Criou o primeiro teste caseiro de gravidez
Como uma publicitária criou o 1º teste caseiro de gravidez
A publicitária americana Margaret Crane foi contratada para realizar esboços para uma linha de cosméticos em uma companhia farmacêutica, mas uma observação sagaz a fez criar um teste chave na história da liberdade das mulheres.
Durante uma visita aos laboratórios da empresa Organon Pharmaceuticals, em West Orange, no Estado americano de Nova Jérsei, algo chamou a atenção da designer gráfica: uma enorme fila de provetas apoiadas sobre uma superfície com um espelho.
Quando descobriu que eram testes de gravidez, pensou: “por que não fazer isso em casa?”. “Olhando para eles, pensei imediatamente que seria muito fácil que as mulheres o fizessem em casa e tentei fazer o possível para que isso acontecesse”, disse Crane à BBC Mundo, o serviço da BBC em espanhol.
Aos 26 anos, ela não tinha formação científica, mas um dos químicos a explicou como o processo funcionava.
Cada tubo continha reagentes químicos que, ao detectarem o hormônio gonadotrofina coriônica humana (hCG) – produzido pelo corpo durante a gestação –, formavam um círculo roxo na base da proveta, que se refletia no espelho e fornecia o resultado positivo.
Assim que chegou em sua casa em Nova York, ela diz que “começou a pensar em algo que juntasse um tubo e um espelho. Não foi fácil, mas, após muitas tentativas, um objeto sobre sua mesa lhe deu a solução. “Eu tinha uma pequena caixa de plástico onde guardava clipes e me deu conta de que era a forma perfeita. Você podia ver através dela, colocar um espelho e incluir um conta-gotas”, relembra. Estes eram todos os elementos necessários para realizar o teste em casa.
O protótipo criado por Margaret no final dos anos 1960 foi leiloado no mês de junho passado por quase US$ 12 mil (R$ 46 mil, em valores atuais) e comprado pelo museu de História da América em Washington, que acaba de recebê-lo.
A casa de leilões Bonhams se referiu ao teste doméstico como “um dos produtos mais revolucionários, que mudaram a vida no século 20” e disse que “sua invenção foi um momento chave na história da liberação da mulher”.
Crane colocou nas mãos das próprias mulheres o conhecimento de algo tão íntimo quanto a gravidez. Já não era necessário recorrer a um médico e esperar semanas pelo resultado, podiam sabê-lo com discrição em sua própria casa.
No entanto, uma vez materializado, anos mais tarde, o projeto enfrentou críticas dos que se opuseram a ele por motivos morais e consideravam que as mulhere não tinham direito a fazer seus próprios testes. Na época, o exame caseiro foi vinculado até mesmo ao aborto, que ainda era proibido nos Estados Unidos.
Sem entusiasmo
Crane não contou sua ideia a nenhuma das pessoas mais próximas dela, porque queria falar primeiro com os representantes da Organon. Mas apesar de seu entusiasmo, não teve a recepção que esperava. “Contei a meus chefes, mas eles não acharam uma boa ideia, quase começaram a rir”, conta.
“Eles tinham receio de que colocar um produto assim diretamente nas mãos das usuárias acabasse com o negócio do laboratório e pensavam que os médicos não gostariam da ideia. Não pensaram que poderia ser um produto útil para as mulheres, simplesmente, não enxergaram assim”, acrescentou.
No entanto, a designer não se deu por vencida. Seu momento chegou quando, em uma reunião na sede da empresa farmacêutica na Holanda, um dos executivos americanos mencionou sua ideia. “Os dirigentes holandeses acharam a ideia maravilhosa, porque a Europa já tinha produtos de venda direta ao consumidor que funcionavam.”
Um dólar
Quando eles designaram um orçamento para realizar um estudo de mercado, a ideia foi tomando corpo. Mesmo assim, Crane não recebeu nem 1 dólar. Quer dizer, na verdade, recebeu um.
A empresa registrou em 1969 duas patentes no nome de Margaret Crane, que reconhece que não poderia fazê-lo ela mesma, porque o procedimento custava milhares de dólares. Em troca, a jovem renunciou a seus direitos sobre a ideia por um dólar.
Ela confessa que pensou que não voltaria a entrar naquela sala de reuniões sozinha, sem um advogado ou representante, mas diz não se arrepender. “Estou contente de ter feito isso porque eu realmente queria que esse produto fosse adiante. Faria outra vez porque esse foi o jeito de fazer com que ele acontecesse. Aquele foi o começo da minha vida em muitos sentidos”, diz.
A empresa contratou uma equipe de designers de produto e publicitários para lançá-lo no mercado. “Quando descobri que eles viriam, pedi por favor que me deixassem ir à reunião e mostrar meu protótipo”, conta Crane.
No final da apresentação, um deles se aproximou da pequena caixa – que alguns haviam comparado a um jogo infantil de química – e disse à designer: “Então é isso o que estamos fazendo.”
À noite, quando voltou para casa, Crane disse a sua colega de apartamento que havia conhecido o homem com quem passaria o resto de sua vida. “E foi verdade!”, relembra.
Era o publicitário Ira Sturtevant, com quem ela fundou sua agência de publicidade, Ponzi & Weill. A agência acabou sendo a responsável, mais tarde, pela comercialização do produto. Eles foram casados por 41 anos até a morte de Sturtevant em 2008, aos 84 anos.
Peça de museu
Enquanto o uso do Predictor, o nome que recebeu o produto, se espalhou e tornou-se tão comum que as atuais usuárias em todo o mundo sequer conhecem sua origem, a história de Crane não foi além de seu círculo de amigos e de clientes.
Em 2012, por ocasião do aniversário de 35 anos do teste, a revista americana publicou uma reportagem chamada , afirmando que O Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, o Instituto Smithsonian – que administra mais de uma dezena de museus públicos em Washington – e a Food and Drug Administration (FDA), órgão que regulamenta a produção e a comercialização de remédios e alimentos no país, procuravam um dos primeiros testes para seus arquivos.
Foi assim que sua família a estimulou a contar sua história. Ela ainda guardava o protótipo e um dos primeiros testes comercializados no Canadá. A embalagem, com as instruções em francês e em inglês, está intacta.
Segundo Alexandra Lord, diretora e curadora da divisão de Ciência e Medicina do Museu Nacional de História Americana, afirmou que “o Predictor foi um grande avanço na maneira de entender e de enxergar a gravidez”.
A instituição também destaca a façanha de Crane, que, mesmo não sendo cientista, “viu e entendeu como um processo científico pode ser levado ao público em geral”.
(Fonte: http://noticias.terra.com.br/ciencia – 2a3b1add853bd944dfe9025c2231fcf2hpweribc – NOTÍCIAS – CIÊNCIA – 17 OUT 2015)
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