Pelé
O mais fenomenal jogador de todos os tempos exibe uma biografia esportiva que dificilmente um dia será igualada no competitivo mundo do futebol
Com as vaias ainda reverberando na cabeça, o menino de 15 anos arruma os pertences na mala puída e abandona os alojamentos da Vila Belmiro, decidido a deixar o futebol e voltar para junto da família. Na véspera, atuando pelos juvenis do Santos, errara um pênalti nos minutos finais da decisão, entregando ao Jabaquara o título de campeão da cidade.
Treze anos depois, em 19 de novembro de 1969, o menino vê-se novamente diante da marca do pênalti. O Estádio Maracanã lotado silencia. O único som audível é a respiração tensa do jogador. Ele recorda então a penalidade máxima desperdiçada e a tentativa frustrada de fuga empreendida anos antes, que quase lhe custara a carreira, e sente-se mais tranqüilo. Toma coragem, corre e desfere um chute potente. O goleiro do Vasco salta certo, mas não alcança a bola. A massa de repórteres e torcedores invade o campo e carrega o herói sobre os ombros. Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, acaba de marcar seu milésimo gol.
Entre um pênalti e outro, o garoto de Três Corações (MG) tornara-se o maior fenômeno da história do esporte. Antes dos 16 anos, já era titular do Santos. Aos 17, vencia a primeira Copa do Mundo atuando pela Seleção Brasileira. Aos 22, alcançava a marca de 500 gols (a que Romário, por exemplo, só chegou aos 31). Até abandonar os gramados, em 1977, atuando pelo Cosmos de Nova York, Pelé foi o protagonista de uma trajetória superlativa: contabilizou 1.284 gols oficiais (quase um por jogo), 59 títulos e três campeonatos mundiais pela Seleção. Mais que um jogador de futebol, Pelé foi um mito. A imagem do camisa 10 dando um soco no ar é uma das marcas registradas do século 20.
Nunca houve um brasileiro de tamanha projeção. Para que o Santos pudesse jogar na Nigéria, em 1969, uma trégua foi acertada na guerra civil em Biafra. Noutra ocasião, em Nova York, a multidão cercou o jogador para pedir autógrafos. Ao seu lado, o ator Robert Redford, ignorado pelo público, espantou-se:
Puxa, homem, como você é popular!
Pelé tornou-se uma celebridade recebida por presidentes, papas e reis porque driblava curto e em velocidade, tinha visão periférica, passe preciso, equilíbrio perfeito, chutava forte, saltava alto e cabeceava com os olhos abertos. Na final da Copa de 1970, vencida pelo Brasil, o jogador Tarcisio Burgnich recebeu a incumbência de marcar esse fenômeno. Tentou convencer-se de que a missão era possível:
Pensei: ele é de carne e osso como eu. Eu estava enganado.
(Fonte: 500 ANOS/50 PERSONAGENS)