‘Jornal Nacional’: Primeiro programa de TV exibido em rede para todo o Brasil completa 50 anos no ar
Telejornal chegou às cinco décadas em 1° de setembro de 2019, e tem sua história e as histórias que contou revistas em livro e série de reportagens
No dia 1º de setembro de 1969, a gasolina subiu para 39 centavos de cruzeiros novos, enquanto dois acontecimentos da véspera atraíam as atenções. Lá fora, o mundo lamentava a morte do pugilista americano Rocky Marciano, que viria a inspirar o Rocky Balboa de Sylvester Stallone anos mais tarde. Por aqui, o brasileiro festejava a vaga na Copa do México, conquistada com um gol de Pelé sobre o Paraguai, diante de um Maracanã entupido de 183 mil pessoas.
DEZ CURIOSIDADES DOS 50 ANOS DO ‘JN’
Pauta da primeira edição: no alto da folha, Armando Nogueira (1927-2010), diretor de jornalismo, anotou : “…e o Boeing decolou!” Foto: Reprodução
Imagem em movimento: em cinco décadas, o telejornal teve 16 variações de logomarca e 14 aberturas diferentes Foto: Reprodução
Naquela segunda-feira, às 19h45, Hilton Gomes e Cid Moreira apresentaram o primeiro programa de TV exibido em rede para todo o país. Era a estreia do “Jornal Nacional”, gerado do Jardim Botânico, Zona Sul do Rio, quatro anos após a criação da Globo.
Cid Moreira e Hilton Gomes, primeira dupla de apresentadores, em 1971 Foto: TV Globo / Ronald Fonseca)
Antes de apresentar as notícias, Hilton Gomes (1924-1999) anunciou: “O ‘Jornal Nacional’ da Rede Globo, um serviço de notícias integrando o Brasil novo, inaugura-se neste momento: imagem e som de todo o Brasil”. A integração era resultado da primeira rede básica de transmissão por microondas do país, lançada meses antes pela Embratel.
— Desde a década de 1950, Roberto Marinho sonhava em construir uma rede de televisão que unisse o país levando informação e entretenimento de qualidade aos brasileiros — diz João Roberto Marinho, presidente do Conselho Editorial do Grupo Globo. — Em 1965, inaugurou a TV Globo e, em 1969, conseguiu formar uma rede com o “Jornal Nacional”. Desde então, o “JN” é motivo de orgulho para todos nós pela qualidade do trabalho de uma equipe enorme que produz um jornalismo isento e independente. E de uma enorme satisfação pela preferência da maioria dos brasileiros.
A equipe reunida em 1971, incluindo Cid Moreira, Hilton Gomes, Walter Clark e Armando Nogueira (Foto: Ronald Fonseca / Agência O Globo)
Além do alcance nacional, o “JN” entrou no ar de um jeitão diferente. Seu maior concorrente, o “Repórter Esso”, da Tupi, deixava a principal notícia para o fim. No novo noticiário, ela passou a vir na frente. E foi assim já naquele 1º de setembro, que começou com o estado de saúde do presidente Costa e Silva, vitimado por uma trombose cerebral, e sua substituição por uma junta militar, que governaria o país por dois meses. Ao fim do noticiário, entrava o “boa noite” que virou um clássico. Cid Moreira, hoje com 91 anos, repetiu a saudação cerca de 8 mil vezes desde 1969 até deixar o programa, em 1996.
Dupla mais longeva: Cid Moreira e Sérgio Chapelin dividiram a bancada por 17 anos, de 1972 e 1983 e de 1989 a 1996 (Foto: Divulgação)
Líder de audiência
Idealizado por Armando Nogueira (1927-2010), então diretor de Jornalismo da Globo, o “JN” criava, assim, um modelo que passaria a ser seguido na emissora e fora dela.
Estreia (1969)
Em 1º de setembro, ia ao ar a primeira edição do ‘JN’ apresentado por Hilton Gomes e Cid Moreira. Dois anos anos antes da introdução do teleprompter na emissora, os apresentadores liam as notícias em cópias mimeografadas (cuja tinta, eventualmente, manchava os âncoras de roxo) e tinham de memorizar parte das informações.
Revolução dos Cravos (1974)
Uma das primeiras grandes coberturas internacionais do jornal foi a das manifestações que encerraram a ditadura salazarista em Portugal, em 25 de abril. Sandra Passarinho e o repórter cinematográfico Orlando Moreira foram enviados para Madri, na Espanha, de onde enviavam as matérias via satélite, e depois seguiram para Lisboa.
Anistia (1979)
Após a promulgação da Lei da Anistia em 28 de agosto, o “JN” passou a acompanhar a libertação dos presos políticos no Brasil e da chegada dos primeiros exilados, a partir de 31 de agosto, como o jornalista Fernando Gabeira, os ex-governadores Leonel Brizola e Miguel Arraes o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.
João Paulo II no Brasil (1980)
No dia 30 de junho começava a primeira visita de um papa ao país. Durante 12 dias, o jornal acompanhou a passagem do pontífice por cidades como Rio, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre. Em Aparecida do Norte, o JN acompanhou a missa celebrada para mais de 300 mil pessoas que tomavam a cidade.
Morte de Tancredo Neves (1985)
O primeiro presidente civil após 24 anos de ditadura militar morreu no dia 21 de abril, após 39 dias internado no Instituto do Coração (SP). Mesmo sendo um domingo, uma edição especial do ‘Jornal Nacional’ foi ao ar após o ‘Fantástico’, com quatro horas de duração, apresentada por Sérgio Chapelin
Chernobyl (1986)
No maior desastre nuclear da história, a explosão de um dos quatro reatores da Usina de Chernobyl, na Ucrânia, antiga URSS, provocou uma nuvem de radioatividade que chegou a vários países europeus. Com a imprensa internacional proibida de entrar na Ucrânia, Renato Machado fez as matérias de Upsala, na Suécia.
Queda do Muro de Berlim (1989)
O muro construído em 1961 começou a ser destruído pelos cidadãos dos lados comunista e capitalista em 9 de novembro. Por sugestão do repórter cinematográfico Paulo Pimentel, Silio Boccanera abriu a matéria do alto do muro, junto da multidão, no dia seguinte.
Guerra do Golfo (1991)
Os EUA iniciaram, em 17 de janeiro, os bombardeios ao Iraque, após o ultimato para que Saddam Hussein deixasse o Kuwait. A equipe liderada por Pedro Bial já havia entrado no Iraque em 1990, e o início da guerra foi noticiada pelos correspondentes nos EUA, na Inglaterra, na Jordânia e em Israel, em entradas ao vivo.
Tetracampeonato da Seleção (1994)
Conquistado na véspera, no domingo, 17 de julho, o título que pôs fim ao jejum de 24 anos do país em Copas foi destaque na edição de segunda, com uma grande cobertura sobre a campanha brasileira nos EUA, a angústia do torcedor na disputa por pênaltis com a Itália e a emoção de Galvão Bueno no momento do título.
11 de Setembro (2001)
O ataque terrorista às torres do World Trade Center, em Nova York, mereceu uma edição especial do ‘JN’, com uma hora de duração. Mobilizada durante todo o dia, a equipe de correspondentes entrou ao vivo, de Nova York, Washington, Londres e Beirute.
Tsunami na Ásia (2004)
No dia 26 de dezembro, a costa da Indonésia e países como Tailândia, Maldivas, Índia e Bangladesh foram atingidas por uma série de ondas gigantes, que mataram mais de 200 mil pessoas. A cobertura foi feita pelos correspondentes Marcos Uchoa e Sergio Gilz, enviados à Indonésia, Tailândia, Sri Lanka.
Ocupação da Vila Cruzeiro e Complexo do Alemão (2010)
O flagrante da fuga de traficantes feito pelo Globocop em 25 de novembro e seus desdobramentos foram destaque no ‘JN’ durante quatro dias. A cobertura que envolveu 200 profissionais foi consagrada com o Emmy Internacional no ano seguinte, na primeira conquista de um telejornal brasileiro na premiação.
Brumadinho (2019)
A edição de 25 de janeiro do ‘JN’ foi dedicada à tragédia causada pelo rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, da Vale. O telejornal mostrou o avanço dos 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos que atingiram a região com a reportagem enviada ao local e por meio de registros de celulares da população.
— O “Jornal Nacional” é líder absoluto de audiência porque soube acompanhar, ao longo dos anos, todas as revoluções tecnológicas — diz o diretor-geral de Jornalismo da Globo, Ali Kamel. — Hoje, na era digital, os brasileiros recebem informações de todos os lados: de sites de jornais, em notificações de celulares, em redes sociais, numa conversa com amigos, ouvindo o rádio enquanto vão ao trabalho, e grande parte das pessoas nem sempre tem tempo de parar ao longo do dia para se aprofundar, embora haja boa oferta de grande qualidade. O papel que o “JN” assumiu nestes anos foi reunir essas informações dispersas e contextualizá-las, com início, meio e fim. É por esse motivo que os brasileiros param diante do “JN”: porque aquilo que, para muitos estava disperso, se encaixa como num quebra-cabeça. A missão que o “JN” se dá hoje é essa. E com resultado. A audiência, sem igual no mundo, mostra isso.
Da Revolução dos Cravos (1974), à morte de Tancredo Neves (1985), da visita do Papa João Paulo II (1980) à queda do Muro de Berlim (1989), do 11 de Setembro de 2001 ao rompimento da barragem de Brumadinho, em janeiro deste ano, a trajetória do jornal está sendo revista agora em “JN — 50 anos de telejornalismo” (Globo Livros).
William Bonner e Fátima Bernardes no aniversário de 30 anos do ‘JN’, em 1999 (Foto: Reprodução)
(Fonte: https://oglobo.globo.com/cultura – CULTURA / ‘Jornal Nacional’: Primeiro programa de TV exibido em rede para todo o Brasil completa 50 anos no ar / Por Nelson Gobbi – 30/08/2019)