Ilídio Matos: uma vida dedicada aos livros e aos autores
Ilídio Matos (1926-2013), o primeiro agente literário português a tempo integral.
Ilídio Matos, que foi durante largos anos o único agente literário português a exercer a profissão a tempo integral.
A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL), lhe atribuiu em 2011 o Prêmio Carreira, pelo seu longo e exemplar percurso como agente literário.
Nas feiras internacionais de direitos, como as de Frankfurt ou Londres, ele foi, durante anos, o agente português um George Smiley da nossa pequena edição: discreto (sabia guardar segredos), divertido, cauteloso, prudente, generoso e possuído pela loucura dos livros, escreve, na sua coluna do Correio da Manhã, o escritor e editor Francisco José Viegas. Ilídio Matos teria provavelmente apreciado que o comparassem à personagem de John Le Carré, já que apreciava a ficção policial e entre os primeiros autores que representou em Portugal contaram-se Agatha Christie, Rex Stout ou Ellery Queen.
De acordo com a nota da APEL, a sua carreira de agente literário teria tido início no final dos anos 1960, e o próprio Ilídio Matos, numa entrevista dada ao Diário de Notícias em 2006, lembra que o primeiro livro que agenciou foi uma obra de Rex Stout para as edições Surpresa, situando o episódio em 1968 ou 1969. No entanto, deve ser equívoco. O seu filho Jaime está convencido de que o pai começou a conciliar o trabalho que tinha no Banco de Portugal com o agenciamento literário, enquanto representante em Portugal da Curtis Brown, ainda nos anos 1950. O que parece condizer com a informação relativa às edições Surpresa, uma chancela de Vila do Conde que lançou a colecção policial de bolso Corvo, uma vez que o único livro de Rex Stout que publicaram, Os Fortes Também Morrem (Might as Well Be Dead), saiu em 1957.
Ilídio Matos colaborava com o jornal inglês Daily Mirror, fazendo equipa com o fotógrafo João Ribeiro, do Diário Popular, e que fez a cobertura da visita a Portugal da rainha Isabel II, em 1957. E que foi através dos contatos que estabelecera no Daily Mirror que veio a ser convidado para ocupar o lugar do representante em Portugal da Curtis Brown, que acabara de deixar o cargo.
Ilídio Matos entrava assim numa das mais prestigiadas agências literárias internacionais, que ajudara a promover autores como William Faulkner, John Steinbeck, Norman Mailer ou Lawrence Durrell, escritor por quem o agente português tinha particular admiração. Na entrevista que deu ao DN, diz que se rendeu ao Quarteto de Alexandria, lido por indicação do fundador da Ulisseia, Joaquim Figueiredo Magalhães.
Apesar do fascínio que sempre sentira pelo mundo dos livros, manteve-se todavia no Banco de Portugal até perfazer os anos de trabalho necessários para se aposentar. Quis sempre garantir a sua independência financeira com a reforma do banco, explica o filho, mas reformou-se logo que pôde e, a partir daí, dedicou-se em exclusivo ao seu escritório de agenciamento literário.
Entre os muitos autores que representou, contaram-se, por exemplo, os prêmios Nobel da Literatura Elfriede Jelinek e Imre Kertez. E alguns dos livros que lhe passaram pelas mãos vieram a ter grande sucesso em Portugal, como O Perfume, de Patrick Süskind, que propôs à Presença e que, 20 anos depois, continuava a render-lhe direitos.
Conhecido no meio editorial pela sua escrupulosa seriedade quando digo “closed” a um editor ou agente internacional, isso equivale a uma escritura notarial, diz na conversa com o DN , Ilídio Matos recebia, em norma, 1% do preço de capa de um livro que agenciasse (10% sobre os 10%que cabiam ao autor), e quando tinha títulos mais apetecíveis recusava-se a leiloar direitos entre várias editoras.
Ilídio Matos morreu em 12 de setembro de 2013, em Lisboa, aos 87 anos.
(Fonte: http://www.publico.pt/cultura/noticia – CULTURA/ Por LUÍS MIGUEL QUEIRÓS – 16/09/2013)