Ernest Hemingway, escritor americano, o lendário autor de Por Quem os Sinos Dobram

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Ernest Hemingway (Oak Park, Illinois, 21 de julho de 1899 – Ketchum, 2 de julho de 1961), escritor americano, o lendário autor de Por Quem os Sinos Dobram, prêmio Nobel de Literatura em 1954, extrovertido herói de toda uma geração fascinada por suas aventuras como correspondente de guerra, toureiro e caçador de leões.

Aos 62 anos, recém-saído de uma clínica de tratamento psiquiátrico, “Papa”, como o chamavam os amigos, parecia cada vez mais paranóico em relação ao FBI, que acusava de “grampear” seu telefone e de segui-lo por toda parte.

Na noite anterior a seu suicídio, em 2 de julho de 1961, Hemingway jantava com a mulher Mary em um restaurante em Ketchum, Idaho, nos Estados Unidos, quando a presença de dois homens sentados na mesa ao lado o irritou. “Eles são do FBI, continuam me perseguindo”, queixou-se.

A divulgação do dossiê de Hemingway mantido pelo FBI revelou que o escritor talvez não estivesse exagerando. Sob a direção do implacável J. Edgar Hoover, o FBI não apenas manteve Hemingway sob estreita vigilância, mas o comportamento como improvável concorrente.

SÓ EM FICÇÃO – Durante a II Guerra Mundial, Papa criara uma rede de espionagem antinazista em Cuba, para localizar e destruir submarinos alemães no Caribe, sob o patrocínio de seu amigo pessoal, o embaixador americano Spruille Braden, e Hoover se empenhou pessoalmente em desacreditá-lo. O fichário de Hemingway foi engrossado pelo FBI até 1974, treze anos após a morte do escritor, e contém quase unicamente informações derrogatórias sobre seu caráter e mesmo qualidades literárias. Hoover nunca conseguiu provar que Hemingway fosse comunista, contentando-se em desacreditá-lo por sua paixão pela bebida. Quanto à operação de espionagem, foi desativada oito meses depois. O escritor só conseguiu destruir um submarino nazista no universo da ficção – em seu livro Ilhas da Corrente.

(Fonte: Veja, 19 de outubro de 1983 – Edição 789 – ESPIONAGEM – Pág; 57)

(Fonte: Veja, 23 de janeiro de 1991 – ANO 24 – N° 4 – Edição 1166 – LIVROS/ Por Luiz Roberto Serrano – Pág; 83)

 

 

 

 

Depois da Primeira Guerra Mundial, um elogio de Gertrude Stein, que pontificava sobre literatura, como chefe dos escritores americanos e ingleses exilados em Paris (James Joyce, John dos Passos, Scott Fitzgerald), a seus primeiros contos o fez “abanar a cauda de gosto e declarar que viver era uma eterna ‘fiesta’ como as que se comemoram em Sevilha na Semana Santa'”.

Supersticioso, negou-se a ler as provas tipográficas de seu livro “Death in the Afternoon” (“Morte ao Entardecer”) que tinha no alto da página a abreviação “Morte” seguida do nome do autor: Hemingway.

Retratista mordaz, ao cobrir como correspondente do jornal “Kansas Star” uma conferência de paz em Genebra, colocou-se atrás de Mussolini, que posava com altivez diante de outros chefes de Estado, empunhando um livro acintosamente aberto. Hemingway descobriu que era um dicionário de francês e italiano que o ditador fascista contemplava de cabeça para baixo.

Irascível, quando um crítico o comparou a um touro estúpido, acusando-o de antiintelectualismo e obsessão por coragem e macheza, arrebentou com um soco um vaso de cristal que se encontrava sobre a mesa de Sylvia Beach, a editora do “Ulysses” de James Joyce em Paris.

A criança cujas primeiras palavras aprendidas junto com “papai” e “mamãe” tinham sido “fraid of nothing” (não tenho medo de nada) estava sempre presente em suas caçadas na África ou suas pescarias solitárias nas águas de Cuba: dosar o medo era vencer a vida.

O suicídio do pai pareceu-lhe um sinal de profética certeza de problemas graves a surgirem no horizonte. Antes deles, porém, em 1954, recebeu um grande tributo: o prêmio Nobel de Literatura por seu estilo nervoso, impassível, que, com a economia verbal de um despacho jornalístico, descrevia ações terríveis ou violentas: um pugilista que aguarda num hotel seus assassinos pagos para o liquidarem (“Os Assassinos”); um jovem jornalista que tem seu amor por uma lady inglesa na Espanha frustrado por uma castração, que ele esconde dos demais (“O Sol Também se Levanta”); um velho pescador que luta com a tempestade e os tubarões para chegar de volta a seu miserável vilarejo em Cuba com apenas a carcaça do peixe feroz que combateu dias a fio (“O Velho e o Mar”).

Mas, mesmo mantendo um nível constante de produção, continua com a ideia fixa: o suicídio, a solução mais rápida. Se sua primeira esposa, Hadley, não lhe concedesse o divórcio para casar-se com sua segunda mulher, Pauline, matar-se libertaria as duas de disputarem o seu amor.

Não foi preciso. Casou-se ainda duas outras vezes. Se seu talento para escrever diminuísse antes que perdesse a lucidez, o suicídio era a única forma digna de deixar a vida, como um toureiro que sai da arena mortalmente despedaçado mais invicto.

 

Maior que Shakespeare – Ambicioso, querendo escrever de forma tão revolucionária “quanto Cézanne ao inventar o cubismo na pintura”, seu propósito era “dar um chute no traseiro de Mr. Shakespeare e tornar-me o maior escritor de todos os tempos”.

Mas como o leão envelhecido que abatera num safari no Quênia, antes de escrever “As Neves de Kilimandjaro”, Ernest Hemingway perdia ano a ano sua majestade, com o surgimento de novas tendências e novos autores nos Estados Unidos. Os críticos passaram a ser para ele “os percevejos da literatura”, “as hienas e chacais que acompanham o escritor”, enquanto o jornalismo era “a maneira mais rápida de embrutecer o talento de um escritor até embotá-lo para a criação de qualquer situação humana.”

 

 

Aos sessenta anos de idade, incapaz de escrever como queria, mergulhado em crises longas de depressão esquizofrênica, milionário e mundialmente famoso, Ernest Hemingway não fez barulho numa madrugada de domingo ensolarado de julho de 1961 para não despertar a mulher dormindo no quarto contíguo.

Com seu “manto vermelho do imperador”, escolheu uma arma com a qual já tinha abatido muitos animais – uma espingarda Bosso de dois canos. “Meteu dois cartuchos, baixou cuidadosamente a coronha da arma para o chão, inclinou para diante a cabeça e encostou os dois canos na testa, logo acima do supercílio. E puxou os dois gatilhos.”

Ernest Hemingway, como indivíduo e como mito, percorre a parábola de um sol que não se levanta mais. Como um orgulhoso rei abatido, ele não consegue sobreviver à sua glória e à sua tentativa de unir o ato de escrever ao ato atlético de caçar, pescar ou boxear. O tiro final tinha sido a única forma de arrancá-lo “da jaula do seu desespero.”

 

 

(Fonte: Veja, 24 de março de 1971 – Edição 133 – LITERATURA – Pág: 70/71)

 

 

 

 

 

 

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