O porta-voz da esperança
Capra: heróis que sempre derrotam a corrupção
Frank Capra (Bisacquino, 18 de maio de 1897 La Quinta, 3 de setembro de 1991), cineasta que filmou a capacidade humana de triunfar sobre as adversidades.
Quando era adolescente e tocava banjo nas ruas da Califórnia para arranjar alguns trocados, Frank Capra não tinha muitos motivos para enxergar um futuro brilhante. Havia uma infinidade de barreiras a transpor no caminho de um jovem que, como ele, filho de italianos pobres da Sicília, emigrados para a costa oeste dos Estados Unidos em 1903, quisesse ser alguém no mundo. Três décadas depois, no papel do diretor que se transformara numa das lendas vivas do cinema, Capra tinha motivos de sobra para celebrar sua sorte. Como a maioria dos personagens de seus filmes, sujeitos comuns que trinfaram contra todas as adversidades, ele virou a mesa do destino.
Capra deixou como legado para o cinema americano uma obra notável. Capra era o cineasta do otimismo. Em filmes como A Felicidade Não Se Compra (1946) e Adorável Vagabundo (1941), professava que, com honestidade e trabalho, se podia vencer a corrupção, o poder político do dinheiro e os reveses da fortuna. Suas produções anteriores, como Aconteceu Naquela Noite (1934), O Galante Mr. Deeds (1936) e Do Mundo Nada se Leva (1938), todas premiadas com o Oscar de direção, o consagraram como um mensageiro da esperança nos tempos duros da Depressão americana.
CORONEL – Capra foi também o cineasta oficial do New Deal do presidente Franklin Roosevelt em filmes como A Mulher Faz o Homem (1939), em que James Stewart, um político idealista, vai para o Senado com o intuito de defender com honestidade os direitos dos cidadãos. Depara com uma corja corrompida e a vence – uma hipótese que arrancaria gargalhadas de observadores mais cínicos da vida política americana, como os escritores Gore Vidal ou Mark Twain (“Nós temos o melhor Senado que o dinheiro pode comprar”, disse ele na frase célebre), mas que falava ao coração do homem comum.
Exatamente por essa qualidade, foi escolhido para se integrar ao esforço de guerra americano contra a Alemanha nazista, na condição de propagandista. Dirigiu a série de documentários Por que Combatemos, com a qual recebeu uma condecoração de Roosevelt e a patente de coronel. Com seus invariáveis finais felizes, Capra não queria apenas contentar a plateia. Ele acreditava realmente na função da propaganda no cinema, conforme revelou na sua autobiografia. Em suas memórias ele também confessa os erros imperdoáveis de sua vida. O maior deles foi não ter descoberto um dos grandes símbolos sexuais do século XX, quando foi apresentado a uma jovem desconhecida: “Ela era um universo de curvas, mas se sentava contorcida e não sabia cruzar as pernas. A garota me pareceu nula, insípida”. O nome da garota era Marilyn Monroe. Foi um dos poucos erros da carreira de Capra, um cineasta cujo nome deu até origem a um tipo de filme. Hoje, quando se fala em fitas “capreanas”, sabe-se que se trata de uma história dramática mesclada de tons cômicos e contendo uma mensagem de otimismo. Capra morreu no dia 3 de setembro de 1991, aos 94 anos e há muito abandonara as câmaras, mas deixou como legado para o cinema americano uma obra notável.
FILMOGRAFIA
1934 – Aconteceu Naquela Noite (It Happened One Night)
1936 – O Galante Mr. Deeds (Mr. Deeds Goes to Town)
1937 – Horizonte Perdido (Lost Horizon)
1938 – Do Mundo Nada se Leva (You Cant Take it With You)
1939 – A Mulher faz o Homem (Mr. Smith Góes to Washington)
1941 – Adorável Vagabundo (Meet John Doe)
1944 – Este mundo é um hospício (Arsenic and Old lace)
1945 – A Felicidade Não se Compra (Its a Wonderful Life)
(Fonte: Veja, 11 de setembro, 1991 ANO 24 N° 37 – Edição n° 1199 DATAS – Pág; 95)