30 de setembro de 1974 – O general chileno Carlos Prats e sua esposa morrem em atentado em Buenos Aires, praticado pela Dina, Polícia política chilena.
(Fonte: Correio do Povo – ANO 117 – Nº 363 – Há um século no Correio do Povo – 30 de setembro de 2012)
Prats: paradigma continental
O inescapável fado do general Prats
Carlos Prats (Talcahuano, 2 de fevereiro de 1915 – Buenos Aires, 30 de setembro de 1974), general chileno, ex-comandante-chefe do Exército de seu país, exilado na Argentina desde a derrubada de Salvador Allende.
No tempestuoso panorama da América Latina o general Carlos Hugo Prats Gonzales – um homem de hábitos seletos e maneiras de gentleman, amante dos livros, da pintura e da equitação – sempre despertou atenção e curiosidade dignas de um espécime raro. Ao sair da Academia Militar de Santiago, como jovem segundo tenente, em 1933, ele já defendia o ponto de vista de que um soldado não deve imiscuir-se na política.
Ao longo de toda sua carreira, até atingir o posto de general, em 1966, pregou um absoluto respeito ao processo constitucional. E como comandante-chefe do Exército chileno, nos anos atormentados do governo Allende, esforçou-se teimosamente em conter impulsos intervencionais entre as efervescentes fileiras de seus comandados.
Ironicamente, no entanto, esse paradigma continental do militar profissional, nos quatro últimos e mais difíceis anos de sua vida, foi implacavelmente perseguido pela violência política. Foi em consequência de um brutal atentado nas ruas de Santiago, em setembro de 1970 – do qual resultou morto o comandante-chefe de então, general René Schneider (1913-1970) -, que Prats passou a ocupar o mais alto posto do Exército chileno.
Três anos mais tarde, em setembro de 1973 – quando não era mais humanamente possível deter a ebulição entre os oficiais chilenos -, deixou o país por não admitir o golpe que derrubou Salvador Allende da presidência do Chile. E dia 30 de setembro de 1974, quando já há um ano vivia em Buenos Aires, acabou vitimado pelo estigma de violência que o acompanhou até mesmo no exílio morrendo com a esposa, aos 59 anos, num atentado que fez voar seu carro pelos ares.
FRENTE DEMOCRÁTICA - Desde que chegou à Argentina, na madrugada de 15 de setembro de 1973 – quatro dias depois do golpe no Chile -, Prats procurou manter-se afastado dos acontecimentos em seu país. Invariavelmente, recusava receber jornalistas em seu apartamento de três peças no sexto andar de um edifício da Calle Malabia, no bairro portenho de Palermo.
Igualmente, queria ver longe de si os numerosos chilenos exilados na Argentina, que desde a queda de Allende, ocupam-se em devaneios de contragolpe e conspiração. E certa vez, uma pessoa próxima ao general, comentou que Prats chegou a recusar um convite para chefiar uma “frente democrática” contra o atual regime chileno, da qual participariam os antigos partidos da malfadada Unidade Popular e a ala esquerdista da democracia-cristã.
Em suma, a existência de Prats, na capital argentina, resumia-se ao trabalho de contador na fábrica de pneus Citeco – onde se viu forçado a ganhar a vida, depois de quarenta anos no Exército chileno – e a eventuais visitas a casais amigos, nos fins de semana, acompanhado da mulher, Sofia. Mas, definitivamente, o general apolítico estava condenado ao fogo cruzado da política e sua morte, provocada por terroristas não identificados.
(Fonte: Veja, 9 de outubro de 1974 - Edição 318 – ARGENTINA - Pág; 37/40)