Um dos símbolos do cinema francês, conhecido por retratar melhor do que ninguém a burguesia francesa dos anos 70
Claude Sautet (Montrouge, França, 23 de fevereiro de 1924 – Paris, França, 22 de julho de 2000), diretor e cineasta francês de As Coisas da Vida, Sublime Renúncia e César de Rosalie.
Sautet viveu a reputação de fazer uma ferrenha mas delicada crítica da burguesia francesa. Ficou conhecido por retratar melhor do que ninguém a burguesia francesa dos anos 70, o diretor ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro em 1980 por Uma História Simples. Em 1996, recebeu o Cesar como melhor diretor pelo filme Nelly e Mr. Arnaud. Em sua biografia constam 30 filmes, entre eles destaca-se As Coisas da Vida, de 1969, que o projetou ao sucesso.
Vencedor do Oscar de 1980 pelo longa-metragem Une Histoire Simple, Sautet dirigiu cerca de 30 filmes ao longo de sua carreira e retratou especialmente a vida burguesa na década de 70. A última condecoração que recebeu – Prêmio Cesar, como melhor diretor – foi em 1996, por Nelly et Monsieur Arnaud. Além destes filmes, o cineasta dirigiu também Classe Tous Risques(Encurralado, 1960), Lês Choses de La Vie (As coisas da Vida, 1969) e Vincent, François, Paul el les Aitres.
Claude Sautet teve a sua fase Romy Schneider nos anos 70. Proporcionou à atriz alguns de seus mais belos papéis. Nos 90, descobriu Emmanuelle Béart. Talvez ele não fosse realmente grande, no sentido do gênio. Não foi chefe de nenhuma escola, não revolucionou o cinema francês e mundial, mas deixou o legado de uma obra admirável e era, com certeza, um dos mais respeitados diretores de cinema da França e da Europa. Sutil, talentoso, sincero.
Sua reputação era a de ser um crítico ferrenho da burguesia francesa. Claude Chabrol também possui essa reputação, mas não há nada mais diferente de um filme de Chabrol que um de Sautet. Chabrol é virulento, Sautet era delicado. Como ele mesmo disse, seu universo era o das pequenas banalidades do cotidiano. “Interesso-me pelo banal; acho que é a melhor maneira de entender a confusão dos sentimentos e também acho que, por meio dele, pode-se fazer um corte no comportamento social de forma muito mais eficiente do que observando os personagens nos momentos de catástrofe.”
Ele começou como roteirista, colaborando, entre outros, com o Georges Franju (1912-1987) do cultuado Les Yeux sans Visage e o Louis Malle (1932-1995) de O Ladrão Aventureiro, que é um grande filme, mas não faz jus ao título que recebeu no Brasil. Se há uma coisa que o personagem interpretado por Jean-Paul Belmondo naquele clássico não consegue ser é um aventureiro. Como diretor, Sautet começou nos anos 60 com filmes pouco ambiciosos e tão medíocres quanto Encurralado e Trama no Caribe. A virada começou com As Coisas da Vida, que iniciou a colaboração com Romy Schneider. Fizeram juntos mais quatro filmes – Sublime Renúncia, César e Rosalie, Mado, um Amor Impossível e Une Histoire Simple.
As Coisas da Vida é aquele filme em que o personagem de Michel Piccoli sofre um acidente de carro e revisa sua vida nos curtos momentos que antecedem a morte. Há duas mulheres em sua vida – interpretadas por Romy e Lea Massari. Sautet constrói sua dramaturgia em torno de detalhes que vão enriquecendo os personagens e iluminando a crise de Piccoli, esse homem que não consegue optar no amor e, por isso, morre. Em má hora Hollywood achou que podia refazer As Coisas da Vida. A versão americana, com Richard Gere e Sharon Stone, é tão ultrajante – não é preciso nem compará-la com o original – que o diretor Mark Rydell mereceu todas as pedras que os críticos lhe atiraram por Intersection – Uma Escolha, uma Renúncia.
Sublime Renúncia e César de Rosalie são ainda melhores do que As Coisas da Vida. No segundo, dez anos depois de Uma Mulher para Dois (Jules et Jim), de François Truffaut, Sautet criou outro dos mais belos triângulos amorosos do cinema francês. Desta vez é a bela Romy que vive entre Yves Montand e Sami Frey. A confusão amorosa, senão exatamente o triângulo, como expressão do desencontro de sentimentos, era o tema preferido de Sautet, o instrumento por meio do qual, falando sobre as pequenas vidas, ele conseguiu dar seu testemunho valioso sobre a sociedade do seu tempo.
Com Emmanuelle Béart a colaboração começou com Um Coração no Inverno. O filme, também centrado num triângulo amoroso, recebeu o Leão de Prata no Festival de Veneza e o César, o Oscar francês, de melhor direção. Conta a história de um fabricante de violinos com problemas sentimentais e um amigo que se apaixonam pela mesma mulher. Daniel Auteuil e Michel Dussolier interpretam seus personagens com convicção, mas o filme é de Emmanuelle. Sautet exigiu que ela aprendesse a tocar violino. Numa cena, a personagem toca o concerto para violino e piano de Ravel. Sem o Perpetuum Mobile, Sautet disse que não existiria o filme. É impossível ouvi-lo sem lembrar-se do filme.
Artesão – Sautet fez, certa vez, um comentário interessante sobre Romy e Emmanuelle. Disse que quando começou a trabalhar com Romy ela já era mulher feita e só o que ele precisou fazer foi oferecer-lhe papéis à altura de suas possibilidades. Emmanuelle não era apenas mais jovem no começo da associação. Também tinha menos experiência, mas Sautet nunca deixou de confiar no seu potencial. Sautet trabalhou de novo com Emmanuelle em Minha Secretária, a história de um homem de negócios (Michel Serrault) que se envolve com a secretária. Sautet fala sobre a diferença de idades, discute a solidão e revela ideias visuais mais fortes do que em qualquer outro filme que dirigiu. Talvez por ter sido roteirista, ele sempre se preocupou mais com a musicalidade dos diálogos. Em Minha Secretária, nenhum crítico deixou de notar as gravatas berrantes usadas por Serrault. Sautet transformou o detalhe numa idéia de mise-en-scène, servindo de crítica a um determinado comportamento que tem a ver com origem e classe.
O diretor nasceu em 23 de fevereiro de 1924, no subúrbio de Paris, filho de um industrial. Gostava de dizer que o instinto era seu bem mais precioso. “Confio nele mais do que em qualquer outra coisa.” O homem instintivo era também um intelectual que deixou uma obra reflexiva. E que conseguia unir, na mesma admiração, público e críticos. Não representa pouca coisa. Positif, revista francesa que disputa com Cahiers du Cinéma a primazia do debate no país mais cinéfilo do mundo – Paris é a capital da cinefilia, senão do cinema -, dedicou um dossiê a Sautet, chamando-o de artesão do cinema.
Outro talvez se ofendesse, ainda mais na França, onde se consolidou a teoria do diretor como autor. Não Sautet. Em junho de 1993, numa conversa pelo telefone com a reportagem, ele observou que a definição de artesão nunca foi empregada para ele no seu sentido pejorativo. Era um artesão na linhagem de Jean Renoir, Jacques Becker (1906-1960) e François Truffaut, que também compartilhavam o mesmo gosto pela veracidade dos detalhes e dos personagens. Com modéstia, Sautet reconhecia não ser tão grande como eles, mas disse que, como todos, buscava “uma justeza do olhar”.
Sautet morreu em 22 de julho de 2000, em Paris, aos 76 anos, de um câncer nos rins. Sem ele, o cinema francês fica menor.
(Fonte: http://www.estadao.com.br/arquivo/arteelazer/2000 – ARTE E LAZER – CADERNO 2 – CINEMA – 25 de Julho de 2000)
(Fonte: http://www.terra.com.br/istoeonline/ultimasnoticias/2000/07/24/008- 24 de julho de 2000)
(Fonte: http://www.terra.com.br/istoegente/52/tributo – TRIBUTO/ por Marcelo Zanini – JULHO DE 2000)