Waugh: o humor de outras obras dá lugar à sissudez
Waugh: experiência como correspondente de guerra
Arthur Evelyn St. John Waugh (Londres, 28 de outubro de 1903 – Taunton, 10 de abril de 1966), consagrado escritor cômico inglês com mais de duas dezenas de livros publicados, que a partir da década de 30 tornara-se um católico fervoroso. Waugh é considerado um dos maiores romancistas satíricos britânicos do século 20.
O clã Waugh tem uma vasta tradição literária. Somando a obra de filhos, netos e bisnetos do editor Arthur Waugh pai de Evelyn , chega-se a cerca de 180 livros. Evelyn é a estrela mais brilhante dessa constelação familiar. Mas seu próprio pai não o reconhecia como tal: o filho preferido era Alec, o mais velho. Escritor de sucesso em sua época, Alec caiu no esquecimento. Evelyn, ao contrário, ainda é uma influência vibrante na literatura inglesa.
Em dezembro de 1943, durante uma sessão de exercícios de guerra, Waugh, à época oficial do Exército britânico, calculou mal seu salto de pára-quedas e acabou se machucando. Nada de grave, é verdade – mas o bastante para que seus superiores lhe impusessem uma prolongada licença, que duraria até junho de 1944.
Compulsivo, Waugh aproveitou as férias forçadas para escrever um novo romance. Saudado pelo crítico americano Edmund Wilson como “o único gênio cômico de primeira classe surgido na Inglaterra desde Bernard Shaw”, o escritor decidiu mudar de estilo.
Trocou o humor insuperável de Furo! (1938) por um discurso amargo, religioso e pessimista, e o resultado foi “Memórias de Brideshead”, que deu origem à aclamada série de televisão homônima produzida e transformado em minissérie de TV pela BBC de Londres.
O sucesso do livro – que conta, com toques autobiográficos, a história de um certo Charles Ryder, capitão do Exército inglês durante a II Guerra Mundial – jogou Waugh, segundo ele próprio conta no prefácio, “num desconhecido mundo de cartas de fãs e fotografias para a imprensa.”
Em seu esforço para confeccionar um romance muito ambicioso, Waugh, traça uma espécie de roteiro das desilusões da existência humana, baseado num suposto determinismo divino sobre o destino dos homens.
Memórias de Brideshead é o relato de um desiludido. Num dia qualquer de 1944, o capitão Charles Ryder parte com o regimento que está sob suas ordens para mais um local secreto de treinamentos de combate. Depois de viajar durante toda uma noite, eles chegam à nova base de operações, Brideshead. Lá, 20 anos antes, o capitão Ryder passara alguns dos melhores momentos de sua vida, ao lado de Sebastian Flyte – um jovem de família tradicional por quem nutrira um amor homossexual, beberrão incorrigível e sempre às voltas com seu ursinho de pelúcia -, a quem conhecera durante seus estudos de História na Universidade de Oxford, logo abandonados em favor da pintura.
Ryder passa a limpo as últimas duas décadas de sua vida. Ao mesmo tempo, mostra – ora com uma crueza impressionante, ora com a pieguice mais escancarada – a decadência da aristocracia inglesa e a fragilidade de uma existência levada de costas para Deus.
Memórias de Brideshead tem seus melhores momentos justamente no retrato que traça da Inglaterra das décadas de 20 e 30. Ruas, costumes e o ambiente da greve geral da classe trabalhadora da primavera de 1926 – aparecem ao longo de Memórias de Brideshead. “Quando chegamos, vimos um cabo de aço estirado entre postes de iluminação, um caminhão virado de rodas para cima e, sozinho na calçada, um policial, que levava pontapés de meia dúzia de garotos”, conta Ryder.
“No dia seguinte, a greve foi suspensa. Era como se um bicho cuja ferocidade houvesse sido decantada durante muito tempo emergisse por uma hora, farejasse o perigo e batesse em retirada para sua toca”, compara.
Ryder, que se revelará um cético, acaba de perder seu último amor – pelo Exército. Já não pudera ficar ao lado de Sebastian, seu casamento se revelara um fiasco e a religião o afastara de Júlia Flyte, a irmã de seu amigo, com quem tivera um romance (ela se parecia muito com o jovem beberrão). Consagrara-se como pintor, mas até isso era motivo de irritação, pois seu sucesso se fazia à custa da decadência.
Sua especialidade era retratar mansões condenadas à destruição pelo poder do dinheiro, fato que o incomodava. Decepcionado com “a vida que poderia ter sido e que não foi”, Ryder volta à velha mansão de Brideshead – prestes a se transformar “num quartel e tanto” -, onde, no final das contas, poderá encontrar algum sentido para sua existência.
Memórias de Brideshead poderia estar no mesmo plano dos romances satíricos de Waugh, esta é, uma das razões pelas quais o seu nome está incluído entre os maiores escritores ingleses do século 20 – mesmo quando seu salto literário não chega a ser exemplar.
Na divertidíssima história “Furo! Uma História de Jornalistas”, em parte autobiográfica, o escritor inglês tece uma crítica mordaz ao jornalismo. Uma guerra estoura no fictício país africano de Ismaélia, e, em Londres, o jornal The Beast (A Besta) envia, por engano, para a cobertura, William Boot, que assina uma coluna sobre a vida no campo.
As peripécias de Boot, sua relação com os correspondentes de outros jornais e com seu editor em Londres servem para o autor ironizar o comportamento de parte da imprensa, ansiosa por notícias sensacionais, mesmo quando elas não existem.
Evelyn Waugh morreu em abril de 1966 com 62 anos de idade.
(Fonte: 13 de fevereiro de 1991 – ANO 24 – N° 7 – Edição 1169 – LIVROS/ Por Rinaldo Gama – Pág: 70/71)
(Fonte: 6 de setembro de 1989 – ANO 22 – N° 35 – Edição 1095 – LIVROS/ Por OKKI DE SOUZA – Pág: 118/119)
(Fonte: Veja, 30 de agosto de 1989 – ANO 22 – Nº 34 – Edição 1094 – LIVROS – Pág: 111)
A sátira perfeita
“Malícia Negra”, um romance em que o inglês Evelyn Waugh debocha de todo mundo
Evelyn Waugh foi o maior escritor satírico do século XX.
(Fonte: Veja, 12 de novembro de 2003 – ANO 36 – Nº 45 – Edição 1828 – LIVROS/ Por Diogo Mainardi – Pág: 146)