Técnico que revelou ‘Classe de 92’ do Manchester United
Eric Harrison revelou nomes como David Beckham, irmãos Gary e Phil Neville, Paul Scholes e Ryan Giggs
Eric George Harrison (Mytholmroyd, Reino Unido, 5 de fevereiro de 1938 – 13 de fevereiro de 2019), o técnico da equipe de base do Manchester United que ficou conhecido como “Classe de 92” e na qual David Beckham deu seus primeiros passos no futebol.
Os campeões da Copa da Inglaterra Sub-18 de 1992, sob o comando de Harrison, formaram a espinha dorsal da equipe que dominou o Campeonato Inglês por duas décadas com Ferguson. Ao lado de Beckham, os jogadores formados por Harrison incluíam Ryan Giggs, Paul Scholes e Nicky Butt, além dos irmãos Neville, Phil e Gary.
Uma das primeiras coisas que Alex Ferguson fez ao assumir o Manchester United, em 1986, foi convocar o chefe de desenvolvimento das categorias de base, Eric Harrison, para uma reunião. Harrison ficou um pouco nervoso. Estava há cinco anos moldando jogadores para o time principal dos Red Devils, nomes como Mark Hughes e Norman Whiteside, mas não conhecia o novo chefe. Ferguson expressou sua insatisfação com o número de jovens promovidos das equipes inferiores. Harrison, então, propôs um acordo: “Me arranje jogadores de mais qualidade, e eu colocarei mais jovens no time principal”.
Seis anos depois, os garotos do Manchester United entraram em campo em Old Trafford para enfrentar o Crystal Palace, no jogo de volta da final da Copa da Inglaterra das categorias de base, a FA Youth Cup. Haviam vencido a ida, no Selhurst Park, por 3 a 1. Emendaram outra boa vitória, por 3 a 2, e levantaram o troféu. Aquele time alinhava Gary Neville, David Beckham, Nicky Butt e Ryan Giggs. No ano seguinte, voltaria à decisão, com Phil Neville e Paul Scholes. Harrison havia cumprido sua promessa, ajudando a formar um grupo de pratas da casa que ficaria conhecido como Classe de 1992 e que seria a espinha dorsal das glórias de Alex Ferguson.
Os seis jogadores assinaram uma homenagem escrita a Harrison que foi postada na conta do Instagram de Beckham nesta quinta-feira. “Perdemos nosso mentor, nosso treinador e o homem que nos fez”, afirmaram. “Ele nos ensinou como jogar, como nunca desistir, como importante era ganhar as batalhas individuais e o que precisávamos fazer para jogar pelo Manchester United Football Club. Ele nos fez entender como trabalhar duro e respeitar uns aos outros e não apenas em campo. Nós não vamos esquecer as lições de vida que ele nos deu. Eric, nós amamos você e lhe devemos tudo”.
Beckham se tornou um dos atletas mais famosos do planeta, sendo capitão da seleção da Inglaterra e tendo atuado por clubes como Real Madrid, Los Angeles Galaxy, Milan e Paris Saint-Germain. Giggs e Scholes ainda estavam no time quando o United alcançou o recorde de 20 títulos ingleses em 2013, com Ferguson logo depois se aposentando.
Harrison morreu aos 81 anos, deixando como legado uma influência significativa para o crescimento do Manchester United, homenageado por seus pupilos, pelo seu antigo chefe e pelo clube. Como também formou jogadores que defenderam a seleção inglesa, recebeu a Ordem do Império Britânico, ano passado, pelos seus serviços ao futebol.
Jogou bola no meio-campo entre os anos cinquenta e sessenta. No Hartlepool, foi treinado por uma lenda do futebol inglês que o daria algumas inspirações para a futura carreira como mentor de garotos: Brian Clough. “Nas conversas com o time na manhã de segunda-feira, você ficava literalmente tremendo se havia feito algo errado, ou se não tivesse jogado bem, porque ele o massacraria. Mas, se tivesse jogado bem, ele fazia com que você se sentisse com dois metros de altura. Então, pensei em tirar o lado positivo disso e tentar fazer meus jogadores se sentirem com dois metros de altura a maior parte do tempo. Com jovens, eu sempre digo, 90% é colocar o braço no ombro e 10% chutá-los na bunda”, afirmou, ao Telegraph, em 2001.
“Se eu tive alguma influência – e espero que eu tenha tido – foi mental. Eu costumava sentar com jovens jogadores e conversar pessoalmente com eles. Levou horas e horas, mas provavelmente o maior impacto que eu tive foi lhes dizer individualmente o quanto eles eram bons. Se eu pensava que eles jogariam no time principal, eu os diria isso. Eu tinha que estar certo porque era destruidor para as crianças se eu estivesse errado. Você não precisa ser muito esperto para saber que jogadores como David Beckham iriam para o time titular, mas era um fator muito, muito motivador para eles e acho que esse papel não pode ser subestimado”, completou.
As conversas continuavam mesmo quando os jogadores estavam estabelecidos no time principal. Phil Neville lembra que recebeu um bilhete de Harrison, depois de uma vitória contra o Arsenal, por 3 a 1, convocando-o para um bate-papo. “Quando seu antigo diretor quer conversar com você, você ainda pensa: ‘O que eu fiz de errado?’. Na manhã de segunda-feira, ele me ligou e começou a falar que eu havia dado as costas a Thierry Henry no mano a mano. Isso era algo que ele costumava trabalhar comigo todos os dias entre os meus 16 e 18 anos: não dar as costas, como defensor, e sempre manter os olhos na bola. E ele notou, durante o jogo, que eu havia dado as costas para Henry e ele conseguiu finalizar. Mesmo quando eu estava com 31 anos, ele não havia desistido de mim e sempre estava lá para mim”, contou Neville. “Ele foi provavelmente nosso segundo pai. Foi ele quem nos pegou aos 14 anos e nos entregou ao time principal, prontos”.
Eric Harrison morreu em 13 de fevereiro de 2019. Ele tinha 81 anos e as causas do seu falecimento não foram revelados pelo clube. O treinador foi diagnosticado com demência em 2015.
“A contribuição de Eric para o futebol, e não apenas para o Manchester United, foi incrível”, disse o ex-técnico do United, Alex Ferguson, que comandou o time profissional do Manchester de 1986 a 2013. “Ele construiu caráter e determinação naqueles jovens jogadores e os preparou para o futuro”.
“Ele foi um professor. Ele deu a esses jogadores um caminho, uma escolha e ele só fez isso através de seu próprio trabalho duro e sacrifício. Ele conseguiu transmitir essa educação aos jovens, o que fez dele um dos maiores treinadores do nosso tempo”, disse Ferguson.
Phil Neville, que construiu sua própria carreira de treinador liderando a seleção feminina da Inglaterra, definiu Harrison como seu segundo pai. “Ele não preparava você para uma vida no futebol, ele preparava para realmente ter sucesso na vida e os valores que ele incutiu em nós, um trabalho inacreditável de ética, atitude e atenção aos detalhes”, disse Neville à BBC.
A Rainha Elizabeth II retribuiu a contribuição de Harrison para o futebol no ano passado, quando o tornou membro da Ordem do Império Britânico. E a “Classe de 92” permanece unida através de suas participações acionárias no Salford City, um time da quinta divisão inglesa.