Robert Musil (Klagenfurt, 6 de novembro de 1880 – Genebra, 15 de abril de 1942), escritor austríaco responsável por uma transformação profunda dos propósitos e das características da literatura alemã, considerada o marco inicial do moderno romance alemão.
Seu importante romance de estreia, O Jovem Törless (1906), sobre as aflições de um adolescente durante seus anos de formação numa academia militar, foi de importância fundamental em sua obra, um marco. Na publicação de Três Mulheres (1924), trouxe num só volume, três histórias impecáveis do autor.
Três Mulheres reúne as melhores qualidades de Musil. São três novelas curtas e independentes que gravitam em torno de uma figura feminina.
Na primeira, Grigia, um engenheiro de minas acaba envolvendo-se com uma camponesa casada. Dessa forma, o engenheiro é um personagem que catalisa, em si, o raciocínio sobre as vicissitudes da vida. Mas trata-se de um raciocínio que não leva, necessariamente, à ação: quando o engenheiro se vê encurralado, numa mina abandonada, pelo marido da camponesa, é incapaz de olhar para trás e utilizar uma outra saída que lá havia, pois só consegue olhar para a frente, preocupado com a saída fechada.
A Portuguesa, a segunda novela, apresenta uma discussão semelhante, embora em ambiente e estilo bem diversos da anterior: uma aristocrata portuguesa, estrangeira na terra de seu amo, é abandonada durante o tempo de guerra. A insegurança do amo em relação à esposa ao voltar, o ciúme que desenvolve em relação a um visitante português, o caráter místico de suas atribuições e a tensão interminável que se estabelece em seu raciocínio dos fatos e circunstâncias que o cercam compõem o cerne da história. E, outra vez, sentimos o personagem que pensa e tenta decifrar o que a própria razão lhe oferece.
Na última novela, Tonka, o conflito entre fato e pensamento, entre dúvida e certeza, eleva-se ao paroxismo. Entre apaixonado e intrigado com a passividade de uma humilde criada, o protagonista leva às últimas consequências a força vital de sua própria incerteza: une-se à humilde criadinha e acompanha-a em sua gravidez.
Essas três histórias discutem, cada uma à sua maneira, os mesmos dilemas do jovem Törless, inseguro entre misticismos irracionais, propostas totalitárias e ímpetos sensuais.
RESGATADO – Mais importante ainda, são as reflexões dos que não têm receio de enfrentar sua própria conduta moral e de procurar, constantemente, alternativas para um encurralamento social. Musil sempre tentou ampliar o quadro de alternativas. Seu último romance, O Homem Sem Qualidades, também é a história de uma reflexão e, em última análise, de uma procura: um matemático aposentado, sem ambições, vazio, pensa o vazio de sua própria vida e da sociedade em que vive. A reflexão que daí resulta é fundamental e atual.
O mais importante da criação literária de Musil esteja nisso: reflete o papel do próprio intelectual em tempos de crise e de desorientação. Quando Musil morreu, exilado em Genebra, na miséria, ainda estava à procura: trabalhava incessantemente na versão final de sua obra-prima. Anos mais tarde, após a II Guerra Mundial, Robert Musil começou a ser entendido e valorizado, estudado e analisado, para o bem da literatura.
(Fonte: Veja, 10 de agosto de 1983 – Edição 779 – LIVROS/ Por LUIZ ROBERTO GALÍZIA – Pág: 117)