Cientistas degustam o primeiro hambúrguer de laboratório do mundo
O produto foi provado pela primeira vez numa feira científica em Londres
O primeiro hambúrguer feito em laboratório foi apresentado e degustado em 5 de agosto de 2013, numa conferência científica em Londres. Cientistas holandeses utilizaram células retiradas de uma vaca para reconstituir os músculos de carne bovina, que foram combinados a outros ingredientes para fazer o hambúrguer.
Os pesquisadores dizem que a tecnologia poderia ser uma forma sustentável para suprir a crescente demanda por carne. Mas críticos da ideia dizem que comer menos carne seria o jeito mais fácil para compensar a já prevista falta de comida no mundo.
Segurança alimentar
A BBC obteve acesso exclusivo ao laboratório em que o projeto para produzir a carne foi implementado ao custo de cerca de R$ 750 mil. Na Universidade de Maastricht, na Holanda, a pouco mais de 200 km da capital Amsterdã, o cientista à frente do experimento destaca a preocupação ambiental do estudo.
“Vamos apresentar ao mundo o primeiro hambúrguer feito em laboratório a partir de células. Estamos fazendo isso porque a criação animais para abate não é boa para o meio ambiente, não vai suprir a demanda mundial (por comida) e também não é boa para os próprios animais”, ressalta Mark Post, professor da Universidade de Maastricht.
Para Tara Garnett, que é chefe da Food Policy Research Network (um centro de pesquisas da área de alimentos) da Universidade de Oxford, na Inglaterra, os tomadores de decisão precisam olhar além das soluções técnicas na área de segurança alimentar.
“Nós temos uma situação onde 1,4 bilhão de pessoas no mundo ficam obesas da noite para o dia e, ao mesmo tempo, um bilhão de pessoas no mundo todo vão para a cama com fome”, ressalta. “Isso é simplesmente estranho e inaceitável. As soluções não se estabelecem na produção, mas na mudança dos sistemas de suprimento e acesso, com barateamento. E mais e melhores alimentos para pessoas que precisam deles”, critica.
A receita
As células-tronco são as “mestres” do corpo humano, que podem se desenvolver em tecidos em diversas formas, tais como nervos e pele. A maioria dos centros de pesquisa atuando nessa área de estudos tenta reproduzir tecidos humanos que possam ser usados para transplantes, reparando danos em músculos, nervos e cartilagem.
Os cientistas da Holanda querem utilizar técnicas similares para produzir músculo e gordura dos alimentos. O professor Mark Post começou extraindo células do músculo de uma vaca. No laboratório, as células são colocadas numa cultura – solução – com nutrientes para promover o crescimento e multiplicação das células.
Três semanas depois, as mais de um milhão de células-tronco geradas são divididas e colocadas em recipientes menores onde elas se tornam pequenas tiras de músculo de aproximadamente um centímetro de comprimento e apenas alguns milímetros de espessura.
As pequenas tiras são então coletadas e juntadas em pequenos montes, que então são congelados. Quando alcançam uma quantidade suficiente, elas então são descongeladas e compactadas na forma de um hambúrguer antes de serem cozidos.
Tem gosto bom?
Os cientistas tentaram recriar a carne, que inicialmente tinha a cor branca, da maneira mais autêntica possível. A professora Helen Breewood, que atua com Post nos estudos, vem tentando fazer com que o músculo criado em laboratório fique vermelho adicionando um composto existente na carne de verdade chamado mioglobina.
“Se não se parece com a carne normal, se não tem gosto de uma carne normal, não se tornará viável”, afirma Breewood.
No momento, porém, este é um trabalho em progresso. O hambúrguer apresentado hoje foi colorido com suco de beterraba. Os pesquisadores também adicionaram farinha de pão (ou farinha de rosca), caramelo e açafrão, que ajudam no sabor.
” Até o momento, os cientistas podem apenas produzir pequenos pedaços de carne por vez. Quantidades maiores iriam requerer um sistema circulatório para distribuir nutrientes e oxigênio.
Os primeiros resultados sugerem que o hambúrguer não terá gosto tão bom, mas Breewood espera que ele tenha um sabor “bom o bastante”.
Sofrimento animal
A pesquisadora Helen Breewood, apesar de atuar no projeto para produzir carne em laboratório, é vegetariana e acredita que a produção de carne gasta muitas fontes de energia. Ela afirma que se comesse carne, iria preferir a feita em laboratório.
“Muita gente considera carne feita em laboratório repulsiva num primeiro momento. Mas se eles soubessem o que acontece nos abatedouros para a produção de carne normal, também achariam repulsivo”, ressalta.
Numa nota, representantes do grupo Pessoas pela Ética do Tratamento aos Animais (People for the Ethical Treatment of Animals – Peta) ressaltaram os benefícios da carne de laboratório.
“(Carne de laboratório) irá favorecer o fim de caminhões cheios de vacas, frango, abatedouros e fazendas de produção. Irá reduzir a emissão de gases de carbono, economizar água e fazer a rede de suprimento de alimentos mais segura”, destacou a nota do Peta.
Mas a escritora especializada em alimentos Sybil Kappor diz que sentiria dificuldades em comer a carne de laboratório.
“Quanto mais longe você vai do normal, de uma dieta natural, mais corre riscos de saúde e outras questões”, ressalta.
O último levantamento das Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas sobre o futuro da produção de alimentos mostra crescimento da demanda por carne na China e Brasil – e o consumo só não cresce mais porque muitos indianos mantêm a dieta amplamente vegetariana por costume cultural.
Assim, há o risco de que a carne produzida em laboratório seja uma aparente solução, cheia de problemas.
(Fonte: http://noticias.terra.com.br/ciencia/pesquisa- NOTÍCIAS – CIÊNCIA – PESQUISA – 5 de Agosto de 2013)
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