Pesquisador destacou-se no estabelecimento da primeira reserva biológica do país e na proteção do mico-leão-dourado
O pai da primatologia brasileira
Pesquisador foi pioneiro da primatologia no Brasil e teve papel vital na recuperação do mico-leão-dourado
Coimbra deixou mais de 200 trabalhos científicos e emprestando seu nome a espécies de macaco (Callicebus coimbrai), de percevejo(Taedia coimbrai), de uma bromélia (Neoregelia coimbraii) e, a última homenagem, de um fóssil de macaco (Cartelles coimbrafilhoi). O fóssil foi encontrado na caverna Toca da Boa Vista, em Minas Gerais, por dois cientistas americanos, em 2014.
Adelmar Coimbra-Filho, cearense radicado no Rio de Janeiro, ele participou de sociedades ligadas a áreas como botânica e zoologia. Publicou cerca de 200 trabalhos científicos sobre diversos assuntos ligados à conservação da biodiversidade brasileira, como biologia dos vertebrados, restauração de ecossistemas naturais, botânica florestal e conservação da natureza. Devido à importância de seu trabalho, o cientista deu nome a espécies de cacto, percevejo, bromélia e a um sagui.
Entre as diversas espécies que estudou, uma mereceu atenção especial, em uma luta que repercutiu no mundo inteiro: Coimbra tornou-se o principal porta-voz na luta contra a extinção do mico-leão-dourado, que conheceu por acaso na Zona Oeste do Rio de Janeiro, em 1940. A expansão da cidade e a ação dos caçadores devastaram a Mata Atlântica na região, levando o símio à ameaça de extinção. Vinte anos depois, havia menos de 200 na natureza. A partir de mapeamento realizado pelo próprio cientista, o governo federal criou uma área especial, a primeira reserva biológica do país, Poço das Antas, em 1974, no município fluminense de Silva Jardim.
Embora tenha seu nome ligado ao mico-leão-dourado, o primatologista nunca concordou com o nome pelo qual o primata foi batizado. Em vez do adjetivo “dourado”, ele preferia se referir ao animal usando a linguagem tupi-guarani, como sauí (primata) piranga (vermelho) porque, conta, a espécie só assume a coloração dourada quando em cativeiro: “Na natureza, ele é vermelho-alaranjado brilhante.”
Também rejeitava quando era chamado de “doutor”. No cartão de visitas, além da foto de um mico-leão-dourado, apresentava apenas o título “biólogo/primatólogo”.
No ano seguinte, o conservacionista desenvolveu outro projeto — entre Guapimirim e Cachoeiras de Macacu, no interior do estado, criou o Centro de Primatologia do Rio de Janeiro, que também abriga outros animais igualmente ameaçados, como macacos-aranha e muriquis.
Ele foi uma das vozes mais eloquentes contra a extinção do mico-leão-dourado, que preferia chamar de sauí-piranga, porque “na natureza ele não é dourado, é vermelho alaranjado brilhante”, como explicava.
“Salvei as três espécies de mico-leão”, orgulhava-se Coimbra-Filho, referindo-se ao mico-leão-dourado, ao mico-leão-preto e ao mico-leão-da-cara-dourada. A saga contra a extinção da espécie começou fortuitamente nos anos 1940 e se confundiu com a história da primatologia brasileira e o Centro de Primatologia do Rio de Janeiro (CPRJ), que concebeu, fundou e presidiu por duas décadas e meia.
Incrustado na Reserva Ecológica Paraíso, em Guapimirim, a instituição é a primeira do mundo voltada prioritariamente à conservação de primatas. Coimbra esteve à frente do centro de 1979 até 1993. Desde 2009, o CPRJ é administrado pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea). Hoje, ele abriga 230 símios de 25 espécies ameaçadas de extinção, originárias da Mata Atlântica, do Cerrado e da Amazônia brasileira.
— Coimbra foi um grande primatólogo e um entusiasmado pesquisador da Mata Atlântica — destaca Marcia Hirota, diretora da ONG SOS Mata Atlântica. — Deixa um legado enorme para a ciência brasileira.
No bioma, o mais ameaçado do país, Coimbra levou tucanos para o Maciço da Tijuca e plantou árvores emblemáticas. Para muitos ambientalistas, é considerado “o Nobel que o Brasil nunca teve”.
A dedicação de Coimbra-Filho ao estudo dos símios se estendia a sua casa. Seu apartamento na Gávea tem estatuetas do animal e fotos espalhadas pelos cômodos. Entre os pares, era reverenciado como “lenda viva da primatologia”, segundo o australiano Colin Groves, e “líder e visionário”, na avaliação de Russell Mittermeir, presidente mundial da ONG Conservação Internacional. Foi um dos poucos cientistas brasileiros a receber a medalha Augusto Ruschi.
A cruzada de Coimbra-Filho pela preservação do mico-leão-dourado começou nos anos 60. Graças a ele, o animal mudou de status: de “criticamente ameaçado” para “em perigo” e virou símbolo da Mata Atlântica e ícone da preservação da floresta. Hoje, a população gira em torno de 1.600 indivíduos.
Coimbra morreu em 11 de julho de 2016, no Rio de Janeiro, aos 92 anos.
(Fonte: http://projetocolabora.com.br/florestas – FLORESTAS/ Por Liana Melo
(Fonte: http://oglobo.globo.com/sociedade – SOCIEDADE – POR O GLOBO – 28/06/2016)
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