Marguerite Yourcenar, uma das maiores escritoras da moderna literatura ocidental.

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Marguerite Yourcenar (Bruxelas, 8 de junho de 1903 – Mount Desert Island, Boston, 17 de dezembro de 1987), uma das maiores escritoras da moderna literatura ocidental, belga de nascimento mas naturalizada americana em 1951.

A época do imperador Adriano (76-138) foi de calma e esplendor para os cidadãos romanos – mais voltados para a consolidação do império, então atingido seu ponto culminante, que para as violentas conquistas do pai adotivo de Adriano, o imperador Trajano.

Já no fim de seu reinado, envelhecido, doente do coração e mal podendo locomover-se, Adriano escreve uma série de notas a seu sucessor, Marco Aurélio, meditando, em estilo elegante e algo distante, sobre sua vida que se apaga, a doença que o consome, seus amigos e inimigos, a política e o poder, a morte, a guerra, o amor e a beleza – um quadro fragmentado mas extremamente belo e envolvente, e que poderia muito bem ser o de suas memórias.

Em “Memórias de Adriano”, de fato são, só que imagináveis, montadas e escritas por Marguerite. Foi com essa obra que Marguerite, autora de pouco mais de vinte livros – ensaios críticos, romances, uma autobiografia familiar, traduções, poesia e teatro -, se revelou ao mundo como uma escritora admirável, reputação definitivamente consolidada com outro romance, “L”Ouvre au Noir”, de 1968, também escrito na forma de “romance histórico”.

É um gênero que Marguerite pratica com talento e erudição invulgares, e que seguramente a ajudou a conquistar, em março de 1980, à fechadíssima Academia Francesa. Mulher de hábitos frugais e contemplativos – cozinha seu próprio pão, cuida da horta e do jardim de sua casa numa ilha da costa americana, Mount Desert, perto de Boston -, ela recebeu a notícia quase com olímpica indiferença a bordo de um barco durante um passeio pelo Caribe. Pois Marguerite Yourcenar, sócia de mais de cinquenta grupos ecológicos e naturistas ao redor do mundo, é uma mulher tão pouco comum como sua obra.

SUTIL E POÉTICA – Apaixonada pela figura do imperador Adriano, Marguerite começou a conceber o livro mais de meio século atrás, entre os 20 e os 25 anos de idade. Incapaz àquela altura de encontrar um enfoque correto, destruiu parte dos manuscritos e a eles só voltou definitivamente em 1948. De suas notas a respeito da elaboração do livro constam frases ilustrativas de suas angústias em meio ao processo criativo.

Antes, um homem de ação, um guerreiro. Agora na hora da morte, um sereno e refinado filósofo, místico e fantasioso, preocupado em passar ao jovem sucessor um punhado de ideias e reflexões sobre a passagem do tempo e a condição humana, suas misérias e glórias – incluindo, em seu caso, o desesperado amor pelo belo e enigmático Antínoo. Quando este se suicida, num acesso de melancolia, o imperador quase enlouquece. Em memória de Antínoo manda cunhar moedas com sua efígie, erige monumentos, mas não consegue vencer a dor da perda.

No final de sua vida, Adriano consegue localizar dentro de si uma ponta de serenidade e consolação. Poetisa e filósofa da história, Marguerite Yourcenar nos leva à antiguidade, mas não deixa de fazer uma angustiante reflexão: “O século II interessa-me”, “porque foi, durante muito tempo, o século dos últimos homens livres. Pelo que nos diz respeito, já estamos distantes desse tempo.”

(Fonte: Veja, 3 de dezembro de 1980 – Edição nº 639 – LIVROS/ Por Wladir Dupont – Pág; 111)

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