Pablo Neruda, poeta, embaixador e político, Prêmio Nobel de Literatura de 1971

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Poeta apaixonado, Pablo Neruda provou os prazeres da vida, amou as mulheres e se comprometeu com o socialismo no Chile

Pablo Neruda | (Foto: Michel Lipchitz/Laços de Poesia/Divulgação)

Pablo Neruda | (Foto: Michel Lipchitz/Laços de Poesia/Divulgação)

 

Pablo Neruda (Parral, Chile, 12 de julho de 1904 – Santiago, 23 de setembro de 1973), poeta chileno, membro do Comitê Central do Partido Comunista do Chile. Embaixador e político, Prêmio Nobel de Literatura de 1971. Político e poético – Neruda era pessoalmente mais humilde. Considerava-se apenas “um poeta dedicado ao povo” e admitia que a falta de cuidado em seus versos era fruto de sua obsessão em escrever – aos 15 anos, produzia duas dúzias de poemas por dia e sua obra completa ultrapassa 3 000 páginas. Amado e sempre lido pela sua obra mais popular (muitos consideram-na também a melhor), “Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada” (1924), ele evoluiria para uma linguagem surrealista nos volumes de “Residência na Terra” (em 1933, 1935 e 1947) até chegar ao “Canto Geral” (1950), ambiciosa tentativa de tratar de todos os problemas morais e políticos da América Latina, e às “Odes Elementares” (1954), onde uma simplicidade maior permitia-lhe dedicar poemas ao fígado e à cebola.

Embora os poemas políticos ocupem uma porção ínfima de sua obra, foram eles que lhe granjearam uma intensa promoção internacional. Neruda concordava alegremente em divulgar poemas-panfletos como “United Fruit Co.” (Jeová dividiu o planeta / Anaconda, Ford Motors, Coca-Cola / E outras iguais / A mais suculenta de todas / United Fruit Incorporated”) ou um texto muito divulgado no Chile no começo de 1973, chamado “Convite para Nixoncídio e Louvor da Revolução Cubana”, onde o presidente americano é chamado de “analfabeto e chacal indiferente”.

Ressurreição – Mas Ricardo Eliecer Neftalí Reues y Basoalto, filho de um ferroviário que lhe proibia escrever poemas, fez também um uso mais elevado das palavras. Era um poeta amoroso (“O amor é tudo na minha vida”, dizia ele), introdutor de algumas inovações surrealistas em espanhol, e que frequentemente aquecia-se em erotismo verbal (“Corpo de mulher, alva colina / O meu corpo selvagem de camponês te escava”). Seu nome público, adotado quando tinha 19 anos em homenagem a um escritor checo que admirava, Jan Neruda (1834-1891), atraiu as atenções do governo chileno, que fez dele um diplomata em 1927. Depois disso, esteve na Índia, Ceilão e Buenos Aires, chegando à Espanha em 1934.

Juntou-se então ao grupo de uma revista dirigida por Federico García Lorca e durante a Guerra Civil Espanhola deu provas de grande coragem pessoal, ajudando e abrigando os inimigos do franquismo vitorioso, que já executara seu amigo Lorca. A mesma coragem ele ele demonstraria no Chile, em 1944, quando foi eleito senador e começou uma dura campanha para diminuir a influência americana no continente. Em 1948, depois de acusar o presidente Gabriel González Videla de “vendido”, foi obrigado a sair do país. Atravessou os Andes a cavalo, só com a roupa do corpo, chegou à Argentina e durante oito anos viveu em vários países. Foi o embaixador de Allende em Paris até fevereiro de 1972, quando se afastou para sua casa na Ilha Negra, então doente. Dois meses antes ele havia publicado um manifesto no jornal “Le Monde”, reafirmando a sua confiança no socialismo chileno e perguntado “como imaginar que este governo, que tem o apoio das Forças Armadas, dos sindicatos e do povo, possa se curvar a uma violência ilegal!?”.

O segundo chileno a ganhar um Prêmio Nobel de Literatura (a poetisa Gabriela Mistral foi contemplada em 1945) casou-se três vezes e só teve uma filha, no primeiro casamento, morta em 1942. Ironizava sua própria bagagem literária (“Ela deve pesar uns 3 quilos”), vestia-se sobriamente, era afável, glutão e no fim da vida algo descrente da poesia, “um gênero talvez em vias de superação”.

Para ele, ser chileno era um ofício espinhoso: “O nosso é um país áspero, seco, difícil de dominar. Desde que existe, o país sempre sofreu catástrofes. Toda a vida dos chilenos resume-se no ato de produzir esse país indômito: nossos mineiros extraem o cobre a uma altura de 4 000 metros, e é nas geladas planícies da Patagônia que vivem os nossos pastores”. Quando morreu de câncer, no dia 23 de setembro, o poeta mal tivera tempo de rabiscar seus derradeiros versos condenando amargamente o golpe militar que derrubara seu amigo Salvador Allende – para o poeta, uma nova catástrofe, tornando o país ainda mais difícil para milhares de pessoas.

Neruda, que sobreviveu apenas doze dias à morte de Allende, desapareceu no meio de boatos espalhados em todo o mundo. Ele teria sido fuzilado, preso ou deportado. Na França, organizações esquerdistas afirmavam que o câncer do poeta era na verdade o desgosto de ver a política do seu país, na qual ele se empenhava a vida toda, tornar caminhos inesperados. Outros, porém, afirmavam que a poesia de Neruda, ao contrário do socialismo de Allende, sobreviverá: “Era o maior poeta vivo de língua espanhola”, comentou um crítico mexicano. No seu enterro em Santiago, cerca de 1 000 pessoas – pouca gente, em condições normais, mas uma multidão, no atual Chile – declamaram seus poemas e cantaram a “Internacional” comunista. Era uma espécie de ressurreição dentro da dificuldade chilena: pela primeira vez, desde a derrubada de Allende, as autoridades toleraram uma manifestação pública.

Neruda morreu no dia 23 de setembro de 1973, aos 69 anos, de câncer, em Santiago.

(Fonte: Veja, 3 de outubro, 1973 -– Edição 265 –- LITERATURA – Pág; 112)

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