Maria da Conceição Tavares: economista e professora, ícone do pensamento econômico desenvolvimentista
Portuguesa naturalizada brasileira, professora se dedicou a pensar a economia do Brasil. Entrevista ao programa ‘Roda Viva’ em 1995 repercute até hoje nas redes sociais.
Tavares se dedicou a pensar a economia do Brasil. Professora formou gerações de economistas no Brasil.
A economista Maria da Conceição Tavares, em foto de 2016 — (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Maria da Conceição Tavares (nasceu em 1930, em Aveiro, Portugal – faleceu em 8 de junho de 2024, em Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro), economista e escritora, foi uma das mais importantes economistas do Brasil, e participante ativa do debate público sobre política econômica, sobretudo no período da redemocratização, nos anos 1980.
A economista foi um dos principais nomes do pensamento desenvolvimentista, que defende uma maior intervenção do Estado na economia para estimular o crescimento.
Nascida em Aveiro, em Portugal, em 1930, e radicada no Brasil desde 1954 – se naturalizou brasileira em 1957, dedicou-se a pensar a economia do Brasil. Com gestos firmes, vozeirão, sotaque português e frases contundentes, influenciou gerações de economistas e políticos. Nas últimas décadas, virou figura pop nas redes sociais.
Maria da Conceição formou-se em matemática pela Universidade de Lisboa em 1953. No ano seguinte, migrou para o Brasil para escapar da ditadura portuguesa de Salazar.
No Brasil, cursou Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde concluiu a graduação em 1960.
Maria da Conceição foi professora na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O ensaio “Auge e Declínio do Processo de Substituição de Importações”, de 1972, foi um “marco no estudo do processo de industrialização do Brasil e tornou-se clássico na literatura especializada”, segundo a Universidade de São Paulo.
Maria da Conceição foi deputada federal entre os anos de 1995 e 1999, pelo PT. Foi também professora-titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professora-emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Em 1998, venceu o Prêmio Jabuti na categoria Economia por sua significativa contribuição ao pensamento econômico no Brasil.
Tavares formou nomes como o ex-ministro José Serra e a ex-presidente Dilma Roussef, e sempre defendeu que o Estado fosse responsável pelo desenvolvimento econômico do país.
Além de professora e deputada, Maria da Conceição trabalhou no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (hoje BNDES) e na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). No ano 2000, a publicação inglesa A biographical dictionary of dissenting economist (Um dicionário biográfico da economia dissidente, em tradução livre), editada por professores da Universidade de Cambridge e da Universidade de Leeds, a elegeu uma dos 100 mais importantes economistas mundiais do século XX que trabalhavam com correntes de pensamento econômico não neoclássicas.
Seu trabalho costuma ser dividido por pesquisadores em três fases. Na primeira, quando estava ligada à Cepal, dedicou-se ao desenvolvimento econômico do que se chamava “periferia” global, sobretudo o caso brasileiro. Em um segundo momento, na Unicamp, analisou criticamente e dialogou com textos de autores tradicionais da economia política, como Karl Marx, John Maynard Keynes e Michal Kalecki (1899 — 1970). Posteriormente, na UFRJ, focou seus estudos em economia política internacional, analisando a organização econômica global dos anos 1980 e a hegemonia americana.
Era defensora ferrenha do desenvolvimento com justiça social. Em 1995, no seu primeiro ano de mandato como deputada, Tavares deu uma entrevista para a “Roda Viva” que repercute até hoje nas redes sociais.
Em 2012, ganhou o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia de 2011 da então presidente Dilma Roussef.
A professora ficou conhecida como defensora fervorosa do Plano Cruzado e do combate à inflação. Nos anos 1980, chorou em frente às câmeras de TV na defesa do Plano Cruzado, em um dos momentos mais marcantes daquela época de euforia que o congelamento de preços trouxe ao povo brasileiro.
Em 1994, elegeu-se deputada federal e foi uma das vozes mais críticas ao Plano Real. Em 1995, no primeiro ano de mandato de Fernando Henrique Cardoso, Tavares deu uma entrevista para o programa “Roda Viva”, da TV Cultura, que repercute até hoje nas redes sociais, em que analisa a economia brasileira:
A carreira de Conceição foi marcada por passagens no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde foi homenageada em março de 2024, e pelo Grupo Executivo da Indústria Mecânica Pesada (Geimape).
Maria da Conceição chegou a lecionar no Chile e no México. Foi presa pela ditadura em novembro de 1974 e solta poucos dias depois, por pressão de integrantes do governo, como o então ministro Mario Henrique Simonsen.
Escreveu diversos artigos e livros, que trouxeram análises profundas sobre a economia brasileira e suas transformações.
Virou referência do pensamento desenvolvimentista no Brasil e inspirou até personagem na Escolinha do Professor Raimundo, programa da TV Globo: Maria da Recessão Colares, criada pela humorista Nádia Maria, que morreu no ano 2000.
Fuga de ditadura portuguesa
Maria da Conceição Tavares se formou em Matemática pela Universidade de Lisboa em 1953. No ano seguinte, migrou para o Brasil para escapar da ditadura portuguesa de Salazar.
No Brasil, cursou Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde se graduou em 1960.
Segundo a Universidade de São Paulo, o ensaio “Auge e declínio do processo de substituição de importações”, de 1972, foi um “marco no estudo do processo de industrialização do Brasil e tornou-se clássico na literatura especializada“.
No Brasil, enfrentou mais uma vez a ditadura, desta vez a brasileira. A militância em defesa da democracia a levou ao exílio no Chile.
Vida política
Quando retornou ao país, militou no Movimento Democrático Brasileiro, antecessor do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), mas foi pelo Partido dos Trabalhadores (PT) que se elegeu deputada federal em 1994.
Após o fim do mandato, em 1999, se tornou consultora para assuntos econômicos do partido.
Em 2011, a então presidente Dilma Rousseff (PT) entregou o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia a Maria da Conceição, a mais alta condecoração na área. A ex-presidente havia sido aluna de mestrado da economista na Unicamp na década de 80.
A presidente Dilma Rousseff entregou nesta quinta-feira (17) o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia de 2011 para a professora de economia, escritora e consultora portuguesa Maria da Conceição de Almeida Tavares, que é naturalizada bra — (Foto: Roberto Stuckert Filho / Presidência)
Nos últimos anos, a economista viralizou nas redes sociais com trechos de entrevistas e aulas.
Um dos trechos compartilhado por milhares de pessoas é uma análise sobre o crescimento da economia sem preocupação social:
“A economia que não se preocupa com justiça social é uma economia que condena os povos. É isso que está ocorrendo no mundo inteiro, uma brutal concentração de renda entre riqueza, o desemprego e a miséria”, disse a economista.
Confira suas obras publicadas:
- Da substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.
- A economia política da crise: problemas e impasses da política econômica brasileira. Rio de Janeiro: Vozes, 1984.
- Uma reflexão sobre a natureza da inflação contemporânea. Rio de Janeiro: Instituto de Economia Política, 1984.
- O grande salto para o caos: o Plano Cruzado em posfácio. Rio de Janeiro: Zahar, 1986.
- Problemas de industrialización avanzada en capitalismos tardios y periféricos. Rio de Janeiro: Instituto de Economia Industrial, 1986.
- Japão: um caso exemplar de capitalismo organizado. Brasília: IPEA, 1991.
- (Des)Ajuste global e modernização conservadora. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
- As políticas de ajuste no Brasil: os limites da resistência. São Paulo: IESP, 1993.
- O Estado que nós queremos. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1993.
- Em defesa do interesse nacional: desinformação e alienação do patrimônio público. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
- Lições contemporâneas de uma economia popular. Rio de Janeiro: Markgraph, 1994.
- Os excluídos: debate entre os autores. Petrópolis: Vozes, 1995. Coautor: Luciano Mendes de Almeida.
Maria da Conceição Tavares faleceu aos 94 anos, no sábado (8), em Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro.
Repercussão
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou a morte de Maria da Conceição.
“Tive o prazer e a honra de conviver e conversar muito com minha amiga ao longo dos anos, debatendo o Brasil e os nossos desafios sociais e econômicos no Instituto Cidadania, em conversas no Rio de Janeiro ou em viagens pelo Brasil.”
Márcio Porchmann, presidente do IBGE, disse que Maria da Conceição “deixa uma trajetória exemplar de educadora engajada no que de melhor o pensamento crítico gerou no Brasil”.
“Intelectual comprometida com a transformação nacional ousou diuturnamente enfrentar a ditadura civil-militar, constituindo parte integrante do movimento da democratização do país.”
Dilma disse que Maria da Conceição era uma “mulher brilhante e profundamente comprometida com a soberania nacional”:
“Minha amiga e professora era uma mulher brilhante e profundamente comprometida com a soberania nacional, tendo atuado decisivamente na construção de um Brasil menos desigual. Era uma portuguesa que veio para o país ainda criança e virou uma brasileira de coração e de compromisso firme com o nosso povo.”
“Conceição ensinou toda uma geração que economista não era uma questão de mercado. Comemoramos o prazer de ter vivo na mesma época”, afirmou Gloria Moraes, economista, amiga e ex-aluna de Maria Conceição Tavares, ao informar o falecimento.
(Créditos autorais: https://www.msn.com/pt-br/noticias/brasil – Estadão Conteúdo/ NOTÍCIAS/ BRASIL/ História de Redação – 08/06/2024)
(Créditos autorais: https://g1.globo.com/economia/noticia/2024/06/08 – G1 Economia/ ECONOMIA/ NOTÍCIA/ Por João Gabriel Alvarenga, g1 – 08/06/2024)