“O Brasil é um país que não sai do lugar.”
Martin Wolf, comentarista chefe de economia do FT, discorre sobre a conjuntura econômica brasileira
MARTIN WOLF, comentarista chefe de economia do Financial Times
Martin Wolf, o comentarista chefe de economia do diário britânico Financial Times, não costuma dedicar muito do seu tempo ao Brasil. Suas colunas geralmente tratam do que se passa na política e na economia dos Estados Unidos, da Europa e dos gigantes asiáticos. Na entrevista a seguir, provocado por Época NEGÓCIOS, ele discorre sobre a conjuntura econômica brasileira e o que enxerga como as questões primordiais do presente e do futuro. Wolf veio a São Paulo para participar do Fórum Cidadão Global, evento organizado pelo jornal Valor Econômico que contou com a participação do ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama.
O que achou do Prêmio Nobel de Economia para Richard Thaler?
Ele é uma figura muito interessante e tem feito um trabalho muito importante. Se não me engano, é a terceira vez que o Prêmio Nobel vai para um economista comportamental. Esta é uma área que tem trazido uma inovação extremamente importante para a economia. Não tenho dúvida de que o futuro da economia vai envolver, entre outras coisas, seguir em frente na compreensão da psicologia humana e seu impacto nas decisões econômicas.
Quais as suas expectativas sobre o Brasil? Na sua passagem por São Paulo, o sr. falou que acredita que estamos iniciando um processo de recuperação.
A recessão brasileira foi obviamente muito profunda em comparação com o restante do mundo — e não foi causada por causa da crise global, mas por assuntos domésticos. Minha leitura das evidências é de que a economia começou a crescer lentamente. Seria razoável dizer que o Brasil está em recuperação, mas isso também depende do parâmetro de comparação.
Como vê os impactos econômicos da tormenta política que atravessa o país?
Meu conhecimento sobre o assunto é muito limitado. Mas há óbvias conexões entre recessão econômica e crise política. A recessão econômica é parcialmente uma consequência de grandes erros na política econômica, que, por sua vez, estão correlacionados com os casos de corrupção que estão aí. Isso não ocorre separadamente. Após a grande recessão, [os governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff] fizeram investimentos imensos e ofereceram subsídios para manter o crescimento em alta. E assim surgiu uma nova onda de recessão. Essas coisas estão conectadas. Há uma tendência em se encontrar corrupção nas recessões.
Arriscaria alguma previsão sobre o futuro do país?
O Brasil tem encarado questões políticas muito importantes. A mais relevante é a política fiscal, com uma atenção para o gasto público de forma a evitar a armadilha do déficit. Esses pontos estão se tornando críticos e lidar com eles passa pela política. Além disso, meu ponto durante muito tempo tem sido que o Brasil tem apresentado resultados muito abaixo do seu potencial. Este é um país com condições de ter melhor desempenho. Em relação aos países desenvolvidos, o Brasil continua muito distante, é um país que não sai do lugar.
Há algo estrutural que chama a sua atenção?
Além desses pontos imediatos — manter a estabilidade fiscal e evitar um default —, é preciso rever relação do Estado com o setor privado. Isso requer uma reforma extensa. Se isso não acontecer pelas mãos de um governo determinado, o crescimento econômico passará a ser ainda mais lento. E se isso de fato acontecer, as pessoas podem ficar com raiva e a estabilidade política pode se perder pelo caminho, comprometendo até mesmo a democracia. O Brasil está em um momento em que não é possível separar a política da economia. Isso ocorre porque a política está em todos os lugares aqui. O governo é muito intrusivo.
O que pode dizer sobre os modelos de desenvolvimento testados no Brasil?
As lições gerais sobre desenvolvimento são muito claras a respeito de algumas coisas. Nos últimos quarenta anos o Brasil não investiu o bastante e, sem investimento, não é possível sustentar um crescimento exponencial. Para o Brasil crescer, teria de investir pelo menos 25% do PIB [a taxa de investimento registrada pelo IBGE no primeiro trimestre é de 15,6%]. A China investe quase 50%; a Índia investe mais de 30%. Todos os países asiáticos que estão crescendo investem mais de 30%. O único país latino americano que tem feito isso é o Chile.
(Fonte: http://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2017/10 – ECONOMIA – NOTÍCIA / 12/10/2017)