Montigny: um inovador
Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny (Paris, 15 de julho de 1776 – Rio de Janeiro, 2 de março de 1850), arquiteto oficial, professor de arquitetura, paisagista e urbanista francês.
Foi membro da chamada Missão Artística Francesa que chegou ao Rio de Janeiro em 1816 com os catorze artistas plásticos para, a convite de dom João VI, “atualizar o gosto e a técnica do novo império”, acaba se integrando à vida e aos hábitos da cidade.
Adaptando as elaboradas técnicas neoclássicas – colunas, arcos e grandes jardins – ao despojamento colonial, ele cria dezenas de projetos e um dos mais significativos, a casa que construiu para morar, solar onde ele viveu.
TRÊS DE PÉ – Misturando as varandas e o beiral colonial às colunatas neoclássicas, a casa de Grandjean tem dois pavimentos e é muito semelhante à que ele fez na Europa para o rei Jerônimo de Westfália. São dois andares, cada um com uma grande sala retangular e outras três salas, uma redonda e duas quadradas. Ao contrário das casas europeias com halls de entrada, ele fez sua casa de acordo com os costumes brasileiros. A porta abre diretamente para a sala principal e ele acrescenta os avarandados fluminenses ao lado das colunatas.
Como outras obras arquitetônicas do passado tratadas com desprezo pelas autoridades, das dezenas de projetos elaborados por Grandjean nos 34 anos que viveu no Rio de Janeiro apenas três ainda estão de pé. Além de sua casa, existe ainda o prédio da primeira Bolsa do Rio de Janeiro, depois Alfândega e depois II Tribunal do Júri, abandonado e estacionamento para os bancários que trabalham nas proximidades. E o pórtico principal da Academia de Belas Artes, que está no Jardim Botânico, formando um bizarro cenário, no fundo da aléia de palmeiras imperiais.
LINHAS RETAS – Grandjean nasceu em Paris em 15 de julho de 1776, e estudou em pleno período revolucionário. Ganhador de diversos concursos públicos, ele é nomeado primeiro arquiteto de Jerônimo Bonaparte. Com a derrota de Napoleão em Leipzig, interrompeu sua atividade e, entre servir ao czar Alexandre e emigrar para o Brasil, preferiu a última opção.
Na Missão Francesa, ao lado dos pintores Debret, Taunay e Joaquim de Lebreton, ele deu aulas na Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, mas, de todos, é o que sente mais dificuldades em implantar uma nova arquitetura na cidade.
Mesmo deixando muitos discípulos – são inúmeros os prédios neoclássicos espalhados pelo Brasil -, a instabilidade política e econômica, a hostilidade do ambiente e as incertezas e contradições da corte impediram Grandjean de “modernizar” a cidade. A restauração de sua casa reavivou a discussão sobre a importância da Missão Francesa e sua contribuição para a arquitetura brasileira foi importante. O colonial brasileiro já estava desgastado e as técnicas neoclássicas, adaptadas ao nosso modo de vida, foram benéficas.
Grandjean de Montigny faleceu em 2 de março de 1850, aos 74 anos, por causa de um resfriado que pegou num entrudo de carnaval, no Rio de Janeiro. Frágil como a saúde do seu mais destacado representante, o estilo neoclássico, em contraste com a paisagem aparentemente desordenada do espaço colonial, não consegue dominar o traçado da cidade.
Já os críticos questionam essa importância, a cidade colonial, que crescia organicamente pelos acidentes de terreno, era um deslumbramento. E querer cortá-la com linhas retas, como propunham os neoclássicos, era absurdo.
(Fonte: Veja, 15 de outubro de 1980 – Edição 632 – ARQUITETURA/ Por LÚCIA RITO – Pág; 175/176)