T-Model Ford, era conhecido como um dos últimos verdadeiramente autênticos bluesman do Mississípi.

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T-Model Ford (Forrest, no Mississípi, 1920 – Greenville, Mississippi, 16 de julho de 2013), o “boss do blues”

Era descrito como “um dos últimos verdadeiramente autênticos bluesman do Mississípi”.

Posta em música, a vida de T-Model Ford seria ela mesmo um longuíssimo e tremendo blues, que nem Charley Patton, nem Robert Johnson, nem Muddy Waters poderiam ter imaginado. De idade incerta (não se recordava do ano em que nascera), aprendeu a tocar guitarra quando era quase sexagenário. A quinta mulher, que lhe comprara uma guitarra e um amplificador, abandonou-o e, no mesmo dia em ela saiu de casa, T-Model Ford nasceu como músico.

Ou seja, começou com um coração desiludido, bem de acordo com a mitologia do blues. A carreira aí iniciada levou-o dos pequenos juke joints [bares informais no Sul dos Estados Unidos onde é habitual a música ao vivo]do Mississípi natal até a Nova York e à Europa (tocou no festival Coimbra em Blues em 2005). Em termos discográficos, terá gravado sete álbuns ao longo da vida. O último, Taledragger foi lançado em 2011, já depois de ter sofrido um AVC que lhe deveria ter diminuído a atividade. Não diminui. Sofreu um segundo em 2012, que lhe limitou os movimentos da mão direita. Perseverou e continuou a tocar. Em 16 de julho de 2013 foi por fim vencido. Morreu em Greensville, Mississípi, de falha respiratória. Tinha 89 anos, diz a família. Teria 93, dizia o próprio.

Quando T-Model Ford iniciou a sua carreira, já tinha atrás de si uma vida recheada de blues. Vida difícil. Cresceu com um pai que o agredia diariamente. Ainda criança, trabalhou arando os campos com uma junta de bois. Sabe-se que foi também serralheiro, que trabalhou como madeireiro ou camionista. Algures nesse percurso, muito jovem, foi condenado a dez anos de trabalhos forçados por um assassinato em legítima defesa, durante uma rixa num bar – saiu ao fim de dois anos por bom comportamento, os suficientes para ter carregado nos tornozelos, até ao fim da vida, as marcas das grilhetas que lhe colocaram.

Escreve a Spin em obituário: “Ao longo das suas nove décadas ou próximo disso, foi alvejado, envenenado por uma mulher e viu uma das esposas trocá-lo pelo pai”. Casou sete vezes e terá sido pai 26 vezes. A sua última mulher, Estella Ford, estava a seu lado, juntamente com a família, no momento da morte. A quinta, como dissemos, deu-lhe uma carreira quando o abandonou. Segundo contou à Associated Press (AP) Roger Stoller, especialista em blues e amigo pessoal de Ford, “passou toda a noite [em que se separou da quinta mulher]acordado a beber whiskey e a tocar a guitarra”. A vida já a tinha. O blues estava a chegar.

Analfabeto e musicalmente autodidata, T-Model Ford desenvolveu um estilo cru onde, pela tentativa de reproduzir o som dos seus heróis Howling Wolf (1910-1976) e Muddy Waters (1913-1983), se conjugava a voz profunda dos primeiros bluesmen rurais e o ataque elétrico dos de Chicago. “Era conhecido como um dos últimos verdadeiramente autênticos bluesman do Mississípi”, referiu Roger Stoller à AP.

Depois de vários anos a tocar em festas privadas e em juke joints editou em 1997, pela Fat Possum, a editora responsável pela recuperação de bluesman como R.L. Burnside ou Junior Kimbrough, aquele que terá sido o seu primeiro álbum, Pee-Wee Get My Gun.

Era célebre pelas endiabradas atuações ao vivo, em que era acompanhado, desde 2008, pela banda de Seatlle Gravel Road, e que incluíam o desfilar de histórias diversas e o obrigatório flirt com o público feminino. Em 2005, quando da presença no Coimbra em Blues, foi entrevistado para o programa Crossroads da Rádio Universidade de Coimbra. “Quem é então T-Model Ford?”, perguntaram-lhe. “Sou o maior bluesman. O boss do blues. Muita gente não sabe, mas o meu nome real é James Lewis Carter. T-Model Ford foi o nome que um branco me deu há uns anos e é assim que todos me conhecem. Nasci e fui criado em Forrest, no Mississípi. Nunca fui à escola um único dia da minha vida. Não sei ler, nem escrever, mas sei assinar quando chegam os cheques. Dizem que tenho 84 anos, mas nem sei bem. Ainda não desisti, ainda estou forte”.

(Fonte: http://www.publico.pt/cultura/noticia – CULTURA/ Por Mário Lopes – 17/07/2013)

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