Alan Bates (Allestree, Derbyshire, 17 de fevereiro de 1934 – Londres, 27 de dezembro de 2003), ator inglês que firmou-se primeiro como ator de teatro, em Londres, e, nos anos 60 e 70, estrelou uma série de bons filmes e de sucesso de bilheteria, dos quais talvez o mais conhecido seja Zorba, o Grego, do grego Michael Cacoyanis, e o mais emblemático da época, Esse Mundo é dos Loucos, do francês Philippe De Broca.
Seu primeiro papel importante no cinema foi em 1960, ao lado do já então veterano e consagrado Laurence Olivier, em Vida de Artista (The Entertainer). Em Zorba, o Grego, de 1964, que fez grande sucesso na época e é até hoje campeão de reprises na TV brasileira, fez o papel de Basil, o intelectual inglês contrito, controlado, fechado, que se refugia numa ilha grega, em tudo o oposto de Zorba, o homem arrebatado, passional, que força o estrangeiro a aceitá-lo como empregado.
Em 1966 fez o papel principal em Esse Mundo é dos Loucos, uma comédia inteligente e extremamente sensível, pequena fábula sobre a insanidade humana. A ação se passa durante a Primeira Guerra Mundial, numa pequena cidade da França abandonada pela população diante da chegada iminente dos alemães. Bates é o soldado raso do destacamento do exército escocês Charles Plumpick, que chega para libertar a cidade e a encontra tomada pelos loucos do hospício local que os habitantes ditos sãos deixaram entregues à sua própria sorte.
Ainda na segunda metade anos 60, fez outros três filmes importantes. Esteve ao lado de Julie Christie, ela própria um símbolo da época, em Longe Deste Insensato Mundo, de John Schlesinger, baseado na obra de Thomas Hardy (1967). Interpretou Yakov Bok, o judeu vítima de terríveis torturas na Ucrânia pré-bolchevismo, em O Homem do Prego, de John Frankenheimer (1968), e por esse papel recebeu uma indicação para o Oscar de Melhor Ator. E participou também de Mulheres Apaixonadas, de Ken Russell, baseado na obra de D. H. Lawrence (1969).
Marca da época
Nos anos 70, ele esteve em outro daqueles filmes que se tornam símbolo do momento, das transformações da sociedade naquele período: interpretou o pintor que tem um caso com Jill Clayburgh em Uma Mulher Descasada, de Paul Mazursky (1978). Esteve também em A Rosa, de Mark Rydell(1979), em que Bette Midler interpreta uma cantora em tudo por tudo idêntica ao furacão Janis Joplin, apagado por uma overdose no estertor dos anos 60.
Alan Bates se manteve em atividade incessante ao longo das décadas seguintes, no cinema, no teatro e na TV. Em 2002, foi premiado com o Tony de Melhor Ator o Oscar do teatro americano – pela peça Fortunes Fool, do russo Ivan Turgueniev. Participou de diversas produções para a TV inglesa. E ainda participou de vários filmes de alguma importância, como, por exemplo, Sede de Amar, do russo Andrei Konchalovsky (1986), ao lado de Julie Andrews, e do Hamlet de Franco Zeffirelli (2000), com Mel Gibson, Glenn Close e uma penca de grandes atores ingleses Paul Scofield, Ian Holm, Helena Bonhan Carter.
Mais recentemente, interpretou um mordomo inglês no thriller sarcástico de Robert Altman, Assassinato em Gosford Park, de 2001, e teve uma participação num daqueles filmes que Hollywood faz com todos os ingredientes medidos para ser um arrasa-quarteirões, mas que em geral são de uma total pobreza de idéias, A Soma de Todos os Medos, de Phil Alden Robinson (2002).
Perplexidade
O ator, nascido em Derbyshire, no centro da Inglaterra, estudou na Academia Real de Artes Dramáticas de Londres e estreou no palco em 1955, na beira dos 20 anos. Teve reconhecimento e láureas em vida. Além de indicação para o Oscar e premiação com o Tony, tornou-se Comandante do Império Britânico em 1995 e foi sagrado cavaleiro pela rainha no final do ano passado. Enfrentou, porém, profundas dores. Seu filho, Tristan, morreu em 1990, aos 19 anos, de um ataque de asma, e sua mulher, a atriz Victoria Ford, morreu pouco depois, em 1992.
Em boa parte de seus filmes, mesmo dos primeiros, Alan Bates exibe um olhar, toda uma expressão de aparente autocontrole que ao mesmo tempo trai uma grande dose de perplexidade com o emaranhado da teia de acontecimentos ao seu redor, um assombro diante da própria incapacidade de compreender os desatinos do destino das pessoas, da sociedade. Essa expressão está muito presente em Zorba, o Grego, no qual há um diálogo inesquecível. Enraivecido com uma tragédia acontecida na pequena vila perto de onde vivem, Zorba (Anthony Quinn) vira-se para seu patrão, Basil, o personagem de Bates, e pergunta para que servem todos aqueles livros que ele coleciona, se eles não podem fazer nada para aliviar a dor. E Basil-Alan Bates responde, com aquele tom de perplexidade que o caracterizava: Eles servem para ajudar a compreender como é a angústia dos homens em momentos como este. Zorba põe ponto final ao diálogo: Pois eu cuspo na angústia.
Alan Bates morreu em 27 de dezembro de 2003, em Londres, de câncer. Ele estava com 69 anos.
(Fonte: http://www.estadao.com.br/arquivo/arteelazer/2003/not20031228p75276 – CADERNO 2 – CINEMA – 28 de Dezembro de 2003)