Foi pioneiro da pesquisa oncológica
“Me encontrei muitas vezes naquele ponto crucial entre o homem e sua ciência; entre o mercado e a pessoa humana; mas soube escolher sempre uma estrada precisa: a pesquisa contra o câncer é a minha vida. A vida antes de tudo.”
Gianni Bonadonna
Gianni Bonadonna (Milão, Itália, em 28 de julho de 1934 – Milão, 6 de setembro de 2015), considerado o pai da moderna oncologia italiana, autor de mais de 550 publicações na área de oncologia clínica.
Gianni Bonadonna nasceu em Milão, Itália, em 28 de julho de 1934, foi um dos pesquisadores de câncer mais influentes do mundo em sua geração.
Formado pela Universidade de Milão em Medicina e Cirurgia no ano de 1959, fez seu primeiro aprendizado em oncologia no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova Iorque, Estados Unidos, entre 1961 e 1964. Após esse estágio, no qual travou contato com importantes cientistas e pesquisadores oncológicos da época, iniciou seu trabalho no Instituto Nazionale per lo Studio e la Cura dei Tumori (Istituto Nazionale dei Tumori), em Milão, onde, em 1976, foi nomeado diretor da Divisão de Oncologia Médica e, depois, diretor do Departamento de Medicina Oncológica.
Tive meu primeiro contato com o professor Bonadonna em 1975, quando, após o término da Residência no Hospital do Câncer de São Paulo, fiz estágio no Instituto Nazionale dei Tumori com o professor Umberto Veronesi, no Setor de Mastologia e Cirurgia Oncológica. Naquela época, além do grande número de cirurgias no período da manhã, fazíamos muitos levantamentos e trabalhos na biblioteca e no arquivo central, além de participarmos de discussões relacionadas aos vários protocolos de pesquisa em andamento no Instituto.
Os setores de Oncologia Clínica e Cirurgia Oncológica estavam relacionados entre si, com Bonadonna e Veronesi no comando dos estudos, juntamente com Bruno Salvatori, Natale Cascinelli, Leandro Gennari, Alberto Luini, Gianfranco Coopmans, Francesco Di Re, Roberto Molinari, Frederico Pizzetti, Franco Rilke, Roberto Sacozzi, Giorgio Secreto, Sergio Di Pietro, Pasquale Spinelli, Lorenzo Zingo, Sergio Orefice, Stefano Podrecca, Gianni Ravasi e tantos outros. No setor de Oncologia Clínica, tínhamos os chamados “sette samurai” (sete samurais): Gianni Bonadonna, Mario De Lena, Gabriele Tancini, Silvio Monfardini, Emilio Bajetta, Pinuccia Valagussa e Gianni Beretta, responsáveis por diversas pesquisas e protocolos de quimioterapia no Istituto.
Em contato com Vincent DeVita, George Canellos e a equipe do National Cancer Institute (NCI), dos Estados Unidos — que desenvolviam protocolo combinando fármacos com distintos mecanismos de ação e perfis de toxicidade, administrados de maneira sequencial e repetida (MOPP – Mostarda Nitrogenada, Vincristina, Procarbazina e Prednisona) —, Bonadonna observou que tal esquema, utilizado no tratamento da Linfoma de Hodgkin, era de grande toxicidade. Idealizou, então, um novo esquema de quimioterapia que permanece até hoje como tratamento standard para o Linfoma de Hodgkin: ABVD – Doxorrubicina, Bleomicina, Vinblastina e Dacarbazina, sendo os resultados publicados em 1976. Foram importantes suas pesquisas que compreendem as primeiras avaliações da eficácia da Doxorrubicina, da Bleomicina e da Epirrubicina. Mas o campo no qual Gianni Bonadonna se afirma como um dos médicos que mudaram o curso da história é o tratamento do câncer de mama.
Em 1973, foi desenhado e conduzido no Istituto Nazionale dei Tumori o primeiro estudo clínico para avaliar a eficácia do esquema de quimioterapia CMF (Ciclofosfamida, Methotrexate e 5-Fluorouracil) como tratamento adjuvante ao tratamento de câncer mamário, reduzindo significativamente sua taxa de mortalidade: do grupo de mulheres que fizeram parte do protocolo CMF, apenas um terço apresentou recidiva. Bonadonna também conduziu importantes estudos de quimioterapia pré-operatória (primária ou neoadjuvante) utilizando o esquema FAC (5-Fluorouracil, Doxorrubicina e Ciclofosfamida). Como tributo a essa pesquisa, a Sociedade Americana de Oncologia Clínica instituiu, em 2007, o Gianni Bonadonna Breast Cancer Awards and Lectures, prêmio anual concedido a pesquisadores de destaque nesse campo.
Gianni Bonadonna foi o primeiro a introduzir a metodologia dos estudos clínicos controlados na oncologia médica da Itália. Autor de mais de 550 publicações sobre Oncologia Clínica, recebeu várias honrarias nacionais e internacionais, dentre as quais os prêmios: Richard and Hinda Rosenthal Foundation (1982); David A. Karnofsky, da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (1989); Medal of Honor do American Cancer Society (1991); Distinguished Service Award for Scientific Achievement, da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (1999); Breast Cancer Award, do Instituto Europeu de Oncologia (2003) e muitos outros. Em 1997, recebeu o título de fellow do Royal College of Physicians, de Londres; e, em 2004, a Laurea Honoris Causa em Medicina da Universidade de Torino, Itália. Em 1999, fundou e tornouse presidente da Fondazione Michelangelo, em Milão, a qual instituiu o prêmio anual Gianni Bonadonna Prize for New Drug Development in Oncology, concedido a pesquisadores com menos de 40 anos e que pesquisam novas drogas em oncologia.
Estivemos juntos no Brasil e também na Itália, em 1994, durante minha permanência no Istituto Nazionale dei Tumori. Na época, Gianni Bonadonna e Bruno Salvatori desenvolviam reconstruções imediatas pós-mastectomia (início da Oncoplastia atual). Tomamos bons vinhos em jantares que fazia em sua casa. Gianni nos enviava os trabalhos antes mesmo de serem publicados, assim como os livros que escrevia. Infelizmente, em 1995, apresentou um acidente vascular cerebral (AVC), contra o qual lutou até o fim dos seus dias. Fui visitá-lo pela última vez em 2012 e conversamos por duas horas sobre tantas coisas: amizade, os velhos tempos do Istituto — nada sobre medicina. Mesmo após o AVC, Bonadonna publicou vários livros: La cura possibile, 2001; Coraggio, ricominciamo, 2005; Dall’altra parte, 2006; Medicina oncologica, 2007; Una guerra da vincere, 2010; Il tumore non è un nemico imbattibile, 2012; Appuntamento col padreterno, 2014.
Gianni Bonadonna morreu no dia 6 de setembro de 2015, em Milão, aos 81 anos.
Com a morte de Gianni Bonadonna, o mundo perde um grande oncologista e cientista, personagem de quilate internacional que, com sua pesquisa, salvou vidas e elevou a qualidade de vida de muitos pacientes em todo o mundo. Todos sabemos que Bonadonna mudou o curso da história oncológica, principalmente para nós, cirurgiões. Assim, ganhou o direito de figurar entre os pioneiros no tratamento do câncer de mama, como William Stewart Halsted, David H. Patey, Joseph L. Madden, Hugh D. Auchincloss, Eduardo Caceres, Francois Baclesse, aqueles que nos ensinaram que essa enfermidade é tratável e, o mais importante, curável.
(Fonte: Revista da Faculdade de Ciências Médicas de Sorocaba – Luiz Antônio Guimarães Brondi – v. 19, n. 1 (2017)
(Fonte: http://www.onconews.com.br/site/noticias/noticias – Por Valéria Hartt – 11 SET 2015)