Uma das maiores referências do jornalismo francês, fundador da revista Le Nouvel Observateur
Testemunha de parte da história do século XX, Kennedy pediu-lhe que entregasse uma mensagem a Fidel Castro e estava em Havana quando soube do assassínio do Presidente dos EUA.
Era a “última figura do jornalismo inspirado”
Jean Daniel Bensaid (Blida, Argélia, 21 de julho de 1920 – 19 de fevereiro de 2020), jornalista e escritor francês, foi o fundador da revista Le Nouvel Observateur.
Amigo de Albert Camus, argelino como ele, Jean Daniel foi uma das maiores referências do jornalismo francês da segunda metade do século XX, ao mesmo tempo testemunha e ator da V República.
Jean Daniel ficou famoso em 1963, ao entrevistar o presidente americano John F. Kennedy, que transmitiu uma mensagem ao cubano Fidel Castro. Jean Daniel estava ao lado de Fidel em Havana quando ficou a saber do assassinato de Kennedy, em 22 de novembro de 1963.
Em 1964, Jean Daniel, uma das grandes referências da esquerda francesa, fundou ao lado do empresário Claude Perdriel a revista Le Nouvel Observateur, que comandou até 2008.
Sob a direção de Daniel, Le Nouvel Observateur se tornou uma grande defensora de causas sociais, como a legalização do aborto ou os direitos dos homossexuais, recorda o site da revista.
Jean Daniel ficou famoso em 1963, ao entrevistar o presidente americano John F. Kennedy, que transmitiu uma mensagem ao cubano Fidel Castro, segundo a L’Obs.
Jean Daniel estava ao lado de Fidel em Havana quando ficou sabendo do assassinato de Kennedy, em 22 de novembro de 1963.
Nascido em 21 de julho de 1920 em Blida, Argélia, Jean Daniel, cujo sobrenome de nascimento era Bensaid, escreveu seu primeiro artigo na imprensa em 1954 para a revista L’Express, que o enviou para cobrir a guerra da Argélia.
Jean Daniel, a “última figura do jornalismo inspirado”
O fundador da prestigiada revista francesa “Nouvel Observateur” foi marxista e viu o mundo a mudar. Atravessou dois séculos, admirou De Gaulle e tornou-se mundialmente conhecido quando entrevistou o Presidente John Kennedy na Casa Branca, um mês antes de este ter sido assassinado.
Era um homem da periferia e esse foi um dos trunfos do seu olhar global sobre os acontecimentos que mudam pessoas e sociedades. Jean Daniel Bensaïd, o lendário jornalista que foi um dos dois fundadores da prestigiada revista francesa “Nouvel Observateur” (com Claude Perdriel), em 1964, nasceu em Blida, uma pequena cidade nos arredores de Argel (capital da Argélia), em 21 de julho de 1920, no seio de uma família de origem judia.
Era o mais novo de onze irmãos, o que não foi dispiciendo para a sua paixão pela literatura e filosofia, que haveriam de conduzi-lo ao jornalismo. Em 2017, publicou um texto de homenagem aos escritores da sua vida, em que evocava André Gide, Albert Camus, Milan Kundera, entre outros. E também mencionava a sua irmã mais velha, Mathilde, pelo papel que teve no seu gosto pela leitura.
O fundador do Expresso, Francisco Pinto Balsemão, lembra-se de ter conversado várias vezes com Jean Daniel, em Paris e em Lisboa. “Embora nem sempre concordasse com ele, tinha uma visão do mundo e do papel do jornalismo na construção da democracia que muito me impressionaram”, testemunha o também chairman do grupo Impresa.
“Antes e depois do 25 de Abril, o ‘Nouvel Observateur’ foi uma publicação semanal importante e necessária para a minha geração”, afirma Balsemão. O jornalista francês, recorda o antigo primeiro-ministro português, “procurava sempre informar-se, fazia muitas perguntas e, por isso, quando emitia opiniões ou fazia juízos de valor, sabia fundamentá-los”.
DO ROMANCE EDITADO POR UM PRÊMIO NOBEL À MEDIAÇÃO ENTRE KENNEDY E FIDEL
Foi acima de tudo um humanista, e isso aproximou-o de Albert Camus, o homem que ganhou o Nobel da Literatura e lhe editou “L’Erreur” (publicado pela Gallimard).
Daniel partilhava com o autor de “O Estrangeiro” — que também nascera na Argélia, sete anos antes — aquele olhar periférico, denso e profundo que enforma a condição de um intelectual francês nascido e criado fora do espaço europeu, num território matizado por uma dimensão cultural que enriquece a centralidade europeia.
Em 1953, começa a acompanhar os assuntos ligados às colónias [francesas]na Société Générale de Presse. No ano seguinte publicou o primeiro artigo na revista “L’Express” e, dois anos mais tarde, o jornalista e político Jean-Jacques Servan-Schreiber encarrega-o de acompanhar os acontecimentos que precederam a independência da Argélia.
Descrevia-se como um “humanista judeu, da esquerda não comunista”, recorda “The New York Times”. “Meio século antes de o Presidente Barack Obama ordenar a restauração de todas as relações diplomáticas com Cuba, em 2014”, Jean Daniel foi a Havana, no outono de 1963, entregar uma proposta do então Presidente John F. Kennedy a Fidel Castro. “Missão secreta”, como lembra o NYT.
Daniel tinha uma boa relação com Fidel e entrevistara Kennedy em outubro de 1963, como o próprio recordou no texto “Enviado não Oficial”: “O Presidente Kennedy recebeu-me na Casa Branca, a 24 de outubro, quinta-feira. A minha audiência estava marcada para as 17h30. Esperei na sala de conferências do Gabinete e, às 17h45, o Presidente, veio ter comigo. Pediu desculpas pelo atraso, e não foi apenas cortesia. Era uma forma de explicar a programação do seu tempo, que parecia muito organizado. Quando passámos pela pequena sala onde estava a sua secretária a trabalhar, tivemos um vislumbre da Sr.ª Kennedy saindo a caminho do jardim privado da Casa Branca”.
Sabe-se que um mês mais tarde, Daniel encontra-se com Fidel para lhe transmitir uma mensagem de Kennedy. Tarde de mais para evitar o desembarque na Baía dos Porcos. O telefone tocou no decurso da conversa desse 22 de novembro de 1963, na praia de Varadero. Kennedy tinha acabado de ser assassinado a tiro, em Dallas.
MITTERRAND, O AMIGO COMUM DE SOARES E DANIEL
Quando Mário Soares morreu, a 7 de janeiro de 2017, Jean Daniel lembrou o seu “sorriso franco e acolhedor”, rendendo assim homenagem a um político que conheceu em Paris, no exílio do dirigente socialista português.
Os dois homens partilharam leituras, conversas, ideias e ideais, charutos e amigos comuns. Um deles terá sido o ex-Presidente francês François Mitterrand.
Na despedida de Soares, Daniel escreveu que “todos os jornalistas viajantes ou aventureiros têm oportunidade de se cruzar com personalidades fortes, homens fora do comum, mas raramente com chefes de Estado que desafiam a posteridade. Quando conheci Mário Soares, ele estava no exílio em França, entre duas passagens pela prisão”.
“Não sabia nada sobre ele. Voltei a vê-lo quando regressou para a sua Revolução dos Cravos. Foi amor à primeira vista, o único talvez que senti por um homem de Estado. Como se tivéssemos sido íntimos antes, ele sabia tudo sobre mim.” E, apesar de Daniel ter apenas mais quatro anos do que Soares, sentia que este o tratava “como mais velho, o que intimidava”.
Esta grande e “última figura do jornalismo inspirado”, como o definiu o historiador Pierre Nora, partiu esta quarta-feira, 19 de fevereiro. O anúncio da sua morte foi feito esta quinta-feira, pela imprensa de todo o mundo.
Jean Daniel faleceu aos 99 anos, em 19 de fevereiro de 2020, anunciou a L’Obs (como a publicação é chamada agora) em seu site oficial.
“Faleceu aos 99 anos, após uma longa vida de paixão, compromisso e criação”, afirma a L’Obs no obituário.
“O jornalista francês de maior prestígio faleceu. Ele foi, ao mesmo tempo, testemunha, ator e consciência deste mundo”, completou a revista.
(Fonte: https://istoe.com.br – Edição nº2614 – Cultura / Por AFP – 20/02/20)
(Fonte: Zero Hora – ANO 56 – N° 19.639 – 21 de FEVEREIRO de 2020 – TRIBUTO / MEMÓRIA – Pág: 27)
(Fonte: https://expresso.pt/internacional/2020-02-20- INTERNACIONAL / Por MANUELA GOUCHA SOARES – 20.02.2020)