José Lino Grünewald, poeta, tradutor e crítico, mestre da tradução

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Mestre da tradução

José Lino: traduções, versos e tango

José Lino Grünewald (Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1931 – Rio de Janeiro, 26 de julho de 2000), advogado, poeta, jornalista, tradutor e crítico.

O carioca José Lino Grünewald sabia traduzir poemas como pouca gente. Graças a ele, foi possível ler no Brasil algumas das obras mais importantes da literatura moderna, como se, desde o começo, elas tivessem sido escritas em português. O melhor exemplo são os 120 dificílimos Cantos, do americano Ezra Pound.

Grünewald os traduziu por completo. Ganhou um Prêmio Jabuti pela façanha. Além de traduzir, ele próprio fazia versos. Foi um concretista de primeira hora e, do Rio de Janeiro, ajudou os paulistas Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari a divulgar seu movimento de vanguarda pelo país e pelo mundo. Como tantos escritores brasileiros, Grünewald encontrou no serviço público a tranqüilidade de que precisava para ler e criar. Ele foi procurador federal. Outra atividade que lhe dava imenso prazer era o jornalismo.

Fez muita crítica de livros e de filmes. Assim como na literatura, preferia os experimentadores no cinema: ajudou a divulgar por aqui diretores como Godard e Alain Resnais. Só mesmo na música seu gosto era tradicional. Apaixonado pelo tango argentino, dedicou-lhe um livro, Carlos Gardel, Lunfardo e Tango. Era um bom papo. E um bom copo. Os amigos o descreviam como um homem cordial. “Juntamente com Mário Faustino, que morreu nos anos 60, ele é a maior perda literária de minha geração”, afirmou o poeta Augusto de Campos. José Lino Grünewald morreu no dia 27 de julho, vitimado por uma embolia pulmonar. Tinha 69 anos, no Rio de Janeiro.
(Fonte: Veja, 2 de agosto de 2000 – Edição nº 1 660 – LUPA – Editora Abril S.A.)

Tradução dos modernos, arcadismo e poesia concreta: contribuições para o idioma

Nascido em Copacabana, filho de um funcionário da prefeitura carioca encarregado de fiscalizar o andamento das diversões públicas no Rio de Janeiro, José Lino conta que a profissão do pai ajudou muito na sua formação.

Ainda na adolescência, José Lino passou a cultivar o que se tornaria outra de suas paixões – a música. Óperas, música popular brasileira, Carlos Gardel.

JORNALISMO – A paixão pela literatura, o cinema e a música aproximou José Lino, em 1956, do crítico e poeta piauiense Mário Faustino, quando ambos trabalhavam na Fundação Getúlio Vargas. José Lino havia se formado em Direito três anos antes e já ensaiava alguns versos.

Convidado para integrar a equipe do suplemento de artes do Jornal do Brasil, Faustino arrastou José Lino consigo. Logo polemizavam juntos na página Poesia-Experiência – que viria a se transformar numa espécie de órgão oficial do concretismo, lançado naquele ano em São Paulo pelos poetas Augusto e Haroldo de Campos e Décio Pignatari.

José Lino, no entanto, escrevia também sobre cinema e em 1957 chamou a atenção dos seus leitores para um então desconhecido diretor americano – Stanley Kubrick -, para quem previa o invejável posto de maior cineasta do século 20. Ele também festejou Acossado, de Godard, no início dos anos 60, tornando-se, a partir daí, uma autoridade no movimento francês de cinema batizado de nouvelle vague.

PSEUDÔNIMO – A poesia e o jornalismo renderam inúmeros amigos a José Lino. A amizade com Faustino, por exemplo, durou até a morte prematura do crítico, em 1962. A ligação com os concretistas de São Paulo permaneceu intocável até por laços de família. José Lino foi casado desde 1960 com Ercila Azeredo, professora de Literatura Francesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, irmã de Lygia, mulher de Augusto de Campos. Otto Maria Carpeaux, Nelson Rodrigues, Paulo Francis, Janio de Freitas – a lista de amizades seladas nas redações ou nas mesas de bares, “depois da meia-noite, quando concluíam suas colunas”, foi interminável. Os desafetos também não ficaram para trás. Com a cisão do movimento concretista, em 1957, liderada pelo poeta maranhense Ferreira Gullar, José Lino deixou o suplemento do Jornal do Brasil – e passou a ser achincalhado por ele.

Em 1959, um ano depois de ter lançado seu primeiro livro, Um e Dois, José Lino foi atacado no suplemento do JB, num artigo assinado por José Guilherme Merquior. Merquior – que mais tarde se tornaria célebre por debater ideias alheias e não conseguir formular nenhuma que lhe fosse própria.

VICIOS VITAIS – José Lino aposentou-se como procurador, na Secretaria de Transportes do Rio de Janeiro, sua vida profissional sempre esteve mais inclinada para o jornalismo. Dentro de sua hierarquia muito particular de vícios vitais, o jornalismo ocupa o segundo posto – ao lado da poesia, atrás do jogo e à frente da bebida.

Como tradutor, além dos Cantos, José Lino deu, em 1984, outra contribuição fundamental à língua portuguesa. Foi o trabalho feito com Igitur, um complexo e inacabado texto em prosa escrito por Mallarmé, que tem um fragmento incluído, com comentários, no novo Poemas.

Foi ex-colaborador de Walter Avancini na Rede Globo, na qual a última novela que acompanhou foi Vale Tudo. Lunático e intelectual, José Lino Grünewald adorava olhar as nuvens – mas sempre com os pés no chão.

As tiradas do poeta

Vida é vício
Se um dia escrever a minha autobiografia, ela vai se chamar Relato de Porre.
Uísque é mecicinal. Cerveja é refrigerante.
Tenho uma arte organizada e uma vida anárquica.
É muito mais fácil ouvir alguém assobiando As Pastorinhas do que o Samba de uma Nota Só.
Chaplin foi o maior artista do século XX. Kubrick é o grande cineasta do nosso tempo, mas Chaplin estava além do cinema.
Hoje não é nada, mas dizer nos anos 50 que João Cabral era o maior poeta brasileiro soava como uma heresia. E tudo é muito simples – Drummond tem alguns poemas descartáveis e Cabral nunca colocou no papel nada que não fosse essencial.
Arte é forma.
Sou ateu, mas não sou materialista.

(Fonte: Veja, 6 de fevereiro de 1991 – ANO 24 – Nº 6 – Edição nº 1 168 – LIVROS/ Por Rinaldo Gama – Pág; 80/81)

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