Bruce Chatwin, escritor e jornalista inglês, ajudou a revitalizar com outros escritores como Jan Morris, Jonathan Raban e Paul Theroux, gênero de escrita de viagens como uma notável arte de reportagem

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“Colina Negra”, do escritor britânico, faz uma crônica da vida rural

Bruce Chatwin deixa aventura e faz elogio da imobilidade

ESCRITOR DE VIAGENS, NOVELISTA

 

Bruce Charles Chatwin (Sheffield, Reino Unido, 13 de maio de 1940 – Nice, na França, 18 de janeiro de 1989), escritor e jornalista inglês que fez uma obra literária alimentada em boa parte por suas viagens como repórter do diário londrino Sunday Times, onde trabalhou por cinco anos.

Um popular e aclamado escritor de viagens e romancista britânico, nasceu filho de um oficial da Marinha Real. Ele estudou arquitetura por um breve período e tentou encontrar trabalho como ator antes de ingressar na lendária empresa de leilões de belas artes da Sotheby’s como porteiro em 1958.

Durante os sete anos seguintes, tornou-se diretor da empresa, chefe do departamento de impressionistas, e foi oferecido uma parceria. Cada vez mais inquieto com o mundo da arte, ele deixou abruptamente a Sotheby’s em 1965 para estudar arqueologia na Universidade de Edimburgo.

Em 1973, juntou-se à equipe da revista Sunday Times de Londres. Foi para essa publicação que ele viajou originalmente para a Patagônia. Ele deixou o jornal enquanto ainda fazia pesquisas na América do Sul. O resto de sua vida foi dedicado a vagar, observar e escrever. Ele finalmente viajou para alguns dos bairros mais remotos da Ásia, África, Austrália e Américas.

Sua vida tornou-se uma espécie de equivalente moderno daquela vivida antigamente por outros escritores e viajantes britânicos notáveis, como Richard Burton e T. E. Lawrence. Ao longo do caminho, o Sr. Chatwin ganhou uma reputação invejável como um excelente contador de histórias e artesão literário.

Com outros escritores como Jan Morris, Jonathan Raban e Paul Theroux, ele ajudou a revitalizar o gênero de escrita de viagens como uma notável arte de reportagem.

Traduzido em quinze idiomas, Chatwin tem dois livros publicados no Brasil – “Na Patagônia” e “O Vice-Rei de Uidá”, que foi adaptado para o cinema pelo diretor alemão Werner Herzog com o título Cobra Verde.

Bruce Chatwin passou a infância na região de fronteira entre a Inglaterra e o País de Gales. Quando em crise, era para lá que rumava, dando as costas para a ambição de nômade. Em uma dessas visitas, conhece dois irmãos de cerca de 60 anos, solteiros e -segundo rumores locais- possivelmente virgens. Para ele, o encontro foi mais do que uma nova amizade. Foi toda uma chance.

Em 1989, quando a morte do britânico Bruce Chatwin foi anunciada -aos 47 anos, em consequência da ação do vírus HIV-, sua imagem de aventureiro, adorador do movimento, se cristalizava na prosa inglesa. Chatwin foi sobretudo um viajante, mas o romance “Colina Negra”, lançado no Brasil, oferece a chance para um pequeno revisionismo. O texto é um longo, barroco e obsessivo elogio da imobilidade das coisas.

O material escolhido por Chatwin para construir sua obra foi o mito em torno de lugares e povos, como “Patagônia” (1977), sobre a região argentina, ou “O Rastro dos Cantos” (1987), experiência existencial sobre os aborígenes da Austrália; uma mitologia que se expande para além de sua produção, chegando até sua biografia, repleta de acontecimentos fantásticos raramente comprovados. Para ele, fato e criação eram gêmeos inseparáveis, e seu divertimento era iludir aqueles que o observavam.

Gêmeos são o tema e estão na gênese de “Colina Negra”. Após a derrota crítica do livro “O Vice-Rei de Uidá” (1980), ele perseguia o reconhecimento do establishment inglês e assim planejou uma história com essa função. Toda a encantadora mistura de verdade e construção que tinha projetado seu nome deveria ser posta de lado. O resultado foi o encontro com o passado, com a literatura pastoral britânica e, claro, com dois irmãos inseparáveis.

“Colina Negra” é a crônica da vida rural e seu combate contra as transformações do século 20, ilustrada na trajetória de gêmeos solitários, nascidos em 1900, que jamais deixaram o território onde viveram. O fato de ouvirem ecos de uma revolução comunista na Europa, de duas guerras mundiais, da corrida espacial ou da chegada das máquinas no campo, pouco importa. A atenção dos dois está voltada para a família, os amores não realizados, os vizinhos e o ciclo da terra e dos animais, tudo contado por meio de um estilo assumidamente “fora do tempo”.

Chatwin escreve como se nada tivesse acontecido na literatura ocidental desde o final dos anos 1800, e suas descrições de objetos e plantas traem um enciclopedismo doentio. Muitas vezes, “Colina Negra” é menos uma obra em diálogo com o passado e mais o pastiche de uma forma abandonada de ficção.

Um romance menor? Talvez, mas isso seria reduzir um peculiar autor. Seus gêmeos são figuras trágicas que mantêm um incestuoso relacionamento, e esse homoerotismo é lançado ao leitor em meio a banais e repetitivas frases. Chatwin mirava a inocência e o prazer do conformismo, mas deixou a visão de um mundo no qual a mais rigorosa ordem pode ser também uma forma de perversão.

Chatwin faleceu dia 18 de janeiro de 1989, aos 47 anos, em Nice, na França.

Os sobreviventes incluem sua esposa, a ex-Elizabeth Chanler, com quem se casou em 1965, do sul da França.

(Direito autoral: https://www.washingtonpost.com/archive/local/1989/01/23 – Washington Post/ ARQUIVO/ Por Richard Pearson – 23 de janeiro de 1989)

© 1996-2006 Washington Post

(Fonte: Revista Veja, 25 de janeiro de 1989 – Edição 1064 – DATAS – Pág; 83)

(Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrada – ILUSTRADA / ROMANCE / por MARCELO REZENDE / ESPECIAL PARA A FOLHA – São Paulo, 10 de setembro de 2005)

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Marcelo Rezende é jornalista, autor de “Ciência do Sonho – A Imaginação Sem Fim do Diretor Michel Gondry” (Alameda/Situações) e “Arno Schmidt” (Planeta)

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