Vassili Kandinsky (Moscou, 1866 – Paris, 1944), gênio russo que garantiu um dos lugares mais salientes na vanguarda da pintura europeia do século 20. Isto, apesar de sua pintura na União Soviética permanecer trancada nos porões durante quatro décadas e só merecer liberação depois da exposição “Paris-Moscou” no Beaubour, quando a União Soviética decidiu rever seus revolucionários do primeiro momento das artes visuais, incluindo também os construtivistas, como Tatlin e Malevitch.
“As primeiras cores que me impressionaram foram um verde claro e vivaz, o branco, o preto, o vermelho carmim e o amarelo ocre. Eutinha três anos.” Com esse tributo ao fascínio expressivo e autônomo da cor Kandinsky iniciou, aos 47 anos de idade, em 1913, sua autobiografia precoce, intitulada “Olhares Sobre o Passado.” Nessa época, porém, o artista acabava de descobrir um novo continente do mundo da cultura: a pintura abstrata. Sua revolução atravessou a de outubro, na jovem União Soviética, e deixou rastros por mais três décadas.
PAISAGEM DINÂMICAS – Curiosamente, Kandinsky só se dedicou integralmente a estudar pintura aos 31 anos, em Munique, sua primeira cidade de adoção depois de uma sólida formação intelectual numa boa família burguesa moscovita, e após recusar uma cátedra de direito.
O gosto familiar por viagens certamente influenciou sua carreira. Aos 3 anos de idade, frequentou um jardim de infância em Florença, enquanto seus pais banhavam-se nas fontes do Renascimento. Adulto, fez duas viagens a Paris (1889 e 1892). A influência religiosa greco-ortodoxa que marcou sua juventude sem dúvida transparece em muitos de seus quadros.
Mas enviado ao norte do país, à pobre província de Vologda, para estudar direito rural, ele encontrou “uma cultura camponesa e uma concepção do mundo que lhe parecera mais rica de significados que a da burguesia materna e sua concepção de religiosidade”.
A glória de revolucionar os conceitos vigentes de representação só chegou para Kandinsky quando começou a pintar as célebres “paisagens” de Murnau e as primeiras “improvisações” e “composições” não-figurativas.
Kandinsky só voltou à Rússia de 1914 a 1922, quando aderiu com entusiasmo à possibilidade de organizar a arte e a cultura fora dos esquemas burocráticos, junto com outros artistas. Chegou até a fundar e ser vice-presidente da Academia de Ciências Artísticas. Mas não podia admitir a companhia de “pintores que pintam preto sobre preto e branco sobre branco”, e deixou definitivamente o país para trabalhar com Walter Gropius (1883-1969) e Paul Klee (1879-1940) no grupo que criou a Escola Bauhaus.
(Fonte: Veja, 4 de fevereiro de 1981 – Edição 648 – ARTE/ Por Marco Antonio de Rezende, de Roma – Pág; 88/89)