O fotógrafo que captou a arquitetura modernista
Ezra Stoller (Chicago, Illinois, 16 de maio de 1915 – Williamstown, Massachusetts, 19 de outubro 2004), fotógrafo americano de arquitetura
Ezra Stoller, deixou para trás um tesouro de clássicos modernistas: o Terminal TWA, projetado por Eero Saarinen no Aeroporto JFK, em Nova York, a Casa de Vidro de Philip Johnson, o edifício da Manufacturers Trust, desenhado por Gordon Bunshaft. Imaculadas, simples e com uma mistura de luz e sombra revelando cada ângulo e cada superfície, suas fotografias ressaltaram geometria, transparência, eternidade — como os edifícios.
Quase tanto como essas construções, as imagens de Stoller ajudaram a consolidar o design moderno na consciência da América. De fato, antes da internet e das viagens de avião baratas, foi por meio de Stoller e de um punhado de fotógrafos comerciais como Julius Shulman, Balthazar Korab e a empresa de Hedrich Blessing que um amplo leque de pessoas conheceram a nova arquitetura.
Música era uma analogia justa. Ela implicava harmonia e deferência. Stoller era mestre em harmonizar a mistura de concreto, vidro e aço de um arquiteto. Publicidade também seria uma palavra adequada. Folhear um livro de fotografias suas hoje (um foi recentemente publicado pela Yale University Press) é ver a sofisticação que ele levou para estacionamentos de escritórios, terminais de aeroportos, lugares industriais de meados do século XX. Fotógrafos como William Klein e Robert Frank, Lee Friedlander e Garry Winogrand exploraram o desregramento da câmera e da vida americana nas ruas das cidades. Stoller, implacável, vendia uma aura de inevitabilidade.
Ele também criou composições perfeitas de edifícios como o John Hancock Center em Chicago, criado por Skidmore, Owings & Merrill, com suas vigas entrelaçadas. Fotografou o deque esparramado do Salk Institute de Louis Kahn se expandindo em direção ao infinito; as curvas protuberantes do Marin County Civic Center, de Frank Lloyd Wright, musculares e elásticas; as varandas serpenteadas dentro do edifício das Nações Unidas, com uma estátua de um homem nu na ponta dos pés em primeiro plano, como se estendesse o braço para acariciá-los.
Na galeria, imagens pouco familiares foram pinçadas dos arquivos. Sabe-se que Stoller documentou de vários ângulos o edifício Seagram, de Mies van der Rohe, mas a mostra tem uma imagem que eu nunca vira, do prédio atrás de um canteiro de obras coberto por um cartaz do parque de diversões Palisades em New Jersey (“Venha!”). Em Miami, Stoller acentuou as cores e curvas dos automóveis estacionados nos andares abertos de uma garagem caiada e vermelha, de Robert Law Weed & Associates.
Eu fui tomado por uma fotografia da Casa Catalano, projetada por Eduardo Catalano, em Raleigh, na Carolina do Norte: árvores densas ocupam quase toda a foto, que é focada numa criança no topo de um muro, obscurecendo o telhado inclinado que se imaginaria ser o foco de Stoller.
Ele nunca era ingênuo. Mas a mostra também revela fotografias de trabalhadores de fábrica. Uma mulher magra, vista através de um tecido de seda transparente, comanda uma máquina de tecelagem; mais três mulheres, diante de pilhas de vinis, deslizam os discos em capas de papelão; outra mulher de casaco de laboratório prepara processadores numa fábrica da IBM em Tóquio.
Hoje em dia Stoller poderia ser contratado para fazer propaganda dos escritórios da Google e da Apple. Em seu tempo, o mundo corporativo girava em torno de IBM e empresas como a Heinz, de ketchup, cuja fábrica asséptica em Pittsburgh ele fotografou em cores, ressaltadas pelas cestas de tomates. A cor tinha seus usos; na fábrica Life Savers em Port Chester, Nova York, ele retrata do alto um emaranhado de esteiras rolantes distribuindo montes de balas amarelas, laranjas e verde fluorescente.
Fotógrafos de arte como Andreas Gursky hoje preenchem os museus com panoramas digitalmente alterados de paisagens pós-industriais, enquanto fotógrafos como Andrew Moore e Robert Polidori, como o crítico veterano Andry Grundberg apontou, documentaram em detalhes extravagantes o declínio da arquitetura em cidades como Detroit e partes de Nova Orleans pós-Katrina.
Fotógrafos de arquitetura como Iwan Baan encaram os edifícios como artefatos sociais, mostrando as pessoas sem pose, utilizando-os. Arquitetos difundem vídeos e imagens de computador de seus próprios projetos futuros — publicidade para si próprios —, confundindo a percepção do público do que é real ou não.
Stoller pertence a um outro tempo. Mas, em última instância, todas as fotografias são artificiais, e a passagem dos anos pode transformar o melhor comércio em arte.
O fato é que as imagens de Stoller preservam uma era e uma estética que ainda falam a nós.
Ezra Stoller morreu em 19 de outubro 2004, em sua casa em Williamstown, Massachusetts. Ele tinha 89 anos. A causa foi complicações de um acidente vascular cerebral recente.
Stoller deixou para trás cerca de 50 mil fotografias. Como jovem editor na revista de design “I.D.”, senti meu coração acelerar ao telefonar para seu estúdio. Ser “stollerizado” se tornou um verbo e uma exigência para designers. “A arte é a arquitetura”, insistia Stoller, comparando o que fazia com a atividade de um músico que “precisa trazer uma partitura à vida e tocar a peça o melhor que puder”.
(Fonte: http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2013/02/16/o-fotografo-que-captou-arquitetura-modernista-486501 – CULTURA – Por Michael Kimmelman, do New York Times – 16/02/2013)