Hans Werner Henze, o revolucionário lírico

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Hans Werner Henze, o revolucionário lírico

Um dos compositores alemães mais bem-sucedidos. Moderno demais para a burguesia, “liberal de limusine” para a vanguarda, Henze permanece uma figura que desafia definições sumárias.

A menos que se aceite sem questionar a sentença sumária da intelligentsia musical – “epígono”, “reacionário”, “anacrônico” – não é fácil definir em uma palavra a personagem Hans Werner Henze.

Para começar, uma das habilidades mais admiráveis do compositor é a de combinar técnicas e elementos musicais os mais díspares, da melodia lírica ao complexo sonoro eletroacústico, do leitmotiv wagneriano ao serialismo estrito e os dispositivos aleatórios. Uma liberdade que, por outro lado, oferece flanco a críticas ainda mais ferinas: “oportunista”, “inconseqüente”, “eclético”.

Henze, portanto, um reacionário oportunista? Então, onde se encaixa o ativismo político, suas idôneas tentativas de usar a música contemporânea como instrumento de resistência, seus anos de “terror da burguesia” e o conseqüente preço que pagou em sua carreira?

É preciso mais do que uma palavra para definir essa personagem.

“Povo de assassinos”

Hans Werner Henze nasce em 1º de julho de 1926 em Gütersloh, no Estado alemão de Vestfália. Um entre seis filhos, resolve estudar música contra a vontade dos pais. Ainda adolescente, sente-se atraído pelas composições modernas, então condenadas pelo regime nazista como “degeneradas”.

A identificação do pai com o nazismo faz com que as crianças se afastem deste (“Ele era um estranho para nós, nunca falava conosco”) e se aproximem da figura materna (“Nunca encontrei tanta ética, tanta musicalidade e sentimento de justiça como em minha mamãe”).

Outsider precoce, Hans Werner “sabia que havia campos de concentração e conhecia gente que fora internada”, graças aos contatos de sua família tanto com a direita como com a esquerda. “Desde então acho os alemães suspeitos e horríveis. Até hoje”, revelou numa entrevista recente.

É recrutado aos 18 anos para lutar na guerra, como “soldado alemão, pertencente a uma nação cheia de assassinos e racistas”. Após ser transferido para o setor de cinema de propaganda e ficar preso num campo inglês, retoma em 1946 os estudos de música.

Being German

Seu professor, Wolfgang Fortner, o apresenta em 1965 como aluno-sensação nos Cursos de Férias de Darmstadt. Entretanto, nos anos seguintes, a linha desse foro da música nova se radicaliza. Um furor ideológico se sobrepõe à estética, a asquese do serialismo integral é a única linguagem aceitável.

Com suas “concessões” ao passado, à eufonia, à tonalidade, Henze é persona non grata nos meios da vanguarda. Anos mais tarde, acentuará a importância de se opor às “prescrições dos papas e regras dos monges”, que se atiravam “jubilosos nos braços da era da tecnologia”.

Não excetuada a própria aversão à condição de alemão, Henze corporifica de forma exemplar alguns dos principais vícios, virtudes e paradoxos germânicos. E, com freqüência, ele os leva até à conseqüência última.

Isto se aplica à crônica nostalgia dos alemães pela Itália – já celebrada nos diários italianos de Goethe. Esse anseio explica a brisa mediterrânea que permeia toda a música henziana. Mas também é um dos motivos por que, já em 1953, o músico troca definitivamente a Alemanha pela “terra onde florescem os limoeiros”.

Ânsia de palco

A mudança para a Itália coincide com a explosão de Henze no meio mais propício a seu talento: o palco teatral. À ópera Il Re Cervo (1953-62) segue-se o sucesso de Der Prinz von Homburg, Der junge Lord – textos adaptados pela autora austríaca Ingeborg Bachmann–, Elegy for young lovers e The Bassarids (encomendada pelo Festival de Salzburgo de 1964) – ambas com libreto de W.H. Auden, também colaborador de Igor Stravinsky.

Num escrito de 1975, Henze definia assim sua arte: “O teatro foi e é o meu território, tenho sempre que voltar a ele. Minha música anseia pelo gesto, a corporalidade e a plasticidade. Ela se entende como drama, algo que pertence intimamente à vida, e que não poderia existir na abstinência higiênica ou no particular, no doméstico”.

Ópera L”Upupa, estreada em 2003

Tamanha paixão permitiu ao compositor se arvorar, não apenas em próprio regente, como em diretor de cena e cenógrafo, “não sem ocasionalmente resultar em duvidosos diletantismos”, comenta o musicólogo Hans Vogt.

Henze permanece dos poucos compositores contemporâneos com presença assídua nos programas das casas de ópera tradicionais. Sua – declaradamente última – obra do gênero foi L”upupa, que estreou com êxito em 2003, em Salzburgo. O compositor também escreveu para o cinema, notadamente O jovem Toerless (1966) e A honra perdida de Katharina Blum (1975), ambos do alemão Volker Schlöndorff.

(Fonte: www.dw.de/dw – ESPECIAL/ Autor Augusto Valente)

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