Luiz Gonzaga do Nascimento, o “Lua”, foi o inventor de toda a corrente da moderna MPB

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Luiz Gonzaga do Nascimento, o “Lua”, como lhe apelidou o ator Paulo Gracindo nos anos 40 diante de seu rosto redondo e iluminado, nasceu em Pernambuco, na pequena cidade de Exu, no alto sertão.

Luiz Gonzaga foi o inventor de toda a corrente da moderna MPB que se convencionou chamar genericamente de música nordestina. “Eu não inventei apenas o baião, mas também o forró, as marchinhas juninas, tudo que é arrasta-pé”, dizia ele sem modéstia, mas coberto de razão. Filho de um sanfoneiro festejado na região de Exu, ele foi para o Rio de Janeiro aos 26 anos, depois de oito engajado no Exército, disposto a viver da sanfona. Preparou um repertório sob medida para o gosto da capital – boleros, valsas e fox-trotes – e conseguiu emprego num bar do Mangue, hoje extinta região de meretrício do centro carioca. Certo dia, um grupo de estudantes cearenses lhe pediu para interpretar músicas do Nordeste. Gonzaga os atendeu, manteve as músicas no repertório e, dias depois, o sucesso era tanto que atraiu os caças-talentos da gravadora RCA.

A partir daí, Gonzaga se tornou um dos grandes êxitos do rádio e um compositor de imaginação prodigiosa nos ritmos nordestinos. Incansável, até há poucos meses percorria o Nordeste de ponta a ponta apresentando shows, embora morasse na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, com a segunda mulher. Autor de 578 músicas, gravadas em 54 LPs, era aclamado nas apresentações , mas não era um rosto frequente na TV. “Televisão é pra mostrar mulher bonita – só dá vez a quem é feio por curiosidade”, dizia.

“Ninguém vai acabar com o forró, porque é a música do povo, e vou cantá-lo até o dia em que Deus tirar a minha voz”, gritou o compositor Luiz Gonzaga ao final de sua apresentação no Recife, no dia 6 de junho de 1989. Preso a uma cadeira de rodas por força da osteoporose, doença degenerativa que mina os ossos, Gonzaga não pôde naquele momento empunhar a sanfona e, com o sorriso largo que usava sob o chapéu de cangaceiro, fazer sua pose favorita de Rei do Baião. Não havia sequer o sorriso. Quem estava próximo ao palco notou que, emquanto fazia sua defesa apaixonada do forró, Gonzaga chorava copiosamente. Foi sua despedida do público, seu último show, o adeus emocionado de um dos grandes músicos populares que o Brasil já teve. Na madrugada da quarta-feira, dia 2 de agosto de 1989, Gonzaga morreu de pneumonia no Hospital Santa Joana, no Recife, onde estava internado há 42 dias. Tinha 76 anos.

A morte de Luiz Gonzaga emocionou o país e comoveu a população de Pernambuco. O compositor pedira para ser enterrado em Exu e, antes disso, que seu corpo fosse abençoado em Juazeiro do Norte, terra do Padre Cícero, de quem era devoto. Na quinta-feira, dia 3 de agosto, no cortejo feito por um carro de bombeiros entre a Assembleia Legislativa – onde seu corpo foi exposto à visitação pública ao longo do dia anterior, com filas de até meio quilômetro – e o Aeroporto dos Guararapes, onde dois aviões do governo do Estado foram colocados à disposição da família, Gonzaga foi homenageado por multidões que saíam às ruas para entoar suas músicas mais famosas, como Asa Branca, Triste Partida, Assum Preto e Vozes da Seca, compostas, em sua maioria, em parceria com Humberto Teixeira. As emissoras de rádio do Recife interromperam suas programações e passaram a transmitir reportagens ao vivo do cortejo, enquanto as emissoras de televisão davam flashes a cada dez minutos, com cenas de comoção popular.

BOLEROS – Quando o corpo de Gonzaga chegou a Juazeiro, mais de 1 000 pessoas invadiram a pista do aeroporto para homenageá-lo. O compositor Luiz Gonzaga Jr., seu filho, pretendia que a bênção fosse feita no próprio aeroporto, antes de o corpo seguir para Exu. A pressão de vereadores, radialistas e do povo em geral, no entanto, o convenceu a concordar com o novo cortejo pelas ruas da cidade, que parou para se despedir do compositor. Na sexta-feira, dia 4, ele foi finalmente ele seria enterrado. Com sua morte, a MPB perde um gigante. O compositor que com seus baiões e seu sorriso largo inventou o som do Nordeste.

(Fonte: Veja, 9 de agosto, 1989 – Edição n° 1091 – DATAS – Pág; 105/106)

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