Oitenta anos depois de sua morte, mesmo não sendo de leitura fácil, suas ideias sobre a concepção do novo socialismo continuam a despertar interesse em jovens estudantes e especialistas do marxismo.
Antonio Gramsci morreu em 27 de abril de 1937, aos 46 anos, em um hospital de Roma, três dias após deixar a cadeia.
(Fonte: http://acervo.oglobo.globo.com – EM DESTAQUE – CULTURA/ Por Sandro Macedo* – 16/04/17)
* com edição de Matilde Silveira
O filósofo italiano atribuía à escola a função de dar acesso à cultura das classes dominantes, para que todos pudessem ser cidadãos plenos
Nascido em Ales, na ilha da Sardenha, em 1891, numa família pobre e numerosa, Antonio Gramsci foi vítima, antes dos 2 anos, de uma doença que o deixou corcunda e prejudicou seu crescimento. Na idade adulta, não media mais do que 1,50 metro e sua saúde sempre foi frágil. Aos 21 anos, foi estudar letras em Turim, onde trabalhou como jornalista de publicações de esquerda. Militou em comissões de fábrica e ajudou a fundar o Partido Comunista Italiano em 1921. Conheceu a mulher, Julia Schucht, em Moscou, para onde foi enviado como representante da Internacional Comunista. Em 1926, foi preso pelo regime fascista de Benito Mussolini. Ficou célebre a frase dita pelo juiz que o condenou: “Temos que impedir esse cérebro de funcionar durante 20 anos”. Gramsci cumpriu dez anos, morrendo numa clínica de Roma em 1937. Na prisão, escreveu os textos reunidos em Cadernos do Cárcere e Cartas do Cárcere. A obra de Gramsci inspirou o eurocomunismo a linha democrática seguida pelos partidos comunistas europeus na segunda metade do século 20 e teve grande influência no Brasil nos anos 1970 e 1980.
Co-fundador do Partido Comunista Italiano, Antonio Gramsci foi uma das referências essenciais do pensamento de esquerda no século 20. Embora comprometido com um projeto político que deveria culminar com uma revolução proletária, Gramsci se distinguia de seus pares por desacreditar de uma tomada do poder que não fosse precedida por mudanças de mentalidade. Para ele, os agentes principais dessas mudanças seriam os intelectuais e um dos seus instrumentos mais importantes, a escola.
Alguns conceitos criados ou valorizados por Gramsci hoje são de uso corrente em várias partes do mundo. Um deles é o de cidadania. Foi ele quem trouxe à discussão pedagógica a conquista da cidadania como um objetivo da escola. Ela deveria ser orientada para o que o pensador chamou de elevação cultural das massas, ou seja, livrá-las de uma visão de mundo que, por se assentar em preconceitos e tabus, predispõe à interiorização acrítica da ideologia das classes dominantes.
Ao contrário da maioria dos teóricos que se dedicaram à interpretação e à continuidade do trabalho intelectual do filósofo alemão Karl Marx (1818-1883), que concentraram suas análises nas relações entre política e economia, Gramsci deteve-se particularmente no papel da cultura e dos intelectuais nos processos de transformação histórica. Suas idéias sobre educação surgem desse contexto.
Para entendê-las, é preciso conhecer o conceito de hegemonia, um dos pilares do pensamento gramsciano. Antes, deve-se lembrar que a maior parte da obra de Gramsci foi escrita na prisão e só veio a público depois de sua morte. Para despistar a censura fascista, Gramsci adotou uma linguagem cifrada, que se desenvolve em torno de conceitos originais (como bloco histórico, intelectual orgânico, sociedade civil e a citada hegemonia, para mencionar os mais célebres) ou de expressões novas em lugar de termos tradicionais (como filosofia da práxis para designar o marxismo). Seus escritos têm forma fragmentária, com muitos trechos que apenas indicam reflexões a serem desenvolvidas.
A mente antes do poder
Hegemonia significa, para Gramsci, a relação de domínio de uma classe social sobre o conjunto da sociedade. O domínio se caracteriza por dois elementos: força e consenso. A força é exercida pelas instituições políticas e jurídicas e pelo controle do aparato policial-militar. O consenso diz respeito sobretudo à cultura: trata-se de uma liderança ideológica conquistada entre a maioria da sociedade e formada por um conjunto de valores morais e regras de comportamento. Segundo Gramsci, toda relação de hegemonia é necessariamente uma relação pedagógica, isto é, de aprendizado.
A hegemonia é obtida, segundo Gramsci, por meio de uma luta de direções contrastantes, primeiro no campo da ética, depois no da política. Ou seja, é necessário primeiro conquistar as mentes, depois o poder. Isso nada tem a ver com propaganda ou manipulação ideológica. Para Gramsci, a função do intelectual (e da escola) é mediar uma tomada de consciência (do aluno, por exemplo) que passa pelo autoconhecimento individual e implica reconhecer, nas palavras do pensador, o próprio valor histórico. Não se trata de um doutrinamento abstrato, diz Paolo Nosella, professor de filosofia da educação da Universidade Federal de São Carlos.
Acesso ao código dominante
O terreno da luta de hegemonias é a sociedade civil, que compreende instituições de legitimação do poder do Estado, como a Igreja, a escola, a família, os sindicatos e os meios de comunicação. Ao contrário do pensamento marxista tradicional, que tende a considerar essas instituições como reprodutoras mecânicas da ideologia do Estado, Gramsci via nelas a possibilidade do início das transformações por intermédio do surgimento de uma nova mentalidade ligada às classes dominadas.
Na escola prevista por Gramsci, as classes desfavorecidas poderiam se inteirar dos códigos dominantes, a começar pela alfabetização. A construção de uma visão de mundo que desse acesso à condição de cidadão teria a finalidade inicial de substituir o que Gramsci chama de senso comum conceitos desagregados, vindos de fora e impregnados de equívocos decorrentes da religião e do folclore. Com o termo folclore, o pensador designa tradições que perderam o significado, mas continuam se perpetuando. Para que o aluno adquira criticidade, Gramsci defende para os primeiros anos de escola um currículo que lhe apresente noções instrumentais (ler, escrever, fazer contas, conhecer os conceitos científicos) e seus direitos e deveres de cidadão.
Elogio do ensino desinteressado
Uma parte importante das reflexões de Gramsci sobre educação foi motivada pela reforma empreendida por Giovanni Gentile, ministro da
Educação de Benito Mussolini, que reservava aos alunos das classes altas o ensino tradicional, completo, e aos das classes pobres uma escola voltada principalmente para a formação profissional. Em reação, Gramsci defendeu a manutenção de uma escola única inicial de cultura geral, humanista, formativa. Para ele, a Reforma Gentile visava predestinar o aluno a um determinado ofício, sem dar-lhe acesso ao ensino desinteressado que cria os primeiros elementos de uma intuição do mundo, liberta de toda magia ou bruxaria. Ao contrário dos pedagogos da escola ativa, que defendiam a construção do aprendizado pelos estudantes, Gramsci acreditava que, pelo menos nos primeiros anos de estudo, o professor deveria transmitir conteúdos aos alunos. A escola unitária de Gramsci é a escola do trabalho, mas não no sentido estreito do ensino profissionalizante, com o qual se aprende a operar, diz o pedagogo Paolo Nosella. Em termos metafóricos, não se trata de colocar um torno em sala de aula, mas de ler um livro sobre o significado, a história e as implicações econômicas do torno.
Para pensar
Muitos pensadores clássicos da educação, entre eles Comênio (1592-1670) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), subordinavam o processo pedagógico à natureza. A própria evolução das crianças daria conta de grande parte do aprendizado. Gramsci tinha outra idéia. “A educação é uma luta contra os instintos ligados às funções biológicas elementares, uma luta contra a natureza, para dominá-la e criar o homem “atual” à sua época”, escreveu. Você concorda com ele ou considera equivocada a tese de que a cultura distancia o homem da natureza? Ou será possível conciliar as duas correntes de pensamento?
(Fonte: www.educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/antonio-gramsci – Texto Márcio Ferrari – 01/07/2011)
(Fonte: www.correiodopovo.com.br – ANO 117 – Nº 39 – Cronologia – 8 de novembro)
A tendência democrática de escola não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas em que cada cidadão possa se tornar governante
Todos os homens são intelectuais, mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de intelectuais