Primeiro português a treinar o Brasil foi árbitro, campeão pelo São Paulo e comandou o Corinthians
CBF procura dá o braço a torcer após demissão de Dorival e tem lusitanos na alça de mira, mas um ‘gajo’ no comando da seleção não seria caso inédito
O sucesso alcançado pelos treinadores portugueses no País faz a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) considerar a contratação de um técnico lusitano para a seleção brasileira, vago após a demissão de Dorival Júnior. Jorge Jesus, ex-Flamengo e atualmente no Al-Hilal, desponta como o favorito, enquanto Abel Ferreira, do Palmeiras, corre por fora. Apesar de o Brasil tradicionalmente não escolher estrangeiros para a função, não seria inédito um profissional de Portugal à frente do time nacional.
O último estrangeiro a comandar a seleção foi Jorge Gomes de Lima, mais conhecido como Joreca. A sua passagem foi relâmpago, ficando no cargo por apenas três dias, de 14 a 17 de maio de 1944, dividindo a função com o brasileiro Flávio Costa. Neste período, o Brasil venceu dois amistosos contra o Uruguai, por 6 a 1, e 4 a 0.
Apesar do aproveitamento de 100% como Brasil, Joreca não continuou no cargo nos compromissos seguintes, e a seleção ficou sob responsabilidade de Flávio Costa, segundo técnico mais longevo na função, atrás somente de Tite, e que estava à beira do gramado na fatídica derrota por 2 a 1 para o Uruguai na final da Copa de 1950.
Paralelamente, Jorge Gomes de Lima construiu trajetória campeã no São Paulo e também treinou o Corinthians antes de morrer prematuramente, aos 45 anos, em 5 de dezembro de 1949, vítima de um ataque cardíaco.
De acordo com a Associação Nacional dos Árbitros de Futebol (ANAF), Joreca nasceu em 7 de janeiro de 1904, em Lisboa, Portugal, mas fez toda a sua carreira em terras tupiniquins. Ele trabalhou como jornalista e foi cronista de rádio paralelamente à sua dedicação ao desporto. O gajo se formou na Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFEUSP) e seu primeiro trabalho como treinador foi à frente da seleção paulista de amadores.
A carreira de Joreca também reservou momentos dentro das quatro linhas, mas não como jogador, e sim como árbitro. Ele apitou o jogo de estreia de Leônidas da Silva pelo São Paulo, em 1942, em um empate por 3 a 3 no clássico com o Corinthians, no Pacaembu. A história dele com o tricolor paulista não parou por aí. No ano seguinte, aceitou uma oferta do então presidente Décio Pedroso para comandar a equipe são-paulina.
Um dos motivos que levou Joreca a ser procurado pelo São Paulo foi a sua eloquência para falar sobre futebol. Alguns consideram inclusive que o português foi precursor de casos como o de João Saldanha, histórico jornalista que também foi treinador e chegou a comandar a seleção brasileira.
Joreca estreou como técnico do São Paulo na goleada por 6 a 1 sobre a Portuguesa Santista, em 1943. Naquele ano, ele vou o time tricolor ao título do Paulistão, em conquista conhecida como “título da moeda em pé”, uma referência a uma provocação de torcedores de Palmeiras e Corinthians, que diziam que a equipe do Morumbi só seria campeão quando a moeda do cara ou coroa caísse de pé.
O português voltou a ser campeão estadual com o São Paulo em 1945 e 1946. Em seu último título pelo clube, protagonizou campanha invicta, com incríveis 30 vitórias, quatro empates e quatro derrotas. Joreca deixou o comando do time tricolor em 1947, com 166 jogos, com 109 vitórias, 31 empates e apenas 26 derrotas. Os dados são do Almanaque do São Paulo, de Alexandre da Costa.
Em 1949, Joreca assumiu o Corinthians e, segundo o Almanaque do Corinthians, de Celso Unzelte, o português treinou o time do Parque São Jorge em 52 partidas, com 28 vitórias, 10 empates e 14 derrotas. Ele não chegou a conquistar títulos com a equipe alvinegra, mas é tido como o responsável por impulsionar a carreira de Baltazar, a quem teria insistido em aperfeiçoar a técnica do cabeceio — o ídolo corintiano marcou 71 dos seus 266 gols pelo time alvinegro de cabeça. A última partida do treinador foi uma derrota por 3 a 2 justamente para o São Paulo, pelo Paulistão daquele ano.
‘Tugas’ na mira
A busca da CBF por um treinador estrangeiro acontece após o sucesso dos portugueses no futebol nacional, especialmente de Jorge Jesus, cujo sucesso no Flamengo escancarou a porta para compatriotas no País. Ele foi contratado em junho de 2019. Ao fim da temporada, acumulou as taças do Brasileirão e da Libertadores.
O sucesso de Jesus teve impacto imediato e a busca por treinadores estrangeiros foi consolidada pelo êxito de Abel Ferreira à frente do Palmeiras. De 2020 para cá, já são dez títulos pelo Palmeiras, incluindo o bicampeonato da Libertadores e Brasileirão, e o tri do Paulistão. Em 2024, outro português, Artur Jorge, levou o Botafogo ao título do Campeonato Brasileiro e da inédita Libertadores.
Portugal se especializou em formar treinadores principalmente por criar há mais de 30 anos um curso de formação na área. O futebol português começou a se transformar em um celeiro de treinadores em 1975. Na época foi criada em Lisboa a primeira especialização em futebol voltada para graduados em Educação Física. O curso atraiu tantos interessados que depois foi estabelecido um novo parâmetro para frear o excesso de treinadores certificados.
Nos últimos 30 anos, o curso organizado pela Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e pela Associação Nacional dos Treinadores de Futebol (ANTF) obteve sucesso a ponto de parte do currículo ser utilizado como referência pela Uefa para aplicação em outros países.
(Créditos autorais reservados: https://www.estadao.com.br/esportes/futebol – ESPORTES/ FUTEBOL/ Por Rodrigo Sampaio – 06/04/2025)
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