Aliomar Baleeiro, ex-deputado e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).

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Baleeiro: constituinte em 1945 e presidente do STF em 1975

Aliomar Baleeiro (Salvador, 5 de maio de 1905 – Rio de Janeiro, 3 de março de 1978), ex-deputado e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Baleeiro foi um democrata e udenista convicto, como parlamentar, exercitou com especial talento as artes da ironia e do destemor. Quando magistrado, cuidou da Justiça com serenidade e tolerância.

Nascido na Bahia a 5 de maio de 1905, Aliomar de Andrade Baleeiro aprendeu muito cedo a disparar as flechas que fariam dele, depois, um opositor frequentemente mortal. Pouco antes de 1930, formado em Direito e advogado estreante, ouviu de um juiz uma pergunta imprudente: “Meu filho, este arrazoado está muito bom – quem o preparou para você?” O jovem devolveu de imediato e com veneno: “Meritíssimo, eu nunca perguntei quem prepara suas sentenças.” É verdade que àquela época Baleeiro já tinha uma razoável experiência em guerrilhas verbais graças a uma intensa atividade jornalística, iniciada em 1921 na redação do jornal A Imprensa, de Salvador. O jornalismo também lhe deu certa notoriedade – suficiente para que aceitasse, com sucesso, o convite de Juracy Magalhães (1905-2001) para candidatar-se a deputado à Assembleia Constituinte baiana, em 1934, seu primeiro mandato político.

A meio dólar – O golpe de novembro de 1937 custaria a Baleeiro 24 horas de prisão e a interrupção de suas atividades parlamentares. Voltou ao direito, advogando e lecionando até 1945, quando elegeu-se deputado à Assembleia Nacional Constituinte. Um ano depois, fundou a UDN baiana em seu escritório, que tinha como associado o senador Luís Viana Filho (1908-1990). Na Câmara, seu alvo específico era, naturalmente, Vargas, a quem chamava de “gordinho inexpressivo, déspota medíocre.” Foram momentos de glória da “Banda de Música”, da qual Baleeiro se dizia “o bumbo”.

De fato, não era ele um homem de maneiras patrícias como seu companheiro de bancada e futuro colega no STF, Adaucto Lúcio Cardoso. Muitos o chamavam de “grosso” – quase sempre os que foram brindados com frases destemperadas ao longo de seus vinte anos de presença na Câmara Federal, interrompidos apenas entre 1960 e 1962, quando elegeu-se deputado à Assembleia Constituinte da Guanabara. Nem mesmo a adesão e a participação na Revolução de março de 1964 impediram que seu espírito crítico logo começasse a despejar ácido sobre os novos poderosos. “Isso me cheira a Estado Novo”, resumiu ele ao tomar conhecimento do AI-1.

Estocada mais violenta, porém, sofreu pela mesma época o velho desafeto José Maria Alkmin, ao ser indicado como vice-presidente de Castello Branco. No Congresso, o secretário chamava um a um todos os parlamentares para que anunciassem, em voto aberto, o nome de seu candidato à vice-presidência. Quando chegou sua vez, Baleeiro, em lugar de dizer o nome de Alkmin, gritou: “Voto em Antonio Sánchez Galdeano – aquele do uísque a meio dólar”. Ele se referia ao homem que acusara de ser cúmplice de Alkmin em negócios desonestos. Seu voto não valeu, mas Baleeiro, em estado puro, era isso: ataque e panache.

“Papelório” – Mesmo assim, a amizade com Castello Branco prevaleceu e, em novembro de 1965. Baleeiro foi nomeado ministro do STF – um tribunal onde instrumentistas da UDN, como Adaucto Cardoso e Bilac Pinto, seriam obrigados a trocar a estridência das bandas marciais pela serenidade da música de câmara. Lá, o irrequieto baiano dedicou-se à serenidade mas não sossegou, fustigando sempre que possível as manifestações do arbítrio. “O AI-5 é uma espada de Dâmocles sobre a Justiça brasileira”, disse ele em dezembro de 1972, já como presidente do STF, ao denunciar publicamente as restrições ao funcionamento do Judiciário, impostas pela legislação excepcional.

Baleeiro cultivou, igualmente, o folclore de sua distração. Uma vez, em plena sessão, deu a palavra ao ministro “Amaral Netto”, referindo-se a Amaral Santos. Outra, numa homenagem ao falecido ministro Barros Barreto, referiu-se ao “saudoso Barros Monteiro”, que participava da sessão à sua frente. A aposentadoria, precipitada três dias antes de completar 70 anos, em consequência de problemas cardíacos, também foi saudada com humor. “Quero andar pela praia e ver umbigo de menina”, disse ele. “Gosto muito de ver umbigo de menina.” Nos últimos tempos, Baleeiro escrevia artigos para jornais, proferia conferências em universidades e pareceres em processos, para a Editora Forense – empresa que presidia desde 1974, a pedido de seu amigo Olavo Bilac Pinto.

Mas, apesar de retirado da vida pública, mantinha o espírito crítico. Em sua última entrevista, concedida ao Jornal do Brasil em 26 de janeiro de 1978, falou do direito brasileiro. “Um direito de papel”, afirmou. “A Constituição está escorada por uma porção de andaimes, atos institucionais, leis complementares, um imenso papelório.”

E nos últimos anos, enfim afastado da vida pública, tornou-se um ponto de referência para os homens de bem. Estas foram as qualidades mais abundantemente citadas quando se soube, em 3 de março de 1978, que Baleeiro, morrera, de enfarte do miocárdio, no Rio de Janeiro, aos 72 anos.

Com ele, foi-se um dos últimos remanescentes da temida “Banda de Música” da extinta União Democrática Nacional (UDN), supremo incômodo de vários governantes, especialmente Getúlio Vargas e Juscelino Kubitscheck. Restam, agora, apenas Afonso Arinos, dedicado às letras e cultura, e Olavo Bilac Pinto, aposentado do mesmo STF presidido até 1977 por Baleeiro.

(Fonte: Veja, 8 de março de 1978 – Edição 496 – MEMÓRIA – Pág: 27)

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