Lucjan Korngold: a vida e os projetos do arquiteto modernista
Conheça mais sobre o arquiteto polonês que veio ao Brasil como refugiado judeu no período entreguerras, e, aqui, fez boa arquitetura moderna, que segue referência até hoje
O arquiteto Lucjan Korngold, em retrato de origem desconhecida — Foto: ArquivoArq/Reprodução
Lucjan Korngold (1897-1963), foi um arquiteto moderno de origem polonesa, com atuação profissional dividida entre dois continentes, chegando ao Brasil no período entre as duas Guerras Mundiais. Foi uma das grandes personalidades que contribuíram para o modernismo brasileiro, com obras que seguem se destacando na paisagem urbana de São Paulo. Abaixo, conheça mais sobre a trajetória de Korngold e algumas de suas principais obras!
A vida de Lucjan Korngold na Europa
Lucjan Korngold nasceu na Varsóvia, na Polônia, em 1897, quase na virada do século 19 para o 20. Formou-se engenheiro-arquiteto pela Escola Politécnica de Varsóvia, entre 1921 e 1922 – mesma época em que Le Corbusier (1887-1965), um dos precursores da arquitetura moderna, desenvolvia o conceito de Unité d’Habitation. Então, apesar da formação clássica, foi influenciado pelos “ventos” do modernismo.
Korngold frequentou eventos culturais e artísticos das vanguardas europeias, o que moldou seu olhar sobre as relações entre arquitetura e cultura na sociedade moderna. Recebeu menção honrosa na 5ª Triennale di Milano, em 1933, e participou da Exposição Internacional de Artes e Técnicas na Vida Moderna, em Paris, em 1937.
Porém, o sonho da Europa moderna foi interrompido em 1939, quando Korngold foi chamado para integrar o exército polonês. Neste ano, a Alemanha invadiu a Polônia e iniciou uma onda de perseguições aos judeus, o que o levou a fugir para Bucareste e se exilar no Brasil.
A chegada de Lucjan Korngold ao Brasil
Lucjan Korngold e sua família, junto de outros 900 refugiados judeus, conseguiram permissão de exílio ao Brasil, em 1940, graças a negociações entre o Vaticano e o Itamaraty. Já no navio a caminho da América, Korngold começou a fazer contatos e planejar a continuação de sua atuação como arquiteto no novo país.
Chegando a São Paulo, trabalhou no Escritório Técnico Francisco Matarazzo Neto, entre 1940 e 1943. Depois, associou-se ao arquiteto húngaro Francisco Beck (1901-1990), até, finalmente, montar o Escritório Técnico Lucjan Korngold Engenharia e Construções.
Em 1949, Korngold conseguiu se naturalizar brasileiro, e, em 1953, recebeu o registro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), o que possibilitou assinar e se responsabilizar tecnicamente pelos projetos e obras do escritório.
Korngold, ao lado de outros imigrantes, como Franz Heep (1902-1978), Jacques Pilon (1905-1962) e Giancarlo Palanti (1906-1977), e de brasileiros, como Rino Levi (1901-1965), Oswaldo Bratke (1907-1997) e Oscar Niemeyer (1907-2012), participou do processo de metropolização da cidade de São Paulo, que já vinha acontecendo desde a década de 1930 e se intensificou nas décadas de 1950 e 1960. Nesse período, ocorreu uma forte verticalização da região central, incluindo arranha-céus, que representam desenvolvimento e modernidade.
Os projetos de Korngold no Brasil foram internacionalmente reconhecidos, com publicações na revista L’Architecture D’Aujourd’hui e no livro Arquitetura Moderna no Brasil. Ainda, participaram da histórica exposição Arquitetura Latinoamericana desde 1945, do Museum of Modern Art of New York (Moma). Mais recentemente, Korngold voltou a ser celebrado com o livro Lucjan Korngold, arquiteto, publicado pela Romano Guerra Editora em 2024, com textos de Anat Falbel e ensaios fotográficos de Nelson Kon e Alberto Ricci.
Outro aspecto interessante da vida de Korngold no Brasil foi o acolhimento que ele deu a arquitetos imigrantes mais jovens, inclusive, inserindo-os no mercado de trabalho. Por exemplo, em 1950, conheceu o conterrâneo Jorge Zalszupin (1922-2020) no Rio de Janeiro e ofereceu emprego para ele em São Paulo, bancando inclusive sua passagem e hospedagem. Ainda, em 1960, ofereceu sociedade a Abelardo Gomes de Abreu (1929-2024), que era brasileiro, mas estava voltando de uma experiência internacional em um escritório de arquitetura em Illinois, nos Estados Unidos.
Os projetos comerciais de Lucjan Korngold
Korngold é responsável por um dos cartões-postais de São Paulo: o Edifício CBI-Esplanada, de 1947, no Anhangabaú, o primeiro arranha-céu moderno da cidade. Trata-se de um projeto comercial multiúso, com hotel, escritórios e lojas. Inicialmente, deveria ter estrutura metálica, o que se mostrou impossível por questões técnica e financeira. Mesmo de concreto armado, o CBI-Esplanada teve a estrutura independente, garantindo a flexibilidade necessária à complexidade do programa.
As fachadas contam com uma grelha ortogonal pré-fabricada de concreto, que protegem do sol e das chuvas tropicais. Essa variante de brise-soleil está presente em outros projetos de Korngold, como os edifícios Thomas Edison, de 1944, e Rio Claro, de 1946, ambos também no centro de São Paulo. Apesar de modernos, esses projetos apresentam influência do classicismo italiano.
Já o Palácio do Comércio, de 1955, tem a verticalidade acentuada pelas fachadas contínuas de vidro e aço. Neste projeto, é mais forte a influência do modernismo norte-americano, referência predominante entre os edifícios de escritórios construídos no Brasil a partir dos anos 1950.
Também levam a assinatura de Korngold o Centro Comercial do Bom Retiro, de 1957, e a Bolsa de Cereais, de 1962, entre outros prédios do centro de São Paulo.
Os projetos residenciais de Lucjan Korngold
Apesar da importância dos projetos comerciais de Korngold para a verticalização do centro, talvez sejam seus projetos residenciais em Higienópolis, bairro onde morava, seu maior legado em São Paulo.
O Chopin, de 1960, o Higienópolis, de 1947, o Santa Amália, de 1940, e o São Vicente de Paula, de 1948, são hoje considerados achados imobiliários, pelas lindas fachadas e pelos apartamentos amplos, com pés-direitos altos e boa ventilação natural – diferente do que, em geral, é proposto pelas incorporadoras do século 21.
O Edifício Higienópolis, projetado em 1947, é uma das várias obras de Lucjan Korngold em São Paulo, para onde o polonês imigrou no período entreguerras. (André Scarpa/Divulgação | Retrato: ArquivoArq/Reprodução)
O Edifício Higienópolis, inclusive, foi a residência de Korngold até seu falecimento, em 1963, em um apartamento na cobertura.
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https://revistacasaejardim.globo.com/amp/arquitetura/noticia/2025/01 – Casa e Jardim/ ARQUITETURA/ Por Maria Silvia Ferraz –
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