Sam Rivers, um dos grandes nomes do jazz de improviso e vanguarda

Sam Rivers (El Reno, Oklahoma, Estados Unidos, 25 de setembro de 1923 – Orlando, Estados Unidos, 26 de dezembro de 2011), saxofonista, um dos grandes nomes do jazz de improviso e vanguarda.

Nascido em Oklahoma em 1923, em uma família de músicos, Rivers adotou o estilo musical “bebop” nos anos 50 e fez turnês com a cantora Billie Holiday, antes de integrar a banda de Miles Davis em 1964, com quem gravou o disco ao vivo Miles in Tokyo no mesmo ano.

Rivers gravou uma série de álbuns inovadores de sua própria autoria para o selo Blue Note, entre eles Fuchsia Swing Song. Também tocou com o baixista Dave Holland e o baterista Tony Williams.

Em 1970, Rivers e sua mulher, Bea, compraram um apartamento no coração de Nova York, ao que chamaram Studio Rivbea e cujas portas estavam sempre abertas para os músicos e aficionados por jazz. Em pouco tempo, o lugar se converteu na pedra angular do movimento Loft Jazz Scene, que se popularizou nos anos 70 em Nova York e que consiste em fazer shows em grandes apartamentos, que são reciclagens de fábricas e armazéns em desuso.

Nos anos 80, Rivers tocou durante quatro anos com a banda United Nations de John Birks Dizzy Gillespie, para logo se estabelecer em Orlando e formar sua própria banda.

– Para mim, meu pai esteve de férias a vida toda – disse sua filha e empresária Monique Rivers Williams na segunda-feira, ao jornal The Orlando Sentinal.

Sam Rivers morreu dia 26 de dezembro de 2011, de pneumonia, em Orlando, nos Estados Unidos. Tinha 88 anos.
(Fonte: zerohora.clicrbs.com.br/rs – Memória – 28/12/11)

Sam Rivers: O homem que sabia de mais

Foi um dos mais influentes e criativos músicos do jazz de vanguarda do século XX. O saxofonista, compositor e educador Sam Rivers morreu no dia 26, aos 88 anos. Lamentavelmente, a sua estatura e o seu profundo rigor intelectual e artístico permanecem por descobrir para um grande número de pessoas

Apesar de nunca ter atingido a notoriedade e reconhecimento de muitas das personalidades com quem tocou, nomeadamente Miles Davis, Herbie Hancock, Cecil Taylor ou Dave Holland, a obra de Sam Rivers influenciou gerações de novos músicos, fazendo a ponte entre o jazz de vanguarda e as correntes mais académicas e tradicionais desta música.

Recusando-se a fazer qualquer tipo de concessão artística, manteve um extraordinário nível de criatividade ao longo de toda a carreira, seguindo uma visão pessoal e profundamente humana, de grande rigor intelectual. Referindo-se à forma como encarava a improvisação, afirmou: “Liberdade, para mim, não significa renunciar de forma incondicional à melodia e ao ritmo, mas sim ser livre para escolher o que quero tocar. Livre significa para lá de todas as categorias.”

Nascido em El Reno, no Oklahoma, numa família de músicos, começou cedo a sua aprendizagem no piano e violino. Com uma infância que o levou às cidades de Chicago, Little Rock e Boston, adoptou o saxofone como instrumento principal e chegou a andar em digressão, ainda em início de carreira, com a cantora Billie Holiday.

No início da década de 60, adopta progressivamente os movimentos vanguardistas dofree, partilhando experiências com Archie Shepp, Bill Dixon, Paul Bley ou Cecil Taylor. Em 1964, seguindo uma recomendação de Tony Williams, Miles Davis contrata-o para integrar a sua banda, numa estadia que, apesar de breve, lhe permite participar nas gravações de Miles in Tokyo. Ainda no mesmo ano, participa em Life Time de Tony Williams e grava o seu primeiro álbum para a Blue Note, o superlativo Fuchsia Swing Song, o primeiro de uma série de registos altamente influentes gravados para a mítica editora. Seriam eles Contours, A New Conception, Involution e Dimensions & Extensions, ao todo cinco álbuns cuja real importância ainda hoje permanece por descobrir e avaliar. Rivers fecha a década com uma série de participações em registos clássicos de Larry Young, Bobby Hutcherson e Andrew Hill.

No início da década de 70, cria um estúdio no Soho, em Nova Iorque (Studio Rivbea), que se torna ponto de encontro para a vanguarda musical da época, projectando-o como uma das faces mais visíveis do chamado movimento loft jazz.

A vibração avassaladora que passava pelas ruas e apartamentos da cidade, em encontros informais de músicos, deixa uma marca indelével na história do jazz e fica registada de forma exemplar na série de cinco álbuns Wildflowers, recentemente reeditada em CD.

Na altura focado no trabalho com o seu trio ou com a Rivbea Orchestra, Rivers inicia uma longa colaboração com Dave Holland e é por ele convidado para participar nas gravações, em 1972, de Conference of the Birds, álbum histórico que integra, para além de Holland e Rivers, Anthony Braxton e Barry Altschul. Nem que fosse por este disco apenas, o seu nome já estaria gravado nas páginas mais destacadas da história do jazz. Em 1979 edita na ECM o lendário Contrasts, com a participação de Holland, George Lewis e Thurman Barker, registo que ainda hoje se encontra, inexplicavelmente, por editar em CD.

Nas décadas seguintes, apesar da sua visibilidade diminuir um pouco, nem por isso abranda em termos de actividade e criatividade. O Studio Rivbea continua um pólo dinâmico para as gerações mais jovens de jazzmen nova-iorquinos, funcionando como base para uma série fascinante de concertos e gravações. São disso exemplo os excelentes Inspiration e Culmination, gravados no final dos anos 90 com a Rivbea All Star Orchestra.

Fascinante também é ver Rivers entrar no século seguinte, então com 77 anos, assinando uma participação memorável num outro disco que fez história, Black Starsde Jason Moran. Adoptando uma atitude de abertura estética, baseada num profundo conhecimento teórico e prático, Rivers liderou durante anos as correntes mais vanguardistas do jazz sem fechar nunca a porta a uma genuína contaminação musical. Lamentavelmente, a sua estatura como músico e o seu profundo rigor intelectual e artístico permanecem por descobrir para um grande número de pessoas ligadas ao jazz.

(Fonte: www.ipsilon.publico.pt/musica – 30.12.2011 – Rodrigo Amado)