Metalúrgicos soltam grito de protesto que foi a primeira grande manifestação popular por democracia

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Lula
O destino reservou ao retirante nordestino uma biografia política que o transformou no maior líder operário jamais surgido no país.
A voz rouca e gutural do sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva eletriza os 100 mil grevistas reunidos no estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo. O ano é 1980, e o movimento dos metalúrgicos paulistas desafia o governo militar. Subitamente, as palavras de Lula tornam-se inaudíveis. Ouve-se apenas o ruído de foices ceifando o ar. São helicópteros do Exército, que sobrevoam o campo de futebol a poucos metros do solo. Os operários sentem o vento das hélices soprar seus cabelos. Do interior dos aparelhos, soldados apontam metralhadoras. É um momento de dramática tensão: qualquer gesto em falso pode desencadear uma catástrofe. Pouco a pouco, um burburinho vai tomando forma e abafa o zumbido das aeronaves: orquestradas por Lula, 100 mil vozes entoam o Hino Nacional.
As greves de 1979 e 1980 no ABC paulista tiveram um alcance muito maior do que a simples luta por salários. Desde 1964, o movimento sindical se encontrava sufocado pelos militares. Ao se insurgirem, os metalúrgicos soltaram um grito de protesto que foi a primeira grande manifestação popular por democracia. Estava lançada a semente que levaria à agitação pelas eleições diretas e ao fim do regime dos generais. À frente desse movimento, pontificava Lula.
Projetado pelas greves, o sindicalista criou um partido socialista poderoso (o Partido dos Trabalhadores) e se converteu no maior líder operário já aparecido no Brasil. Eleito deputado federal em 1986, foi três vezes candidato à Presidência (em 1989, 1994 e 1998), e nas três terminou como segundo colocado. Desmerecê-lo por essas derrotas, porém, seria ignorar a trajetória surpreendente do menino faminto que alimentou as esperanças de milhões e desafiou os patrões.
Lula nasceu no sertão pernambucano, em 1945. Duas semanas antes, o pai havia abandonado a mulher e os seis filhos, deixando-os na mais extrema penúria. Aos sete anos, o menino cumpriu a sina de todo nordestino miserável: montou na carroceria de um caminhão para fugir da seca. Em São Paulo, a família ocupou um cubículo insalubre nos fundos de um bar. Para ajudar a mãe, Lula vendia amendoim, cocada e laranja. Aos 14 anos, conseguiu vaga numa metalúrgica em São Bernardo do Campo. Trabalhava 12 horas por dia e, à noite, freqüentava um curso de torneiro mecânico. Certa vez, o colega com quem dividia a prensa cochilou por causa de excesso de trabalho: o dedo mínimo da mão esquerda de Lula foi arrancado pela máquina.
Carismático, íntegro e inteligente, não contentou-se em ser apenas mais um operário submisso. Eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, convenceu 200 mil operários a cruzar os braços em 1979. No ano seguinte, liderou a famosa greve de 41 dias, que lhe valeu um mês de prisão. Libertado, a primeira coisa que fez ao chegar em casa foi abrir as gaiolas e soltar os passarinhos. Sonhava fazer o mesmo com os operários.

(Fonte: 500 ANOS/50 PERSONAGENS)

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