Elliott Carter, um dos criadores musicais que melhor personificaram as conquistas do século 20.

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Compositor Elliott Carter

A autocrítica rigorosa, a altivez e independência em relação às exigências do mercado e a qualidade indiscutível de sua produção fizeram de Carter o compositor preferido dos europeus de vanguarda

Elliott Carter, compositor nova-iorquino, um dos criadores musicais que melhor personificaram as ambiguidades, conquistas e angústias do século 20. Não é exagero afirmar que ele viveu como estrangeiro em sua própria terra. Numa recentíssima história da música nos Estados Unidos, sua obra ficou de fora porque o autor o considerou esteticamente um europeu nascido nos EUA por acaso.

Faz sentido. A autocrítica rigorosa, a altivez e independência em relação às exigências do mercado – anátema em relação a um dos grandes dogmas da vida artística norte-americana – e a qualidade indiscutível de sua produção fizeram de Carter o compositor preferido dos europeus de vanguarda. Pessoalmente, ele era muito convicto de sua profissão de fé artística. Certamente não pensou nem em seu país nem nas convidativas atmosferas europeias.

Seguiu caminho próprio. Com exceção de seu início, na juventude, quando, conforme confessa, “namorei a ideia populista de escrever para o público”. Foi nos idos de 1924, quando conheceu o pioneiro Charles Ives, o primeiro compositor norte-americano radical e experimental. Depois de tê-lo como padrinho por alguns anos, apresentou-lhe composições neoclássicas – o que estremeceu de vez as relações de amizade entre ambos. Não por isso, mas por convicção mesmo, Carter diz que “aprendi que o público não se incomoda com isso. A partir daí, decidi compor para mim mesmo”.

Nas badaladas festas de seus 100 anos, em 2008, chegou a se irritar com a realização de uma série de concertos só com sua obra em Tanglewood. “Não estou acostumado com isso”, confessou após um concerto com a Sinfônica de Boston em que ele e sua música foram muito aplaudidos. “Quando isso acontece, fico pensando onde errei.”

Algumas de suas atitudes na plena maturidade das últimas duas décadas de vida comprovam isso. Impunha condições aos músicos, grupos e orquestras que lhe pediam encomendas. A várias sinfônicas que não tocaram sua música no passado ele recusava encomendas na lata. Mesmo assim, escreveu prodigiosamente entre 1990 e 2012. É certo que peças mais curtas, mas mesmo assim o volume impressiona. “Começo a pensar numa música nova caminhando pelas ruas de Manhattan”, disse aos 100 anos no documentário Labyrinth of Time, dirigido por Frank Scheffer. Outro lançamento marcante de seus 100 anos foi o CD-DVD da Naxos intitulado 100th Anniversary Release, com 10 obras, várias surpreendentemente “assobiáveis” e entre elas duas extraordinárias: Mosaic, incrivelmente lírica mas não tonal, esclareça-se. Mas Dialogues, de 2004, já retorna ao universo de sua música mais arisca – talvez devido ao caráter percussivo do piano, que Carter enfatiza. Entre as restantes, há até uma Remembering Mr. Ives, de 2001 para violoncelo solo, reutilizando fragmentos da imensa sonata Concord de Ives. No DVD, Carter diz que “cada composição é uma nova aventura”. Outra frase pinçada da conversa com Robert Aitken, flautista e regente do New Music Concerts Ensemble de Toronto, que interpreta as dez obras do CD: “Escrevo música que propicie prazer aos músicos”.

Elliott Carter faleceu aos 103 anos, dia 5 de junho de 2012, em sua casa em Manhattan, de causas naturais.

(Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer – Notícias – Cultura – João Marcos Coelho – ESPECIAL PARA O “ESTADO” – 6 de novembro de 2012)

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