Nicolas Antoine Taunay (Paris, 10 de fevereiro de 1755 - Paris, 20 de março de 1830), pintor e talentoso desenhista francês que fez parte da Missão Artística Francesa, chegando ao Brasil em 1816. É considerado o mais ousado dos integrantes da missão, que viajou para o Brasil com seus cinco filhos, três dos quais também se tornaram artistas de expressão.
Em 1816, um grupo de franceses aportou no Rio de Janeiro, trazendo grandes contribuições culturais para o país. A invasão cultural francesa, com seu espírito neoclássico e suas técnicas refinadas despejados subitamente num canto distante dos trópicos, foi com a chegada do veleiro Calpe, carregado de pintores, escultores e arquitetos simpatizantes de Napoleão, que haviam caído em desgraça em seu país quando o imperador perdeu o trono e o império.
Embora fugido de Portugal diante do furacão bonapartista, que revolucionou a Europa antes de ser apagado, o príncipe-regente português, Dom João VI, recebeu o grupo de braços abertos. Animado com a perspectiva de transformar a sede da corte em modelo de cidade moderna, ele chegou a criar e financiar um instituto onde os franceses da missão pudessem trabalhar livremente.
Taunay integrou a Missão Artística Francesa, que fundou, no Rio de Janeiro, uma academia de Artes e Ofícios, mais tarde Academia Imperial de Belas Artes, onde lecionou pintura.
O momento mais significativo da passagem desse artista pelo Brasil foi reunido na exposição A Missão Artística Francesa e os Pintores Viajantes, que foi em cartas em 16 de dezembro de 1990 na Casa França-Brasil, no Rio de Janeiro.
Taunay foi representado com sete de suas pinturas a óleo, entre elas Morro de Santo Antonio, de 1816. Como em toda a exposição, ao valor artístico de suas obras se somam a importância sociológica e até as curiosidades, como a Igreja da Glória toda pintada de branco, sem frisos escuros, uma aparência que durou pouco.
A Casa França-Brasil preparou e organizou grande parte do arquivo da exposição, lembrou que os artistas da missão vieram para o Brasil impregnados de uma visão de paraíso. Eles esperavam encontrar aqui os bons selvagens com que sonhavam os filósofos do Iluminismo.
Outro dos trabalhos incluídos na mostra foi a gravura de Auguste Taunay, feita em 1922, representando o imperador Pedro I vestido como guerreiro romano com escudo, capacete, saiote e espada, com a inscrição: “Ao gênio do Brasil, que firme, resoluto, aguerrido, a discórdia suplantou na Bahia”, referindo-se à rebelião contrária à independência ocorrida e sufocada naquele ano.
Essas imagens, com evocação à Grécia e à Roma antigas, faziam parte dos cacoetes típicos do estilo neoclássico que os franceses da missão trouxeram para o Brasil. Proclamada a independência, eles foram convocados para dar um inequívoco toque francês a toda a simbologia do novo país, desenhando assim a bandeira imperial, as moedas nacionais e as comendas mais importantes, como a Ordem do Cruzeiro do Sul.
Para aqueles fugitivos da França da restauração da monarquia, o Brasil foi um exílio dourado, no qual puderam exercitar o ideal de liberdade artística e política que estava sufocado em seu país.
Mas, apesar doa poio oficial, os franceses da missão não tardaram a enfrentar a oposição e a hostilidade dos portugueses da corte, que acusavam seus rivais estrangeiros de terem reduzido a um plano insignificante a até então prestigiada arte barroca, com ênfase nos aspectos sacros, que se praticava no país.
A primeira oportunidade para a revanche surgiu em 1819, quando o chefe da missão, Joaquim Lebreton, morreu sem conseguir ver construído seu maior projeto – a sede da Academia Imperial de Belas Artes, que só ficaria pronta em 1826. Esperava-se que Nicolas Antoine Taunay substituísse Lebreton na chefia do grupo, mas depois de dezesseis meses de espera foi escolhido o desenhista português Henrique José da Silva, que passou a tratar o grupo com o mais puro espírito revanchista e privilegiou o desenho em detrimento das demais técnicas artísticas. Com esse abalo, a equipe francesa começou a desmoronar, embora o grupo só deixasse de existir de fato depois da partida de dom Pedro I para Portugal, em 1831.
AR JUVENIL – Antes do declínio, porém, os artistas tiveram tempo para criar obras admiráveis. A variada produção da missão francesa inclui desde pequenas preciosidades, como a escultura equestre de dom Pedro I, de Louis Rochet, uma estátua na Praça Tiradentes, no centro do Rio de Janeiro, até a panorâmica social retratada nas gravuras mostrando cenas de efstas religiosas e da malhação do Judas, feitas pelo filho mais novo de Nicolas Antoine Taunay, Aimé Taunay, que morreu afogado no Rio Guaporé, em Mato Grosso, em 1828, quando acompanhava a expedição do barão prussiano Georg von Langsdoff pelo interior do Brasil.
Outro trabalho que chama a atenção é a tela pintada por Raymond Monvoisin em 1847, mostrando um dom Pedro II vestido com seus trajes reais, e um ar juvenil com o qual o público não está acostumado.
Apesar do esfacelamento gradual da missão e da dispersão dos viajantes depois de 1831, muitos deles fincaram raízes no Brasil. Foi o caso dos irmãos escultores Marc e Zéphyrin Ferrez, cuja contribuição para a mostra são os bustos em bronze de dom Pedro I, de José Bonifácio de Andrada e Silva e medalhas do Senado Fluminense. Ambos ficaram no país até morrer e deixaram descendentes ilustres, como um dos mais importantes fotógrafos do início do século 20, Marc Ferrez, filho de Zéphyrin, que herdou da missão o gosto pelo registro das paisagens e cenas cotidianas da cidade.
(Fonte: Veja, 21 de novembro de 1990 – ANO 23 – N° 46 – Edição 1157 – ARTE – Pág; 110/111/112)