Sobra reflexão e falta transformação nas empresas brasileiras, diz pesquisa
Com exclusividade, Época NEGÓCIOS destaca os principais dados do estudo “Empresas do Futuro”, realizado pelo Grupo Cia de Talentos junto ao GPTW (Great Place to Work)
“AS EMPRESAS SE ENGANAM. DIZEM QUE ESTÃO NO CAMINHO DA INOVAÇÃO, MAS NÃO ESTÃO. ESTAMOS LONGE.”
DANILCA GALDINI, head de insights do Grupo Cia de Talentos
Sobra reflexão, mas falta transformação prática para as empresas no mercado brasileiro. A conclusão vem da pesquisa “Empresas do Futuro“, realizada pelo Grupo Cia. de Talentos junto ao GPTW (Great Place to Work). Época NEGÓCIOS teve acesso exclusivo ao material. O levantamento foi criado com o objetivo de mapear as transformações digitais e organizacionais dentro das empresas que atuam no mercado brasileiro. Esta é a primeira edição e avaliou 246 companhias, dos setores de serviços, indústria, tecnologia, comércio e varejo, financeiro e saúde.
De acordo com o estudo, o futuro do trabalho vem sendo discutido com mais intensidade pelo mundo desde 2013. No Brasil, entretanto, nota-se que nos últimos seis anos poucas mudanças foram implementadas. Segundo a pesquisa, 68% das empresas que participaram ainda contam com estruturas convencionais, departamentos bem definidos e ao menos um nível de gestão.
“Foi frustrante ver o quanto a gente conversa sobre o tema, mas na prática são poucas as ações”, diz Danilca Galdini, corresponsável pela pesquisa e head de insights do Grupo Cia de Talentos. “Tínhamos expectativa de retornos mais positivos.” Para Casimiro Perez, corresponsável pela pesquisa e product owner do GPTW, a sensação é parecida. “É frustrante pensar que as empresas adoram se associar às palavras da moda, como diversidade e inovação, mas nas situações práticas do dia a dia isso não é aplicado”, diz.
O estudo dividiu 246 empresas em dois perfis. No “perfil 1”, aquelas com mais de 50 funcionários e cinco anos de atuação no Brasil. No “perfil 2”, empresas com menos de 50 funcionários e menos de cinco anos de atuação. No primeiro grupo, apenas 3% têm estruturas horizontais, enquanto 82% contam com mais de um nível de gestão. No “perfil 2”, a situação não é muito diferente: apenas 9% são horizontalizadas.
“Independentemente do porte e tempo de atuação da empresa, as estruturas ainda seguem um modelo tradicional, o que está distante das tendências sobre o futuro do trabalho, que apontam para estruturas cada vez mais horizontais ou com estruturas hierárquicas enxutas, que possibilitam que a organização seja ágil”, diz o estudo. “As empresas se enganam. Dizem que estão no caminho, mas não estão. Estamos longe”, diz Danilca.
Os indicadores de sucesso e as estruturas físicas das corporações também reforçam a ideia de que há um longo percurso para o mercado brasileiro. De acordo com a pesquisa, o lucro ainda fala mais alto para as empresas que atuam no país. O foco na faturamento ainda supera outras preocupações, como satisfação dos clientes, contribuição para a sociedade e até satisfação interna da equipe. Para 44% das empresas do “perfil 1” e 37% do “perfil 2”, o indicativo mais forte de um bom ano são os resultados financeiros.
Os dados, porém, podem ajudar na busca por mudanças. “O positivo é ter essa visão real, porque sai da percepção. Com os dados, fica muito mais fácil as empresas aceitarem”, afirma Danilca. O objetivo é realizar a pesquisa anualmente, auxiliando o mercado brasileiro nesse novo momento.
Os símbolos de poder
Outra conclusão do estudo é que os símbolos de poder continuam fortes entre os empresários do país. Varia de acordo com o executivo, mas estes símbolos são detalhes como vaga privativa, sala no último andar, benefícios melhores, uniforme para níveis operacionais e até crachá diferenciado. “O fato é que a alta liderança ainda desfruta de benefícios que os funcionários em geral não têm”, diz a pesquisa.
Quando o assunto é espaço físico, 66% das empresas separam de alguma maneira as equipes operacionais da liderança—73% no “perfil 1” e 48% “no perfil 2”. “Os espaços abertos, conceito difundido nos últimos anos, foi pensado para reduzir barreiras e aumentar a criatividade. Mas o modelo foi tomado por uma insatisfação das pessoas. Independentemente do perfil da empresa, quando a escolha por espaços abertos é feita, deveria ser para todos, incluindo os executivos”, afirma o estudo.
Pessoas
Para 34% das empresas, o tema “Pessoas” é o último a entrar na pauta de uma reunião estratégica, somente após o fechamento das principais decisões ou em casos de demissão e processos trabalhistas. Mesmo assim, 22% das empresas consideram o tema uma prioridade—no “perfil 2”, o número salta para 31%. “Os bens que importarão no futuro são menos propensos a serem físicos”, observa o estudo.
A pesquisa também analisou a forma como empresas lidariam com um caso hipotético de intolerância (contra mulheres, negros, LGBT, etc) por parte de um executivo. As companhias foram questionadas sobre como reagiriam. Para 61% delas, não haveria consequências para um funcionário de alto escalão. “As pessoas esperam que as empresas participem da construção das soluções e ajam com coerência – e blindar a alta liderança não é uma maneira de resolver a questão.” Ao mesmo tempo, 47% dos pesquisados acreditam que um transexual poderia assumir a presidência da companhia sem problema algum – o que foge à realidade brasileira, na qual 90% da população trans brasileira se encontra excluída do mercado de trabalho formal, pontua a pesquisa.
Tecnologia
A pesquisa trouxe conclusões não tão animadoras no campo da adoção de novas tecnologias. Segundo o estudo, em muitos casos os equipamentos das empresas são mais ultrapassados que os notebooks e smartphones dos funcionários da companhia. Quando a questão é sobre utilização de novos softwares, quase metade (43%) afirmam que funcionários podem levar até 15 dias para receber uma resposta do seu setor de tecnologia.
(Fonte: https://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2019/05 – EMPRESA / NOTÍCIA / Frase / POR RENNAN A. JULIO – 15/05/2019)