Sergio Rodrigues, arquiteto e designer, um mestre atemporal do mobiliário

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Sergio Rodrigues, arquiteto e designer, um mestre atemporal do mobiliário

Peças robustas em madeira, agregando materiais como palha e couro, desenho elegante e conforto são suas marcas

A cultura e o design de móveis brasileiros podem não saber, mas têm muito a agradecer à matemática. Não fossem os desafios impostos pelos números à mente do menino Sergio Rodrigues, mais dado aos desenhos que às contas, talvez ele tivesse ingressado na Aeronáutica e se especializado no ofício com que então sonhava, o de projetar aviões, deixando vago o posto de mestre do mobiliário nacional que continua ocupando aos 85 anos. A primeira etapa da prova para ingressar na Força Aérea do país era um exame de matemática e, como Rodrigues lembra, sorriso gaiato nos lábios, ele foi “diretamente ao pau”.

A tentativa ocorreu quando ainda era aluno do Colégio Santo Inácio, onde, aliás, ganhou um apelido para lá de matemático: SR2, invenção dos colegas de turma por conta de seu nome, Sergio Roberto Santos Rodrigues. Mas, apesar de só ter assumido o desenho como meio de vida bem mais tarde, ainda menino Sergio dava sinais de que seu melhor repertório seriam as formas. Aos 6 anos, fazia os próprios brinquedos de madeira, com um canivete, e vivia enfurnado na oficina que o tio-bisavô mantinha na casa da família, na Praia do Flamengo.

— Ficava ali o dia todo, sentindo cheiro de madeira, de cola. Meu tio-bisavô tinha essa oficina como hobby e fazia desenhos horrorosos, difíceis de entender. Ali, percebi que poderia melhorar meus brinquedos fazendo desenhos — relembra Rodrigues, que se formou arquiteto em 1952.

Nessa mesma casa, as paredes do quarto do menino Sergio eram liberadas ao desenho por sua avó. Figuras monumentais tomaram as paredes do cômodo de pé-direito de 4,5 metros. E se, desde sempre, cada centímetro pôde ser ocupado, ao longo da vida Sergio deixou longo rastro de traços por onde passou, seja em cadernetas, diários, esboços ou plantas. Traços que o levaram a construir uma linguagem particular no design de móveis, movido pela sensação de que o arrojo da arquitetura moderna brasileira no início dos anos 50 não tinha equivalente nos interiores das construções.

Analisando a trajetória iniciada em 1954, ano da criação de sua primeira peça, o banco Mocho, vê-se o desenvolvimento de uma produção que, sim, deu uma resposta de peso ao modernismo, mas, acima de tudo, fez-se atemporal. Em quase 60 anos, o autor da poltrona Mole — o móvel mais famoso (e copiado) de Rodrigues, premiado no Concorso Internacionale del Mobile, em 1961, na Itália — acha que manteve a coerência:
— Posso misturar numa residência móveis de diferentes fases e não existirá contraste.
Peças robustas em madeira, agregando materiais como palha e couro, desenho elegante, conforto e a constante presença do círculo são marcas de Rodrigues, que, além de renovar a linguagem do móvel, forjou uma identidade brasileira nessa área. Um de seus primeiros mestres, o arquiteto Lucio Costa dizia que Rodrigues faz o resgate de aspectos do Brasil indígena. Não à toa ele batizou de Oca o negócio aberto em 1955 em Ipanema, um misto de loja e laboratório de móveis. Na vitrine da Oca por mais de um ano, a poltrona Mole — hoje vendida a R$ 11,9 mil — não atraiu um comprador sequer.

— As dondocas de Ipanema passavam e diziam: “Ih, essa loja começou tão bem. Agora, estão fazendo cama para cachorro” — diverte-se ele.

Foi na Oca que Oscar Niemeyer bateu o olho numa cadeira feita por Rodrigues para o salão de jogos do Jockey Club, que reprovara o móvel. Niemeyer logo comprou duas peças para a filha, que iria se casar, e acabou homenageado no nome da peça. Os dois, aliás, uniram forças em Brasília: Rodrigues criou móveis para alguns prédios da nova capital federal.
Esses e muitos outros momentos da carreira de Sergio estão presentes num acervo de cerca de 15 mil documentos, que será digitalizado no primeiro projeto do Instituto Sergio Rodrigues, criado há oito meses. A empreitada, claro, já provoca rabiscos: Sergio acaba de desenhar o logo do instituto, unindo suas iniciais a um pedaço de madeira e um círculo. Para 2014, a diretora do instituto, Renata Aragão, planeja comemorar os 60 anos de produção de Rodrigues. E ele criará uma peça especialmente para a ocasião. Outra expectativa é o documentário sobre o mestre, dirigido por Peter Azen e em fase de finalização.

O início da organização do acervo, que será colocado on-line, já viabiliza novos produtos com a assinatura de Rodrigues. Seus arquivos têm revelado esboços de móveis nunca concluídos e desenhos de peças únicas, feitas sob encomenda e não comercializadas. Em 2013, foram lançados três móveis. Um deles é a cadeira Fernando, que havia parado nos esboços.

Seu nome homenageia o discípulo e primo Fernando Mendes, único autorizado no Rio a produzir os móveis do mestre (no resto do país, há só mais um fabricante, a Lin Brasil, do Paraná).

Entre os homenageados, não poderia faltar Vera Beatriz Veiga Rodrigues, segunda mulher do mestre, que, em pouco tempo, vendo sua dificuldade de organizar os negócios, começou a trabalhar com ele.

Vera é lembrada na bela poltrona Kilin, corruptela de esquilinha, o carinhoso apelido dado pelo marido. Eles se casaram em 1973, mas a história começou na adolescência, num namoro que só durou um ano devido à pressão da família de Vera, que desaprovava os Rodrigues (o avô de Sergio era Mario Rodrigues, dono de jornais; um dos tios era Nelson Rodrigues; e seu pai, Roberto Rodrigues, era pintor já reconhecido quando foi assassinado aos 23 anos).

Assim, Vera e Sergio se casaram com outras pessoas e tiveram filhos. Anos depois, já separados, retomaram o romance após o encontro num jantar de uma amiga em comum.

(Fonte: http://oglobo.globo.com/rio/sergio-rodrigues-um-mestre-atemporal-do-mobiliario-8941597 – Design Rio/ Por Fabíola Gerbase, Paula Autran e Simone Candida – 7/07/13)

(Fonte: Veja, 15 de dezembro de 1993 – ANO 26 – Nº 50 – Edição 1318 – ARTE/Por Ângela Pimenta – Pág: 152/153)

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