Bispo emérito Dom Pedro Casaldáliga, a pedra no sapato do autoritarismo brasileiro, o “bispo do povo”
Dom Pedro Casaldáliga (Catalunha, em uma província de Barcelona, em 1928 – Batatais (SP), 8 de agosto de 2020), bispo emérito da Prelazia do Araguaia. Bispo que enfrentou a ditadura militar e latifundiários da Amazônia, religioso atuou por décadas na defesa dos pequenos posseiros e dos povos indígenas.
Bispo emérito Dom Pedro Casaldáliga, da Prelazia de São Félix do Araguaia (MT). Conhecido internacionalmente pela defesa dos direitos humanos e pela sua atuação em prol dos povos indígenas
Nascido na Espanha, na Catalunha, em uma província de Barcelona, em 1928, Dom Pedro Casaldáliga vivia no Brasil desde 1968. Um dos expoentes da Teologia da Libertação, atuou na defesa de minorias no interior de Mato Grosso e sofreu diversas ameaças de morte em função de suas posições políticas, sempre a favor das minorias.
Casaldáliga se mudou para o Brasil quando tinha 40 anos. Ao chegar no Araguaia, em 1968, o religioso passou a se dedicar ao trabalho de defesa da população desfavorecida pela luta pela posse da terra. Ele foi o primeiro bispo prelado de São Félix do Araguaia, nomeado em 1971 pelo papa Paulo 6°. Ele ocupou o ofício até 2005, quando renunciou.
O bispo foi um dos responsáveis ao lado de outros religiosos progressistas pela fundação do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), na década de 1970. À época, denunciou o trabalho escravo na região do Araguaia e entrou em choque com garimpeiros, latifundiários e madeireiros.
Adepto da teologia da libertação, ele atuou contra o regime militar (1964-1985) e chegou até mesmo a contrariar o Vaticano, durante o papado do conservador Joao Paulo 2° (1978-2005). Pelo seu trabalho na Amazônia, ficou conhecido como “bispo do povo” e “bispo dos pobres”, também por causa dos seus hábitos simples e falta de vaidade.
Durante a ditadura, foi alvo em cinco ocasiões de processos de expulsão do Brasil, mas permaneceu graças as intervenções do então arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns. Com medo de ser barrado, só arriscou viajar ao exterior após a redemocratização, em 1985.
Em 1976, ao se dirigir a uma delegacia em Ribeirão Bonito (MT) para averiguar uma denúncia de tortura contra um grupos de mulheres, Casaldàliga foi ameaçado por policiais. O padre jesuíta João Bosco Penido Burnier, que acompanhava o bispo, foi assassinado com um tiro na nuca pelos agentes.
A atuação intransigente de Casaldàliga em prol dos direitos humanos lhe valeu ameaças de morte até mesmo em 2012, quando ele já tinha 84 anos e estava doente. À época, a retirada de invasores terra indígena Marãiwatsédé acirrou os ânimos na região. Casaldáliga teve que deixar sua casa.
Além do trabalho pastoral, dom Pedro Casaldáliga foi reconhecido por sua produção literária, tanto em poesia quanto em artigos e obras políticas.
Casaldáliga faleceu em 8 de agosto de 2020, no interior paulista, na cidade de Batatais (SP), aos 92 anos. A informação foi divulgada pela Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria.
O bispo estava infecção no pulmão e insuficiência respiratória agravada pelo Parkinson, doença que o acometia há mais de 10 anos. Testes não acusaram a presença do novo coronavírus.
“D. Pedro Casaldáliga voltou para a Casa do Pai”, diz a nota divulgada em conjunto pela Prelazia de São Félix do Araguaia (Mato Grosso, Brasil), a Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria (Claretianos) e a Ordem de Santo Agostinho (Agostinianos), que informou ainda que o bispo estava na cidade de Batatais.
De Batatais, o corpo seguiu para Ribeirão Cascalheira (MT). Lá, o velório ocorreu no Santuário dos Mártires, a partir de segunda, 10. E, por fim, a última homenagem ao bispo foi feita em São Félix do Araguaia, no Centro Comunitário Tia Irene, seguida do sepultamento.
Vários atores políticos do Brasil lamentaram a morte de Casaldáliga. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que dom Pedro Casaldáliga “viveu e praticou a fé e o amor que nos ensinou Jesus Cristo”. “Teve solidariedade e compromisso até o fim da vida com os desvalidos, a democracia, a liberdade, a natureza e os direitos humanos.”
O ex-governador e candidato à Presidência em 2018 Ciro Gomes afirmou: “O Brasil perdeu hoje um grande lutador. Seu trabalho importante na defesa dos povos indígenas seguirá sendo exemplo para todos, ainda mais nestes tempos de ataques aos povos tradicionais.”