Rossini: vocação para a ópera-cômica
Gioachino Antonio Rossini (Pésaro, 29 de fevereiro de 1792 – Passy, Paris, 13 de novembro de 1868), um músico e compositor além de seu tempo, um excelente compositor de ocasião.
A obra mais importante de Rossini, a única que jamais deixou o repertório lírico internacional, O Barbeiro de Sevilha.
Seguem-lhe em importância La Cenerentola e L Italiana in Algeri, musicalmente do mesmo nível de excelência, mas com libretos bastante inferiores.
Rossini, aliás, gabava-se de conseguir pôr música em qualquer libreto, por mais estapafúrdio que fosse, até mesmo um rol de lavadeira.
Os críticos não deixaram de aplaudir essas três óperas, mas submetiam-as a muitas ressalvas, questionando-se se o Barbeiro conseguiria vinte anos de sobrevida nos teatros.
Para eles, o modelo de ópera-bufa era A Pedra de Toque, considerada uma obra menor de Rossini. E modelo de ópera séria Otello, peça dramaticamente vazia, que seria refutada pela obra-prima homônima de Giuseppe Verdi.
É ressaltado o temperamento irônico e jovial de Rossini e as suas lutas para se impor aos empresários e diretores de teatro, extensos comentários sobre cada uma das óperas por ele compostas até 1824 (todas as importantes, à exceção de Guilherme Tell).
Impressões de um diletante que talvez sejam desprezadas pela posteridade
Rossini, praticamente encerrou a sua carreira como compositor, aos 38 anos. Não chegaram a uma conclusão definitiva a esse respeito. A explicação mais prosaica é que o compositor acumulara fortuna suficiente para não mais precisar compor para ganhar a vida.
A mais incisiva diz que Rossini jamais se conformou com o insucesso de Guilherme Tell, a cuja composição tanto se dedicou.
A mais profunda admite que Rossini entendeu que seu gênio não se adaptava à nova onda estética da época, o romantismo.
Sua vida foi organizada em biografia escrita em 1824, quando Rossini contava apenas 32 anos – trata-se de uma coleção de impressões de um grande escritor sobre a obra de um grande compositor do seu tempo.
Em Vida de Rossini, o ótimo escritor Stendhal lançou o clássico acrescentou três apêndices: “Notas de um diletante”, escritas pelo próprio Stendhal, em 1824; o ensaio “Em defesa de Rossini”, escrito pela cantora Geltrude Righetti-Giorgi, em 1823, em resposta a um jornalista inglês que ninguém mais era do que Stendhal acobertado por um pseudônimo: e o famoso artigo de Edmond Michotte que narra o encontro entre Rossini e Wagner em 1860.
Foi nesse encontro que Rossini revelou o conteúdo de sua célebre visita a Beethoven, em Viena, em 1822. Na breve entrevista, o gênio musical do compositor alemão percebeu o que o diletantismo de
Stendhal não pode alcançar: que a vocação de Rossini era a ópera-cômica. “Não deixe de compor muitos Barbeiro”, recomendou Beethoven ao despedir-se do visitante.
(Fonte: Veja, 20 de setembro de 1995 – Edição 1410 – LIVROS/ Por Mario Henrique Simonsen – Pág: 121)