Salam: um grande avanço teórico, graças a Alá
Abdus Salam (Santokdas, 29 de janeiro de 1926 – Oxford, 21 de novembro de 1996), físico paquistanês laureado com o Prêmio Nobel de Física de 1979.
Ele recebeu em vida mais de uma dezena de prêmios e honras internacionais. Em 1979, ele dividiu o Nobel com Steven Weinberg, por seu trabalho que considerava como forças fundamentais governam as dinâmicas gerais do universo.
Nas décadas de 1960 e 1970, o físico foi o conselheiro científico do governo paquistanês, ajudando a organizar sua agência espacial e seu programa nuclear. Mas em 1974, com a emenda constitucional que declarou que os Ahmadis não eram considerados muçulmanos pela lei paquistanesa e sim hereges, sua vida mudou drasticamente. Salam renunciou ao seu cargo e se mudou para a Europa, onde continuou a trabalhar.
COLEÇÃO DE PRÊMIOS – O paquistanês Abdus Salam, ao receber a notícia em Londres, atribuiu a Alá o mérito de ter guiado seus pensamentos em direção à descoberta. E, incontinenti, procurou uma mesquita para os agradecimentos. Primeiro cientista de seu país a receber um Nobel, Salam, no entanto, não é propriamente pesquisador paquistanês. Ao menos não foi no Paquistão que ele amadureceu como cientista, nem foi lá que desenvolveu suas pesquisas mais importantes.
Doutorou-se na Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Desde 1967, é catedrático de Física Teórica no Colégio Imperial de Ciências e Tecnologia de Londres, cargo que acumula com o de diretor do Centro Internacional de Física Teórica de Trieste, Itália. Trata-se, além disso, de um veterano abocanhador de pr~emios importantes – o primeiro de sua coleção é o Prêmio Átomos para a Paz, em 1968; o último, a Medalha Real da Royal Society, da Inglaterra. Já era candidato ao Nobel desde antes dessas premiações. Na verdade, seu trabalho sobre a unificação dos campos de força data de 1967.
Poderia parecer que o Nobel chegou com algum atraso para Salam. Não é isso. Com muita frequência, o prêmio só é concedido muitos anos depois de lançada a descoberta – e quando seus resultados já estão devidamente sufragados pelos meios científicos. As pesquisas premiadas em 1979, já eram bastante conhecidas entre os que acompanham de perto a evolução da física no terreno em questão.
Basta dizer que um dos americanos, o dr. Steven Weinberg, também deu publicidade a seu trabalho em 1967. E o terceiro premiado, Sheldon Glashow, antecipou alguns aspectos da teoria já em 1961. Sem contar o fato de que os três já participaram de resultados obtidos antes por outros cientistas.
TEORIA PREMIADA
No século 19, o universo físico era explicado como um campo em que duas grandes forças atuavam em conjunto – a força gravitacional e a eletromagnética. A coesão da matéria, em última instância, se devia a essa equação de dois termos. Com a descoberta da radiatividade e com a evolução da física dos núcleos atômicos, no entanto, o problema se complicou um pouco. Pois dois outros tipos de forças acabaram sendo descobertos pelos pesquisadores. Batizadas respectivamente como interações nucleares fortes e interações nucleares fracas, esses dois novos participantes do jogo físico vieram formar entre os tradicionais.
E, há décadas, uma das maiores ambições dos cientistas é elaborar uma teoria que unifique esses quatro campos, apresentando-os como manifestações diferentes de um mesmo fenômeno básico. Até Albert Einstein se dedicou, em parte, a esse problema. Mas todas as privilegiadas cabeças que tentaram formular uma “teoria do campo unificado” tiveram de reconhecer seu fracasso.
O velho desafio foi parcialmente derrubado pelos três pesquisadores laureados em 15 de outubro de 1979 com o Prêmio Nobel de Física. Trabalhando separadamente, os americanos Sheldon Glashow e Steven Weinberg e o paquistanês Abdus Salam, conseguiram encontrar o que existe de comum entre o eletromagnetismo (responsável pelo funcionamento dos motores elétricos) e a força nuclear fraca (causa das perdas radiativas de certos núcleos atômicos).
Tida por muitos como uma das mais importantes questões científicas do século 20, a sonhada “teoria do campo unificado” ainda continua no território das possibilidades teóricas. Os três físicos premiados, no entanto, ajudaram a ciência a chegar um pouco mais perto dela. E, conforme reconheceu a Academia de Ciências da Suécia, “deram um importante passo para o entendimento da composição e origem do universo”.
Único paquistanês a ganhar o Nobel em 1979, por sua contribuição ao chamado Modelo Padrão, o cientista ignorado em seu país e se trabalho não consta nem dos livros escolares nacionais.
Salam pertencia à minoria religiosa dos Ahmadis, que foram perseguidos pelo governo e por militantes do Taleban, que os consideram hereges islâmicos.
Mesmo após o Nobel, a frieza continuou. Seu trabalho atualmente é muito mais celebrado fora do Paquistão, inclusive pelos rivais indianos, do que dentro do país. “O modo como ele foi tratado é uma tragédia,” disse Pervez Hoodbhoy, físico paquistanês que trabalhou com Salam. “Ele passou de uma celebridade nacional para alguém que não podia pisar em sua terra natal. Se ele tivesse voltado, poderia ser insultado, machucado ou até morto”.
Nem após sua morte a perseguição parou. Salam faleceu em 1996, e seu corpo foi trazido de Oxford, Inglaterra, onde morava, para ser enterrado no Paquistão. Em sua lápide, lia-se “Primeiro ganhador muçulmano do Nobel”. Um magistrado local ordenou que a palavra muçulmano fosse apagada da pedra.
(Fonte: Veja, 24 de outubro de 1979 – Edição 581 – CIÊNCIA – Pág: 68/69)
(Fonte: http://ultimosegundo.ig.com.br/ciencia/2012-07-10 – CIÊNCIA / por AFP – 10/07/2012)
(Com informações da AP)